As buscas na residência oficial do primeiro-ministro, no âmbito da denominada “operação Influencer" que acabou por resultar na demissão de António Costa, duraram 14 horas e meia e terão descoberto 75.880 euros em dinheiro vivo no gabinete de Vítor Escária, chefe de gabinete de António Costa, segundo avançam SIC Notícias e Expresso. As notas estariam “num envelope dentro de uma caixa de vinho e vários envelopes numa estante", diz o semanário.
Nesta diligência foi apreendido material informático, nenhum do qual de uso do agora demissionário chefe do executivo.
O Ministério Público considera que há suspeitas de crimes de prevaricação, de corrupção ativa e passiva de titular de cargo político e de tráfico de influência. No vértice da pirâmide dos esquemas em investigação estão três figuras. Para além do chefe de gabinete do Primeiro-Ministro, Vitór Escária, surgem Diogo Lacerda Machado, consultor e amigo de António Costa, e o ministro João Galamba.
No dia em que começam os interrogatórios aos detidos, o Jornal de Notícias sintetiza que Vítor Escária é suspeito de pressionar oito entidades para acelerar o projeto de construção de um centro de dados em Sines. Com este propósito, terá contactado Duarte Cordeiro, ministro do Ambiente, Ana Fontoura Gouveia, secretária de Estado da Energia, Nuno Mascarenhas, o presidente da Câmara de Sines, bem como várias entidades públicas. Uma delas terá sido a Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal que atribuiu ao projeto o estatuto PIN, potencial interesse nacional. Outras estruturas pressionadas terão sido a REN, o Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas, a Direção-Geral de Energia e Geologia e a Agência Portuguesa do Ambiente.
Já Diogo Lacerda Machado terá sido contratado pela Start Campus, a empresa que promovia esta construção, devido à sua relação de proximidade com o chefe do executivo e outros elementos do governo.
Também suspeito no caso é o ministro das Infraestruturas, João Galamba. Fontes judiciais fizeram saber que nas buscas à sua residência foram apreendidos telemóveis e computadores.
O governante não acabou detido, mas foi constituído arguido e é suspeito em “todas as matérias objeto de investigação” cita o Público os autos da investigação. No caso da concessão da mina de lítio do Romano, investiga-se o contrato “com uma sociedade distinta da que assinara o contrato de prospeção e pesquisa em Dezembro de 2012 e da que apresentara antes o pedido de concessão”, a Lusorecursos Portugal Lithium, S.A., uma empresa constituída três dias antes da assinatura do contrato, e diferente da que tinha feito todo o processo anterior. Também é suspeito de “interferir indevidamente” de forma a levar, junto com Matos Fernandes, então ministro do Ambiente, o Estado a impor que a Galp entrasse na empresa que detém a exploração da mina de lítio no Barroso, a Savannah. Os mesmos dois governantes são suspeitos ainda de, no caso do hidrogénio, terem imposto a Galp, EDP e REN ao Resilient Group, empresa holandesa que avançou com o projeto, um consórcio que entretanto se dissolveu. Galamba terá depois afastado a empresa detida por Marc Rechter da lista de manifestação de interesses para candidatura a Projeto Importante de Interesse Comum Europeu (IPCEI), um estatuto que lhe daria prioridade de candidatura a dinheiros da União Europeia e apoios estatais. Galamba também é suspeito no caso do mega-Data Center a construir em Sines. Manteria “contactos regulares (…) e com grande frequência” com os promotores do projeto.
Para além disto, o seu superior no Governo nessa altura, o ex-ministro do Ambiente, João Matos Fernandes, também parte da lista de suspeitos por crimes de corrupção passiva e de prevaricação sobre “declarações de impacto ambiental”. Depois de deixar o governo, foi contratado como consultor da Abreu Advogados, que faz a assessoria jurídica da Copenhagen, empresa envolvida no projeto do hidrogénio verde e manteve contactos “suspeitos” com o chairman da Martifer, Carlos Martins, outra empresa que entrou no negócio.
A Lusa acrescenta que o ex-governante está a ser também investigado sobre a aprovação de legislação sobre a gestão de resíduos. A empresa que o contratou depois de sair do governo faz assessoria a várias empresas do setor que tutelou e à Associação das Empresas de Gestão de Resíduos não perigosos.
Outras suspeitas, analisadas pela agência noticiosa nacional, são a de que lesou deliberadamente o combate à seca por apenas ter convocado a comissão permanente da seca dois dias depois das eleições e també terá imposto dois arquitetos no júri do concurso para a construção da nova ponte do metro do Porto sobre o rio Douro, “como se estes tivessem sido escolhidos pela Ordem dos Arquitetos”.
À lista de suspeitos é acrescentado agora outro nome, o do ex-secretário de Estado João Tiago Silveira. O jornal Eco informa que o ex-secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros e ex-secretário de Estado da Justiça no Governo de José Sócrates também é arguido no caso. É assim o segundo sócio do escritório de advogados Morais Leitão a ser constituído arguido depois de Rui Oliveira Neves, que está detido. Será acusado de “irregularidades” no âmbito dos projetos em causa.
António Costa, uma investigação de que se desconhecem os contornos
Sobre o primeiro-ministro sabia-se até agora apenas que o seu nome tinha sido referido por “suspeitos” para “desbloquear procedimentos” de acordo com o comunicado que deu origem à sua demissão, não se identificando de quais suspeitos se trata, qual o contexto em que as conversas escutadas foram tidas, nem de que tipo de procedimentos se trataria
Esta quarta-feira à noite, o Observador publicou uma notícia na qual alega que há “mais de 20 escutas telefónicas” que envolvem António Costa e que “foram validadas por dois presidentes do Supremo Tribunal de Justiça”. De acordo com o conteúdo da notícia, não terá sido o telefone do primeiro-ministro a ser escutado mas o dos três suspeitos principais a si ligados, Escária, Lacerda Machado e João Galamba.