Casa para Viver: Manifestações juntaram milhares em seis cidades

01 de abril 2023 - 17:39

As manifestações em defesa do direito à habitação rejeitam o pacote do Governo que põe os contribuintes a financiar o aumento dos preços das rendas de casa. Em Lisboa, Catarina Martins voltou a defender a regulação das rendas com tetos ao seu valor.

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Manifestação em Lisboa. Foto Esquerda.net

Este sábado realizaram-se manifestações em seis cidades do país em defesa do direito à habitação e contra as medidas apresentadas na véspera pelo Governo, que consideram insuficientes e mesmo contraproducentes, ao apostarem em benefícios fiscais e mobilizarem dinheiros públicos para ajudas que não travam a subida do preço das rendas de casa.

Em Lisboa, Vasco Barata, da associação Chão das Lutas, disse aos jornalistas que "as pessoas gastam grande parte do seu salário com a casa, seja para comprar ou para arrendar e o que é preciso é baixar o preço das rendas e das casas para que as pessoas possam pagar casas que o seu salário permita pagar".

"O Governo tentou esvaziar a manifestação com o pacote Mais Habitação, mas as pessoas perceberam que esse pacote é insuficiente. Não queremos mais benefícios fiscais, queremos acabar com os que já existem, queremos que os preços sejam regulados e que as pessoas tenham um salário com que possam pagar a renda. As pessoas não têm de ter ajudas para pagar a renda, porque quando as ajudas terminarem as pessoas deixam de poder pagar a casa", prosseguiu o ativista pelo direito à habitação.

 Manifestação em Lisboa. Ver fotogaleria

"Não percebemos porque é que o dinheiro de todos os contribuintes têm de ser mobilizados para financiar os preços especulativos e os preços da banca dos créditos à habitação", quando na sua opinião "deve ser utilizado para financiar programas públicos de habitação robustos, não para financiar os preços especulativos do mercado".

Diogo Faro, outro dos promotores da manifestação, afirmou que "temos aqui pessoas da periferia e do centro de Lisboa, de profissões e idades muito diferentes". E todos com histórias dramáticas, pois "a taxa de esforço é enorme e incomportável, estamos a falar de mais de dois terços dos salários das pessoas".

No Porto, a manifestação decorre debaixo de chuva. Um dos organizadores, Jorge Albuquerque, defendeu que é preciso "parar os despejos em habitação privada e pública e usar os edifícios devolutos privados e públicos". E referiu que "no Porto há 20 mil casas devolutas e só na Rua de Santa Catarina e na Rua dos Bragas essas casas davam para acolher o dobro das pessoas que estão em lista de espera na Domus Social", a instituição do município para habitação social.

 Manifestação no Porto.

Quanto à proposta do Governo para a renda acessível, o ativista disse à CNN que ela "não é acessível para ninguém: com renda de um T1 de 775 euros como o Governo propõe, para quem recebe o salário mínimo é impossível pagar renda, luz, alimentar-se... temos relatos de pessoas que escolhem entre pagar a renda e a medicação". Por isso, conclui que "o programa Mais Habitação não é para quem mais precisa, para quem trabalha e é pobre".


Cortejo do Bloco na manifestação no Porto.

Em Braga, a concentração na Avenida Central ainda decorria e Cândido Almeida, um dos organizadores, dizia à CNN que estavam ali "pessoas a ficarem sem casa, a terem de regressar a casa dos seus pais, a terem dificuldade em pagar os créditos à habitação, a perderem casas que são devolvidas aos bancos que têm milhões de lucros e sempre a crescer". O ativista recorda que "na cidade de Braga há pessoas a viver em garagens e lojas alugadas" e promete "continuar a luta até que sejam aprovadas medidas direcionadas a quem passa por estas dificuldades". Quanto ao pacote Mais Habitação apresentado pelo Governo, diz que "as pessoas abrangidas pelo apoio monetário é uma parte muito reduzida". "Alguém tem de pagar esta inflação e não podem ser sempre os mesmos. A habitação é um direito consagrado na Constituição e está completamente comprometido. O dinheiro existe mas está concentrado onde não devia", concluiu.

 Concentração em Braga. Foto de Miguel Martins.

No Rossio de Viseu, Miguel Lopes disse aos jornalistas que "existem cerca de três mil casas desabitadas no concelho de Viseu porque foram absorvidas pelas lógicas especulativas do mercado". E que as rendas aumentaram 54% entre 2018 e 2022, enquanto o número de quartos disponíveis para estudantes reduziu-se 43% desde o ano letivo de 2011/2022. Quando às medidas do pacote Mais Habitação, o ativista diz que "são fogo de vista, são truques". Por isso, "é necessário marcar a posição de que isto não se passa apenas em Lisboa e no Porto, mas também no interior". Por exemplo, no seu distrito e fora da cidade de Viseu, "conseguimos encontrar T1 a 480 euros por mês", aponta. A concentração contou com a presença da eurodeputada bloquista Marisa Matias.

 Concentração em Viseu. Foto de Tiago Resende.

As manifestações pelo direito à habitação passaram também por outras duas cidades da Região Centro. Em Coimbra, Mariana Rodrigues, do recém-criado movimento Porta Adentro, explicou à RTP que a ideia nasceu porque "Coimbra não pode ficar de fora desta discussão", pois apesar de não ser considerada uma cidade metropolitana, "há muito que vive uma crise habitacional por ser uma cidade universitária por excelência, e sempre teve rendas acima da média".


Concentração em Coimbra.

Em Aveiro, e também debaixo de chuva, a SIC ouviu uma das promotoras da concentração dizer que "temos a força necessária para exigir um direito básico consagrado na Constituição mas que não está ao alcance dos portugueses" por causa da especulação imobiliária que obriga "as pessoas a decidir se compram o pão ou pagam a renda ou a prestação da casa". Para esta ativista, "o Governo tem de avançar com medidas efetivas e não com medidas que só beneficiam a especulação imobiliária e quem tem os seus imóveis para arrendar ou para vender". Acrescentou que p preço da renda em Aveiro subiu praticamente para o dobro, não apenas na cidade mas no distrito. E que a oferta para arrendamento é escassa "e os proprietários põem-se no direito de pedir o valor que entenderem". Por isso, "o que exigimos é um aumento do parque habitacional público e com rendas a custos controlados".

 Concentração em Aveiro.

Catarina Martins acusa Governo de "enganar as pessoas" com medidas que não baixam o preço das rendas

Na manifestação em Lisboa, Catarina Martins  voltou a defender que "é preciso haver tetos nas rendas, é preciso que as casas que estão vazias estejam disponíveis para as pessoas e sobretudo é preciso que as casas tenham preços que as pessoas possam pagar". Considerando o preço da habitação em Portugal como "um dos maiores problemas do país" e que Lisboa "é das cidades mais caras do mundo tendo em conta os salários", Catarina acusou o Governo de anunciar "muitas coisas que não baixam os preços das casas".

Quanto ao pacote Mais Habitação, afirma que ele "mantém benefícios fiscais aos fundos imobiliários, a quem não mora em Portugal, a quem faz dos imóveis um bem de especulação financeira e não o direito à habitação". E que "enquanto não houver medidas claras para baixar o preço das casas, para acabar com a especulação, com os benefícios fiscais a estes gigantes que fazem com que preços das casas disparem, não haverá solução para o nosso país".

"Os subsídios que o Governo anunciou têm dois problemas: chegam a um número muito reduzido de pessoas e quando o subsídio acabar as casas ficaram cada vez mais caras na mesma", prosseguiu Catarina, defendendo que "precisamos de acabar com os benefícios fiscais que tornam as casas em Portugal a preços impossíveis para salários portugueses".

"O Governo pode prometer tudo, mas enquanto continuar a premiar os fundos de investimento e os residentes não habituais, ou a ter vistos gold com novos nomes como aparece no Mais Habitação, as casas vão continuar a preços impossíveis. Estão a enganar as pessoas", concluiu a coordenadora do Bloco.