Numa declaração no final da reunião do Conselho de Ministros, António Leitão Amaro apresentou a proposta para reforçar as contraordenações para os maquinistas e criar a proibição da condução sob o efeito de álcool. E justificou a medida com o argumento de que “estando Portugal numa das piores situações em termos de nível de acidentes, tem do quadro contraordenacional mais leve e mais baixo da Europa”. O ministro da Presidência afirmou ainda que “Portugal tem o segundo pior desempenho ao nível do número por quilómetro de ferrovia de acidentes que ocorrem” e que tem “um desempenho cerca de sete vezes pior do que a primeira metade dos países europeus”.
As palavras do ministro, ao associar os acidentes ferroviários em Portugal com o suposto consumo de álcool dos maquinistas, enfureceram estes profissionais, que exigiram um pedido de desculpas. Leitão Amaro não aceitou e a greve anunciada para esta sexta-feira, 6 de dezembro, vai mesmo avançar e paralisar a circulação ferroviária em Portugal, com o Tribunal Arbitral a definir serviços mínimos de 25% das viagens programadas nos serviços urbanos, regionais e de longo curso, bem como dos serviços de emergência e manutenção.
A greve terá impacto na CP, IP, Fertagus, Metro Sul do Tejo, Viaporto, Captrain e Medway e o sindicato apela à união dos associados por estar em causa “a nossa profissão, o respeito pela nossa classe e a segurança de quem trabalha e utiliza o transporte ferroviário”.
O Sindicato dos Maquinistas (SMAQ) considera “inaceitáveis e insultuosas” as declarações de Leitão Amaro e lembra que “não existe qualquer registo de acidentes provocados pelo consumo de álcool”. Declarações confirmadas pelo Gabinete de Prevenção e Investigação de Acidentes com Aeronaves e de Acidentes Ferroviários, ao afirmar que nos últimos dez anos não só não existiram acidentes em que o consumo de álcool fosse considerado um fator interveniente como também nunca foi detetada uma taxa de alcoolemia superior a 0,5g/l nos testes aleatórios a que os maquinistas são sujeitos e que lhes pode valer uma punição caso seja ultrapassado o limite de 0,2g/l.
Sindicato exige respostas às “falhas graves” de segurança na ferrovia
“Somos vítimas das lacunas do sistema e não a sua causa, e exigimos que a responsabilidade seja atribuída onde realmente se encontra: na falta de investimentos e soluções para os problemas estruturais da infraestrutura ferroviária”, aponta o SMAQ, acrescentando que as declarações de Leitão Amaro são um ataque à “honra e profissionalismo” dos maquinistas e também uma forma de ignorar a “verdadeira origem dos problemas” que são “fatores externos ao desempenho dos trabalhadores”.
Ferrovia
Maquinistas indignados com insinuações do ministro sobre consumo de álcool e acidentes
Além da reação ao insulto do ministro, o SMAQ reivindica ainda melhorias na segurança ferroviária para responder a “falhas graves”, como a insuficiência de sistemas de deteção de obstáculos na Linha do Douro, os descarrilamentos na Linha do Vouga, a degradação da infraestrutura, o material circulante obsoleto, a falta de sinalização nas limitações da velocidade programada, a persistência de passagens de nível perigosas, problemas na manutenção da sinalização semafórica e no material circulante da MTS, as plataformas subdimensionadas para as necessidades operacionais e os incumprimentos dos Acordos de Empresa.
Os maquinistas chamam ainda a atenção para a ausência de regulamentação coletiva de trabalho em empresas como a MTS e Fertagus, que “acentua o desequilíbrio nas relações laborais, agravado por vínculos precários”, uma situação que também afeta a Viaporto.