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Autárquicas: Imigrantes vão a votos em listas do Bloco

Cyntia, Enara e Rafael vieram do Brasil, Diego da Galiza, Catherine de França e Afrazour do Bangladesh. São algumas das dezenas de imigrantes que intervêm na política local, candidatando-se nas listas do Bloco de Esquerda às eleições de 26 de setembro. Fomos conhecê-los melhor.
Imigraram para Portugal e intervêm na política local candidatando-se nas listas do Bloco de Esquerda às eleições de 26 de setembro.

No dia 26 de setembro decorrem em Portugal eleições autárquicas. De acordo com a legislação em vigor, além de cidadãs e cidadãos portugueses, podem ser eleitas pessoas portuguesas e brasileiras com estatuto de igualdade, pessoas dos Estados-Membros da União Europeia, pessoas do Reino Unido com residência anterior ao Brexit e pessoas do Brasil sem estatuto de igualdade bem como de Cabo Verde, com título válido de residência em Portugal há mais de quatro anos.

As listas do Bloco às autárquicas integram dezenas de pessoas que não nasceram em Portugal. Fomos conhecer seis delas.

Cyntia de Paula quer "respostas efetivas para as pessoas imigrantes" em Lisboa

 Nascida no Brasil, Cyntia de Paula veio estudar para Lisboa há 12 anos, onde efetuou um mestrado em Psicologia Comunitária. Trabalha com população migrante e é presidente da Casa do Brasil. Integra a lista do Bloco à Câmara Municipal de Lisboa em sexto lugar e está no terceiro lugar à Assembleia de Freguesia de Santa Maria Maior.

“Enquanto feminista, dirigente associativa e mulher imigrante considero que participar da política institucional é fundamental para que possamos construir respostas para a cidade que de facto incluam todas as pessoas” afirmou Cyntia ao Esquerda.net. Quando chegou a Portugal, confrontou-se com o preconceito e do que é “ser uma mulher brasileira em Portugal e todo o simbolismo do que isso significa ainda na sociedade portuguesa”. Com o ativismo na Casa do Brasil, "em pouco tempo percebi que as dificuldades que eu passei eram muito poucas comparadas às que muitas pessoas imigrantes vivenciavam, sobretudo quando interseccionam outros marcadores como o género, a cor da pele, a classe social, a orientação sexual e a identidade de género". Por isso, defende Cyntia, faltam "respostas efetivas para as pessoas imigrantes, a nível nacional e também a nível da cidade.”

Entre as medidas de apoio à população migrante, Cyntia refere o incentivo à participação das pessoas imigrantes nas decisões para a cidade, providenciar “serviços públicos municipais de qualidade” para quem não fala a língua portuguesa e o acesso a mediadores culturais nesses serviços. Enquanto ativista feminista, destaca ainda a luta por “uma cidade feminista que construa espaços seguros para as mulheres com respostas efetivas de combate à desigualdade de género e à violência de género”. E considera “primordial o combate ao racismo, a xenofobia e as múltiplas discriminações”.

Enara Teixeira quer "romper as correntes da atual política de direita" em Peso da Régua

 Também no Brasil nasceu Enara Teixeira, a cabeça de lista do Bloco de Esquerda à Câmara Municipal de Peso da Régua. Com formação na área do património cultural, trabalha na Fundação Museu do Douro desde 2008. 

Nos primeiros anos em Portugal, Enara sentiu “intimidação por parte das instituições que zelam pela entrada e permanência de estrangeiros em Portugal. Infelizmente não é um processo rápido, nem fácil e nem barato”, afirma Enara, que demorou seis anos a obter a nacionalidade portuguesa. Atualmente reside em Armamar porque “tornou-se impossível conseguirmos adquirir a nossa moradia familiar” por causa da “especulação imobiliária existente no concelho de Peso da Régua”, causada pelo “exagero do turismo de massa”.

Enara aceitou o desafio de concorrer à Câmara "para rompermos as correntes da atual política de direita, machista, senhorial e desligada das necessidades reais da população”, destacando a necessidade de “lutar pela melhoria na saúde, na educação, nas políticas sociais e económicas, com o objetivo de fixarmos mais população no interior”. Enara sublinha também a importância de apoiar a cultura e os artistas bem como promover o turismo sustentável. “Ainda há muito por propor e realizar neste concelho e nós vamos lutar por cada objetivo”, conclui a candidata que encabeça a estreia eleitoral do Bloco em autárquicas no concelho.

Rafael Victório quer "barrar a gentrificação" do Porto


Mais conhecido como DJ Farofa, Rafael Victório nasceu no Brasil e ocupa o sétimo lugar na lista do Bloco à Câmara do Porto. Morou em Salamanca, Lisboa e Coimbra e, em 2011, fixou-se no Porto depois de ali ter feito o mestrado em Filosofia do Direito.

Descreve-se como “pesquisador de músicas, feliz, vive pela cultura, mediador, DJ, bacharel em direito, conciliador, imigrante em Portugal, cidadão português, forte, produtor de eventos, voluntário em projetos e pesquisas sobre educação, direitos humanos, direitos difusos e coletivos, ativista, curador e independente”.  E lembra as dificuldades que sentiu na chegada. “Tudo é muito mais difícil quando se é imigrante aqui na Europa. Muitos senhorios não querem arrendar, a burocracia para documentos é gigantesca, negando acesso a muitos de nossos direitos”.

Sobre a sua candidatura nas listas do Bloco à Cãmara do Porto, Rafael diz que “quando recebi o convite aceitei de pronto”, recordando que “desde que pisei a primeira vez em Portugal faço e vivo política” através da “música e da arte”. Uma das causas que o motiva é a luta “pelas pessoas que vivem no Porto, sejam imigrantes ou de Portugal” o que implica “barrar a gentrificação, da qual já fui vítima e senti na pele”.

Diego Garcia quer continuar a ser conhecido como “o fiscal da Câmara” na Assembleia Municipal de Carregal do Sal

 Diego Garcia nasceu na Galiza e reside em Portugal há doze anos, no Carregal do Sal, distrito de Viseu. É cabeça de lista à Assembleia Municipal de Carregal do Sal, lugar que já ocupou em 2017, tendo sido eleito.

Nos quatro anos de mandato que agora terminam, Diego foi apelidado pela autarquia de “fiscal da Câmara” porque “as pessoas preferem denunciar as situações ao Bloco do que às entidades competentes”, o que demonstra “a falta de resposta que existe”.  Para fixar população neste concelho do interior, faltam “serviços públicos de qualidade, oferta de habitação pública, vias de acesso em condições, oferta cultural e desportiva. Não podemos continuar a olhar para este território como o local adequado para plantar eucalipto ou fazer umas minas, é muito mais que isso”, afirma Diego. 

A sua candidatura destaca também as questões ambientais, a emergência climática e o respeito pelos animais como causas a lutar. “É imprescindível que os e as eleitas do Bloco contribuam para aproximar os órgãos autárquicos das pessoas”, bem como para “combater derivações populistas xenófobas e racistas”, conclui o candidato que também enfrentou a burocracia no processo de naturalização, que diz ser para afastar pessoas e não para facilitar" a integração e acesso a direitos.

Catherine Boutaud quer "habitação digna e a preços justos" em Lisboa

Nascida em França, Catherine Boutaud veio há 14 anos para Lisboa. Militante feminista e anti-precariedade, é cabeça de lista do Bloco à Assembleia de Freguesia do Beato e diz ser "um grande desafio representar a freguesia que me acolheu há cerca de dois anos", afirma Catherine.

Em Lisboa, Catherine envolveu-se em diversas lutas, coletivos e causas. “Construí-me através do ativismo e da militância feminista” afirma Catherine, que também integra a “Associação de Combate à Precariedade – Precários inflexíveis. Nesses catorze anos “passámos por duas graves crises que transformaram a cidade e a forma de viver nela. Assisti ao nascer da atual crise da habitação. Vi o centro de Lisboa progressivamente engolido pela especulação imobiliária, pela chegada massiva de turistas e a consequente explosão dos preços das casas. Perdi os meus vizinhos e as minhas vizinhas. Os pequenos comércios e artesãs desapareceram. Vi parte da alma da cidade a apagar-se”, afirma Catherine.

Por isso, defende que “o direito à habitação digna e a preços justos é a prioridade absoluta.” Na freguesia do Beato, também a mobilidade e questão ambiental são áreas a melhorar bastante. E diz ter o “sonho” de ver à escala da cidade “grandes hortas solidárias que possam alimentar as famílias mais carentes de Lisboa. O Beato é uma freguesia onde se podia começar esta iniciativa”, propõe Catherine.

Afrozur Rahman quer “fazer mais pela freguesia” de Moscavide e Portela


Afrozur Rahman nasceu no Bangladesh e vive no concelho de Loures, onde é comerciante. É o segundo candidato na lista do Bloco de Esquerda à Junta de Freguesia de Moscavide e Portela. 

Dos candidatos aqui entrevistados, Afrozur Rahman é o que veio de mais longe. Natural do Bangladesh, chegou a Portugal há 20 anos e foi viver no concelho de Loures. Trabalha na sua pequena loja, que nunca fechou portas aos fregueses durante a pandemia.

Aceitou o desafio do Bloco para se  candidatar porque diz ser preciso “melhorar e fazer mais pela freguesia”.  Entre as principais áreas que Afrozur Rahman defende que a junta de freguesia deve intervir estão “o apoio aos idosos, as escolas, o estacionamento e a recolha do lixo”. 

Termos relacionados Autárquicas 2021, Política
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