Sul de Espanha

Exploração de imigrantes e condições "desumanas" nas estufas enriquecem donos do agronegócio

04 de junho 2024 - 12:04

Relatório da ONG Ethical Consumer detalha como a agricultura intensiva alimentada por uma mão de obra barata resulta em violações “rotineiras” de direitos básicos, incluindo trabalho forçado, abusos sexuais e várias formas de intimidação.

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Estufas em Almeria
Estufas em Almeria. Foto de George Ruiz e Rayne Laborde Ruiz/Ethical Consumer.

Um relatório da Organização Não Governamental britânica Ethical Consumer, divulgado na passada sexta-feira, traça o quadro dos abusos laborais que sofrem os trabalhadores que colhem frutas e vegetais nas estufas e campos da Andaluzia. Estes incluem pagamentos abaixo do salário mínimo, trabalho forçado, abusos sexuais e intimidação.

De acordo com a investigação, há responsáveis agrícolas a exigir sexo em troca de trabalho, a confiscar os passaportes dos trabalhadores, a penalizar idas à casa de banho e a despedir quem se tente sindicalizar ou lutar pelos seus direitos. As condições de trabalho detetadas são também inseguras, as horas de trabalho excessivas, o pagamento é irregular e o tratamento das pessoas é “duro e desumano”.

O trabalho centra-se nas regiões de Almeria e Huelva onde este modelo de exploração da agricultura intensiva se tem vindo a acentuar nos últimos 20 anos. A conclusão é que “tanto a quantidade como a natureza das provas disponíveis mostram que os problemas são endémicos nestes territórios”, sendo “de forma rotineira” negados direitos básicos.

O relator especial da ONU sobre pobreza extrema e direitos humanos, Olivier de Schutter, confirma a situação: “desde há anos que as autoridades e empregados do Sul de Espanha se contentam com esperar sentados e ficar a ver os trabalhadores migrantes a sofrerem as condições de trabalho mais horríveis, desumanas”. Para ele, a “busca incessante de lucros maiores está a empurrar cada vez mais para baixo os padrões” existentes.

Schutter já se tinha dirigido ao Governo espanhol e às empresas envolvidas, em 2020, sobre o que se passa na agricultura da Andaluzia, sem sucesso, porque “as violações continuam em completo desrespeito pelos padrões internacionais de direitos humanos”. E, como este documento em particular foi pensado para agir sobre os supermercados britânicos que compram estes produtos, insta-os a “acabar com a sua cumplicidade nestes abusos e a lidar com o tema de frente”. O mesmo pedido fazem organizações como a Anti-Slavery International, a Coalition of Immokalee Worker e a Landworkers’ Alliance.

O Reino Unido é o principal importador de alimentos frescos de Espanha. Empresas como a Aldi, Asda, Coop, Lidl, Marks & Spencer, Morrisons, Sainsbury, Tesco e Waitrose ganham milhões com as vendas destes. Por isso, especialistas e organizações de defesa dos direitos humanos exigem medidas como garantir que as políticas das empresas relativas aos direitos dos trabalhadores são aplicadas a todos os fornecedores e não apenas aos fornecedores diretos, publicar os nomes de todas as explorações agrícolas dos fornecedores, alargar auditorias e torná-las eficazes, falando com os trabalhadores em locais seguros, comprometer-se a “eliminar quaisquer práticas comerciais que possam pressionar os fornecedores a reduzir custos ou a transferir riscos para eles” e a “incluir o salário digno nas negociações de preços, bem como nas condições contratuais”.