Cavaco só teve licença para acabar casa de férias três meses depois de estar pronta

21 de janeiro 2011 - 12:19

Cavaco Silva fez obras durante um ano na sua actual residência de Verão com a licença caducada e em desrespeito do processo inicialmente aprovado. A obra estava embargada desde 1997.

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As obras foram concluídas em Agosto de 1999, mas o então professor de economia e ex-primeiro-ministro só obteve a licença para fazer as obras de alteração a 30 de Novembro desse ano. Cavaco Silva - Foto de António Cotrim, Lusa (Arquivo)

As obras foram concluídas em Agosto de 1999, mas o então professor de economia e ex-primeiro-ministro só obteve a licença para fazer as obras de alteração a 30 de Novembro desse ano. Onze dias antes, porém, já tinha requerido a licença de utilização da moradia, a qual foi emitida, sem a necessária vistoria camarária prévia, a 3 de Dezembro.

As irregularidades no licenciamento da construção da sua moradia, a vivenda Gaivota Azul, na urbanização da Coelha, concelho de Albufeira, a 600 metros da praia da Coelha, não são um caso inédito. Mas o acervo documental reunido nos três volumes do processo camarário consultado pelo jornal Público mostra um conjunto de procedimentos marcado por sucessivas violações das normas legais em matéria urbanística.

Numa declaração transmitida por um membro da candidatura, Cavaco Silva respondeu esta quinta-feira às perguntas da imprensa dizendo apenas: “Não alimento esse tipo de campanhas.”

Das irregularidades neste processo, umas são da responsabilidade da empresa Galvana — de que era sócio e representante Teófilo Carapeto Dias, um amigo de infância e antigo assessor de Cavaco. A Galvana era a proprietária e foi ela que iniciou a construção da moradia em Outubro de 1997.

A construção arrancou devidamente licenciada, com um alvará emitido em nome da Galvana, válido até 25 de Junho de 1998. O projecto, do arquitecto Olavo Dias, começou por levantar alguns problemas, visto que a sua implantação incidia sobre dois lotes nos quais estavam previstas duas moradias, mas tudo se resolveu com uma alteração ao alvará de loteamento. A aprovação desta alteração, que fez com que o lote de Cavaco Silva tenha perto do dobro da área de todos os outros, deveria ter sido precedida de um parecer da antiga Comissão de Coordenação Regional do Algarve. Esse parecer, embora a câmara tenha deliberado no sentido de ele ser solicitado, não consta do processo.

Logo em Dezembro de 1997, dois meses depois do começo, a obra foi embargada por despacho do presidente da Câmara, por a Galvana “estar a levar a efeito a alteração e ampliação” da moradia, ao nível da cave, “em desacordo com o projecto aprovado”.

Nessa altura, contudo, já a Galvana tinha entregue no município um “projecto de alterações pontuais”, subscrito por Olavo Dias a 28 de Outubro. O projecto de arquitectura chegou a merecer uma aprovação em Março do ano seguinte, mas o processo não teve andamento por falta dos projectos de especialidades, não sendo emitida a necessária licença para as alterações requeridas.

Quanto ao embargo, o mesmo foi ignorado pela Galvana que, conforme consta do Livro de Obra — um registo oficial no qual o director técnico anota regularmente a data de realização das partes mais importantes da obra — nunca suspendeu os trabalhos.

A casa construída ilegalmente...

A "habitação com piscina" que ocupa "620,70 m2", é composta por três pisos, e acabou de ser construída, segundo os registos da Câmara a 6 de Agosto de 1999. A única intervenção de Cavaco Silva nas obras deu-se poucos dias antes da conclusão, a 21 de Julho de 1999, quando requereu a prorrogação do prazo das obras (cujo prazo caducara em 25 de Junho), adianta a Visão.

A família Cavaco Silva ocupou, então, a moradia, em Agosto. A licença de utilização seria passada quatro meses depois, a 3 de Dezembro, pelo vereador (actual edil de Albufeira, do PSD) Desidério Silva, desrespeitando o embargo camarário à obra, decretado em Dezembro de 1997, e nunca levantado.

No que respeita ao primeiro pedido, o da prorrogação da licença, a Câmara nem sequer respondeu, presumivelmente porque a obra continuava embargada e o projecto de alterações apresentado em 1997 nunca tinha sido licenciado.

Já no caso do novo pedido de licenciamento e com as obras terminadas desde o mês anterior, o proprietário entregou a 3 de Setembro de 1999 os projectos de especialidade referentes às alterações, incluindo o projecto de estabilidade e cálculos de betão. A 19 de Novembro pediu que lhe fosse passada a licença de utilização da moradia e só 11 dias mais tarde, a 30 de Novembro, é que o então vereador Desidério Silva, actual presidente da Câmara (PSD), assina a licença para a execução das obras de alteração há muito concluídas.

Logo a 3 de Dezembro, sem que haja registo da realização da vistoria camarária, destinada a verificar se o que foi feito é o que foi licenciado, Desidério Silva assinou a licença de utilização.