E se começássemos Amanhã?

31 de dezembro 2016 - 9:53

Cyril Dion e Mélanie Laurent decidiram correr o mundo à procura de experiências que nos mostrem que o futuro da humanidade não tem de estar condenado à destruição e ao caos. Por João Mineiro.

porJoão Mineiro

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Amanhã - Título original: Demain, filme de: Cyril Dion e Mélanie Laurent, género: Documentário, 2015
Amanhã - Título original: Demain, filme de: Cyril Dion e Mélanie Laurent, género: Documentário, 2015

Se analisarmos os filmes que se têm realizado nos últimos anos onde é ficcionado o futuro da humanidade, constatamos que em quase todos, as imagens que se produzem sobre futuro são as imagens do caos, da destruição e da extinção. Essas representações cinematográficas refletem os imaginários sociais e coletivos que a humanidade tem sobre o seu futuro, contribuindo de alguma forma para os confirmar através da produção de representações ficcionadas.

Cansados destas representações de sentido único, Cyril Dion e Mélanie Laurent decidiram correr o mundo à procura de outros indícios, de outras práticas e de outras experiências que nos mostrem que o futuro da humanidade não tem de estar condenado à destruição e ao caos. Assim, decidiram filmar alternativas que se desenvolvem pelo mundo fora e que procuram ensaiar respostas individuais e coletivas à destruição acelerada do planeta, às injustiças do sistema económico-financeiro, à irresponsabilidade das sociedades dos hiper-consumos e à pobreza dos sistemas políticos que monopolizam, centralizam e vedam a capacidade das pessoas decidirem o seu futuro coletivo.

O resultado desta procura é impressionante. Cyril Dion e Mélanie Laurent mostram-nos milhares de pessoas que se organizam para experimentar alternativas ao atual modelo de produção capitalista, de consumo e destruição ambiental, procurando formas de alimentação e de consumos responsáveis, modos de produção de energia limpa e de aproveitamento de recursos, sistemas mais justos de trocas monetárias e de organização da economia, métodos educativos mais inclusivos e formas de organização da política mais horizontais e democráticas. São dezenas de experiências, que não posso detalhar, mas que vale mesmo a pena conhecer vendo o documentário.

Sabemos que o modo de produção capitalista, baseado na sobreexploração de recursos, é incompatível com a salvação do planeta e com a justiça social e climática. Como diz Daniel Tanuro, é impossível um capitalismo verde. Por isso, apesar deste documentário poder dar a entender que há soluções individuais para o problema, a perspetiva ecossocialista é a que percebe que para além de soluções individuais, a dimensão totalizante do capitalismo exige que tenhamos capacidade e a generosidade de encontrar soluções coletivas, que dêm às sociedades a capacidade de mobilização para lutar por outro sistema económico, ecológico, social e político. Mas também de nada serve ficarmos sentados à espera que o capitalismo acabe. O filme mostra-nos que é urgente começar já a ensaiar as mudanças concretas que o poderão substituir por um outro modelo de sociedade, de economia e de exercício da política. Por isso mesmo, num tempo em que, como refere Fredic Jameson, para a maioria das pessoas o fim do mundo parece bastante mais credível que o fim do capitalismo, dar visibilidade a experiências pós-capitalistas de organização é de uma enorme importância. Ajuda a criar novos imaginários, ampliando desta forma o campo dos possíveis. É mesmo possível mudar a vida e mudar de vida. Há milhares de pessoas a experimentá-lo, porque não é possível adiar mais. É preciso agir e tem de ser agora. E se começássemos amanhã?

Artigo de João Mineiro para esquerda.net

João Mineiro
Sobre o/a autor(a)

João Mineiro

Sociólogo e investigador