Ensino superior: Uma em cada quatro instituições não tem canais de denúncia de assédio

02 de maio 2023 - 18:11

A maioria das universidades e politécnicos públicos que já criaram este mecanismo só o fez no verão passado, na sequência da recomendação da ministra Elvira Fortunato, após terem vindo a público os casos de assédio na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa.

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Foto de Paulete Matos.

O jornal Público recolheu informações sobre a existência de canais de denúncia de assédio nas universidades e politécnicos públicos, tendo obtido resposta por parte de 26 instituições de ensino superior. Apenas o Instituto Politécnico de Santarém e a Universidade dos Açores não responderam às questões endereçadas pelo diário.

Os dados compilados permitiram apurar que não existe este tipo de mecanismos específicos em sete universidades e politécnicos públicos, o equivalente a 25% do total da rede pública. São disso exemplo o Instituto Politécnico de Beja, o Politécnico de Lisboa ou as universidades de Évora e do Minho. No Instituto Politécnico da Guarda, na Universidade da Beira Interior e no Politécnico de Castelo Branco, a criação de canais de denúncia de assédio moral e sexual estará para breve, segundo informaram as suas direções.

No que respeita às instituições de ensino superior que já criaram estes mecanismos, a maioria só o fez no verão passado, na sequência da recomendação da ministra Elvira Fortunato, após terem vindo a público os casos de assédio na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (FDUL). No que respeita aos politécnicos de Viana do Castelo e Bragança, à Universidade do Algarve e ao Instituto Politécnico de Leiria, os canais só ficaram disponíveis nos meses de janeiro e fevereiro de 2023.

De acordo com o Público, entre os mecanismos de denúncia criados, alguns não são exclusivos para situações de assédio moral ou sexual. Lembrando que as universidades e politécnicos estavam obrigados a criar um regime de proteção de denunciantes de infrações, na sequência da transposição para o ordenamento jurídico nacional de uma diretiva europeia, o jornal refere que os canais de denúncia com garantia de confidencialidade também se destinam a casos de abuso de poder, conflitos de interesses ou corrupção, fraude ou furto.

Inquiridas sobre o número de casos de abuso moral e sexual reportados, as instituições do ensino superior responderam que foram registadas 86 queixas de assédio, a maioria das quais refere-se aos últimos dois anos. Do total de queixas, 53 respeitam a situações de assédio moral e 25 a assédio sexual. Em oito casos, as instituição não forneceram informações suficientes para permitir categorizar o tipo de denúncia.

Quinze casos deram origem a sanções, embora não seja especificado o tipo de pena aplicada. Outros 22 casos foram arquivados. Os restantes estão ainda a ser analisados.

É na Universidade de Lisboa que encontramos mais casos reportados: 32 queixas de assédio moral e 12 de assédio sexual, nos últimos cinco anos. Em 12 instituições não foi registado nenhum caso.

Apesar de o Público ter requerido dados relativos aos últimos cinco anos, somente três instituições, a Universidade de Lisboa, Universidade Nova de Lisboa e Instituto Politécnico de Leiria, responderam com informações recolhidas nesse período. A maioria enviou apenas informações compiladas a partir do ano passado.

Bloco defende estrutura independente para denúncias de casos de assédio

Após terem vindo a público as queixas de assédio moral e sexual no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, a ministra da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior enviou um pedido de informação às instituições de ensino superior e centros de investigação sobre as queixas recebidas nos últimos cinco anos. Elvira Fortunato informou a Assembleia da República que foi apurada a existência de 38 queixas de assédio sexual, quatro das quais deram origem a sanções, e 78 denúncias por assédio moral, das quais resultaram cinco sanções disciplinares.

Na semana passada, o Bloco de Esquerda entregou no Parlamento um projeto de resolução a defender a criação de uma estrutura independente de apoio à vítima e de denúncia em caso de assédio.

Para a deputada Joana Mortágua, "ao contrário do que tem sido afirmado pela ministra do Ensino Superior, que entende que as instituições devem criar os mecanismos dentro dos seus órgãos, "o que os estudantes nos têm dito é que as práticas endógenas nestas instituições não permitem a liberdade de fazer estas denúncias por medo de represálias, coação, perseguição". Por isso, "uma estrutura independente é essencial", sublinha.