O Alto Comissariado da ONU para os Refugiados revelou que mais de 2.500 migrantes morreram ou desapareceram na travessia do Mediterrâneo ao tentarem chegar à Europa este ano. Trata-se de um aumento de 50% relativamente ao mesmo período do ano passado.
A diretora desta instituição, Ruven Menikdiwela, fez questão de afirmar que a estas mortes se somam as “vidas perdidas em terra, longe da atenção do público”. A viagem desde a África ocidental, oriental e do Corno de África até à Líbia e outros pontos costeiros é, afirma, uma das rotas mais perigosas do mundo na qual refugiados e migrantes “arriscam a morte e violações graves dos direitos humanos a cada etapa”.
O Alto Comissariado defende que se estabeleça “um mecanismo regional de desembarque e distribuição” das pessoas que chegam por mar à Europa, salientando que a Itália “não conseguiria responder sozinha às necessidades” destas pessoas.
A União Europeia discute precisamente um “Pacto de Migração e Asilo” e esta quinta-feira os desentendimentos entre Alemanha e Itália impossibilitaram que fosse alcançado um acordo sobre um “Regulamento de Crise” que supostamente pretenderia gerir coletivamente a chegada de migrantes.
Segundo o Euronews, o pomo da discórdia está na posição face às operações de busca e salvamento de barcos de várias Organizações Não Governamentais no Mediterrâneo com a Itália a opor-se-lhes, considerando-as um “fator de atração” e com a Alemanha a insistir que estas salvam vidas.
No geral, o pacto estabelece um sistema batizado de “solidariedade obrigatória” que está longe de responder ao problema, fazendo com que os países possam reagir aos fluxos migratórios aceitando um dado número de requerentes de asilo, pagando 20 mil euros para os rejeitados regressarem ou financiando apoio operacional, como infraestruturas e pessoal.
Ainda mais polémica é a proposta de Regulamento de Crise que autorizaria os Estados-membros a aplicar “medidas mais rigorosas” em períodos em que cheguem mais migrantes. Isto implica períodos de retenção nas fronteiras e de detenção de requerentes de asilo mais prolongadas, para além de um máximo já existente de 12 semanas. Várias ONG responderam a estas medidas afirmando que abrem portas a um confinamento em grande escala, à degradação da qualidade do procedimento de asilo e aumento do risco de pushbacks, ou seja expulsões imediatas ilegais.
Abre-se ainda a possibilidade de acelerar pedidos de asilo em situações específicas “de perigo extraordinário”, como guerras, o que já foi feito para receber refugiados ucranianos.
O mesmo órgão de comunicação social, dá conta que havia quatro países, Áustria, República Checa, Hungria e Polónia, contra este pacto e três abstencionistas, Alemanha, Países Baixos e Eslováquia. A Alemanha, que tinha expressado críticas à possibilidade de aumento de prazos e aos efeitos que teria em termos de direitos humanos, e com a sua abstenção impossibilitado o acordo em junho, teria agora manifestado intenção de afinal aprovar o documento.
O problema foi assim, analisa o Publico.es, o bloqueio do governo de Giorgia Meloni ao insistir no ataque às ONG que promovem buscas e salvamento. O governo italiano, liderado pela extrema-direita, tratou, aliás, logo depois de chegar ao poder, de impor multas a estas associações.
O governo de Roma continua o caminho do endurecimento de medidas contra os migrantes. Na quarta-feira aprovou em Conselho de Ministros um “decreto de segurança” no sentido de facilitar deportações de migrantes acusados de “irregularidades” ou que se pense que possam representar “ameaça à segurança nacional”. A possibilidade de expulsão sob este pretexto é estendida a estrangeiros que estejam já a viver legalmente no país. Outro dos motivos de expulsão imediata dos migrantes será mentir sobre a idade, estando previsto que a polícia acelere procedimentos para calcular idades através de técnicas de medição corporal e raios-X. Para além disso, os maiores de 16 anos poderão ser colocados em centros de acolhimento de adultos “de forma provisória e por um período não superior a 90 dias. Estes têm sido criticados pela sua falta de condições mínimas de dignidade.
Este pacote de medidas segue-se a outros três, o último dos quais implementado a semana passada. O primeiro tratou de dificultar o trabalho dos barcos de resgate de ONG, o segundo eliminou a chamada “proteção especial”, um sistema de acolhimento destinado a migrantes sem direito a asilo e o terceiro alargou o tempo de detenção nos centros de detenção pré-deportação podendo chegar aos 18 meses, o máximo permitido pela União Europeia neste momento, criando ainda novos Centros de Permanência para o Repatriamento.