“Carnificina” em Gaza eleva número de mortos para mais de nove mil

02 de novembro 2023 - 15:00

Entre os 9.061 mortos na Faixa de Gaza encontram-se 3.760 crianças e 2.326 mulheres. Existem ainda dezenas de milhares de feridos. ONU afirma que bombardeamentos em Jabalia podem constituir crimes de guerra, descreve “cenas de carnificina” e alerta que “escala da tragédia não tem precedentes”.

PARTILHAR
Colunas de fumo no norte da Faixa de Gaza após um ataque militar israelita, vistas a partir do sul de Israel, 2 de novembro de 2023. Foto de ABIR SULTAN EPA/Lusa.

O Ministério da Saúde de Gaza anunciou na quarta-feira que 9.061 pessoas, incluindo 3.760 crianças, morreram na Faixa de Gaza desde 7 de outubro. Entre os mortos figuram ainda 2.326 mulheres. Os bombardeamentos causaram pelo menos 32.000 feridos.

A organização não-governamental Médicos Sem Fronteiras (MSF) alerta que “ainda há mais de 20 mil feridos em Gaza com acesso limitado a cuidados de saúde devido ao cerco”, apesar de um pequeno número de evacuações de pessoas “gravemente feridas” para o Egito.

O gabinete de media de Gaza informou esta quinta-feira que, pelo menos, 195 palestinianos foram mortos nos dois ataques israelitas a Jabalia, e 120 pessoas continuam desaparecidas sob os escombros. Existem ainda perto de 800 feridos. Os palestinianos continuam a vasculhar os escombros numa busca desesperada pelas vítimas presas. “É um massacre”, afirmou uma testemunha.

Unicef descreve “cenas de carnificina”

Em declarações após os ataques a Jabalia, a Unicef descreveu as “cenas de carnificina” observadas no local, reiterando o apelo a um cessar-fogo humanitário imediato.

A agência das Nações Unidas para a defesa e promoção dos direitos das crianças assinalou que, de acordo com as informações divulgadas, mais de 400 crianças são mortas ou feridas por dia desde 7 de outubro.

“Isto não pode tornar-se o novo normal… As crianças já suportaram demasiado. A matança e o cativeiro de crianças devem acabar. As crianças não são um alvo”, vincou a Unicef.

ONU: Bombardeamentos podem constituir crimes de guerra

Na sequência da confirmação do segundo dia consecutivo de ataques a Jabalia, o secretário-geral da ONU, António Guterres afirmou-se “horrorizado” com a situação e pediu respeito pelo Direito Internacional, que proíbe ataques indiscriminados a alvos civis. 

Em comunicado lido pelo porta-voz da ONU, Stéphane Dujarric, Guterres apelou às partes para que "respeitem o direito internacional". O líder das Nações Unidas afirmou condenar "nos termos mais duros qualquer assassinato de civis". 

Nas redes sociais, o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos relatou que, "dado o elevado número de vítimas civis e a escala da destruição causada pelos ataques aéreos israelitas ao campo de refugiados de Jabalia, estamos seriamente preocupados que estes sejam ataques desproporcionais que possam constituir crimes de guerra".

UNRWA: “A escala da tragédia não tem precedentes”

A Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina no Próximo Oriente (UNRWA, na sigla inglesa) afirmou que as suas instalações na Faixa de Gaza estão a abrigar cerca de 690 mil pessoas deslocadas internamente. De acordo com a UNRWA, a situação é “desesperante”. “Os nossos abrigos têm quase quatro vezes a capacidade pretendida e as condições de superlotação continuam a criar graves problemas de saúde e proteção”, alerta a agência das Nações Unidas.

Na quarta-feira, após uma visita a Gaza, Philippe Lazzarini, da UNRWA, afirmou ter vivido “um dos dias mais tristes” do seu “trabalho humanitário”. O comissário da ONU frisou que “a escala da tragédia não tem precedentes”.

Philippe Lazzarini encontrou-se com palestinianos deslocados que estavam abrigados numa das escolas da agência da ONU: “O local estava superlotado. Os níveis de angústia e as condições de vida insalubres estavam para além do imaginável. Todos apenas pediam água e comida. Em vez de estarem na escola a aprender, as crianças pediam um gole de água e um pedaço de pão. Foi de partir o coração. Acima de tudo, as pessoas pediam um cessar-fogo. Eles querem que esta tragédia acabe”, descreveu.

Mais de 70 funcionários da UNRWA foram mortos desde 7 de outubro, muitas vezes juntamente com as suas famílias, lembrou Lazzarini, apelando a uma resposta humanitária “significativa” para evitar que pessoas em Gaza morram devido ao cerco.

“Apelo mais uma vez para entregas urgentes de combustível. Há quase um mês que não chega combustível e isso está a ter um impacto devastador em hospitais, padarias, estações de tratamento de água e nas nossas operações. Os nossos apelos estão a cair em ouvidos surdos. Um cessar-fogo humanitário está muito atrasado. Sem ele, mais pessoas serão mortas, aqueles que estão vivos sofrerão mais perdas e a outrora vibrante sociedade sofrerá para sempre”, destacou.

OMS: Mais de um terço dos hospitais em Gaza não estão a funcionar

O diretor-geral da Organização Mundial de Saúde (OMS), Tedros Adhanom Ghebreyesus, alertou para a situação “profundamente preocupante” dos hospitais em Gaza, e deixou um apelo ao “acesso urgente e sustentado à escala da ajuda humanitária”.

“14 dos 36 hospitais e 2 centros de especialidade em Gaza não estão a funcionar devido à falta de combustível, bem como devido a danos, ataques e insegurança. Os hospitais que permanecem abertos estão sobrecarregados com mais 40% pacientes do que foram concebidos para gerir”, escreveu Tedros Adhanom Ghebreyesus na rede social X.

 

 

O único hospital de tratamento de cancro em Gaza encerrou atividade depois de ficar sem combustível. O diretor do hospital da Amizade Turco-Palestina deixou um apelo durante uma conferência de imprensa: “Dizemos ao mundo – não deixe os pacientes com cancro com uma morte certa devido ao hospital estar fora de serviço”.

Centenas de pessoas esperam para partir pela passagem de Rafah

A passagem fronteiriça de Rafah foi aberta pela primeira vez na quarta-feira, depois de mais de três semanas encerrada, para permitir a evacuação de dezenas de palestinianos gravemente feridos, bem como de centenas de portadores de passaportes estrangeiros.

A Associated Press descreveu a aglomeração na fronteira, com crianças inquietas pressionando o rosto contra a grade, enquanto as suas famílias esperam que chamem os seus nomes.

Netanyahu garante que nada vai parar os ataques

Entretanto, os ataques israelitas continuam a arrasar Gaza esta quinta-feira. O Crescente Vermelho Palestiniano reportou que foram ouvidas explosões em torno do hospital al-Quds, na densamente povoada cidade de Gaza. As autoridades israelitas já tinham dado instruções para a evacuação do hospital, mas as autoridades da ONU enfatizaram ser impossível fazê-lo sem colocar os pacientes em perigo.

De acordo com o The Guardian, um ataque aéreo a um edifício residencial no campo de refugiados de Bureij, no centro de Gaza, matou esta quinta-feira pelo menos 15 pessoas.  Os moradores relatam que dezenas de pessoas ficaram presas sob os escombros. O ataque deixou uma extensa área de destruição.

A agência de notícias palestiniana WAFA, noticia que 27 pessoas perderam a vida quando as forças israelitas dispararam mísseis contra uma escola no campo de refugiados de Jabalia.

A WAFA avança ainda que uma criança morreu num dos ataques registados no bairro de Zeitoun, na cidade de Gaza, e que duas outras pessoas ficaram feridas no ataque, perto da mesquita al-Shafi.

O primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, já veio garantir que as forças do país já passaram a periferia da cidade de Gaza e que nada "os vai parar". 

"Hoje [estou] com os nossos combatentes no terreno. Os nossos êxitos são impressionantes, já ultrapassámos a periferia da cidade de Gaza. Estamos a fazer progressos. Nada nos vai parar. Vamos avançar. Avançaremos e venceremos, e fá-lo-emos com a ajuda do Senhor e com a ajuda dos nossos heróis guerreiros", escreveu Netanyahu na rede social X (antigo Twitter).

Notícia atualizada às 16h21 de 02.11.2023.