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Argentina: trabalhadores contestam nas ruas a nova receita de austeridade de Macri e o FMI

Um rapaz de 13 anos foi baleado mortalmente e outro menor ficou ferido com gravidade numa cidade do norte do país. Governo Macri anunciou mais austeridade, enquanto a moeda local continuou a cair face ao dólar.
FManifestação de funcionários públicos em Buenos Aires. oto ATE Capital/Twitter

As imagens de saques a supermercados por parte da população desesperada com a subida dos preços e a desvalorização contínua do peso argentino voltaram ao quotidiano do país nas últimas semanas. Esta terça-feira, na cidade de Sáenz Peña, no norte da Argentina, centenas de pessoas invadiram um supermercado e a repressão policial que se seguiu provocou um morto e um ferido grave. A vítima mortal é Ismael Ramírez, um adolescente com 13 anos, baleado no peito. O ferido grave, atingido num olho, também é menor de idade.

Segundo o jornal Página 12, testemunhas no local afirmam que foi um “tiroteio infernal” quando a polícia chegou ao local. O ministro da Segurança do estado de Chaco não confirmou que o tiro fatal tenha vindo da polícia, afirmando que “também houve disparos de civis e de funcionários do supermercado”.

Macri acaba com 9 ministérios, entre os quais os da Saúde, Trabalho, Ambiente e Ciência

A crise económica na Argentina levou o presidente Mauricio Macri a anunciar uma restruturação do governo, despromovendo metade dos ministérios, como os da Saúde, Trabalho, Ambiente, Ciência e Tecnologia, Cultura, Energia, Turismo e Agroindústria. Alguns passam a secretarias se Estado ou serão simplesmente absorvidos por outros ministérios.

Na véspera da reunião do seu ministro das Finanças com o FMI em Washington, para adiantar o empréstimo acordado em maio passado, Macri anunciou também a intenção do governo em cortar na despesa pública com o congelamento de entradas na Função Pública e dos salários, cortes no investimento público e em subsídios como a tarifa social da eletricidade, e o aumento das taxas sobre a exportação de cereais.

Mas nem as medidas de Macri nem os 358 milhões de dólares colocados no mercado pelo Banco Central evitaram que o peso voltasse a cair face ao dólar, fixando-se nos 39,68 pesos por dólar, mais 1 peso que na véspera. No mercado paralelo, o dólar subiu 3%, para os 40 pesos.

Por seu lado, a resposta da bolsa norte-americana às medidas de Macri também foi penalizadora para as empresas argentinas cotadas em Wall Street, com quedas de 14% (Banco Macro), 13.2% (elétrica Edenor), 12.9% (Banco Supervielle) e 11.6% (Grupo Financiero Galicia) e outras empresas e bancos cotados a perder entre 6% e 10%. Quatro bancos e outras dez empresas ligadas à energia receberam recomendações negativas da Standard & Poor’s.

Manifestações contra a austeridade e o FMI regressam às ruas

A corrida aos dólares e aos supermercados, acompanhadas do disparar dos preços - com o décimo aumento anunciado esta terça-feira, a gasolina aumentou quase 80% no último ano - colocou a popularidade do governo liberal de Macri em mínimos históricos.

Entretanto, os protestos voltaram às ruas logo na segunda-feira, com milhares de funcionários públicos a exigirem a demissão do governo e a aprovação de uma lei de proteção aos trabalhadores do Estado. O corte no número de ministérios "coloca em risco milhares de empregos”, afirmou o secretário-geral da Associação dos Trabalhadores do Estado, Daniel Catalano, citado pela agência Lusa. Os trabalhadores dizem que não querem "pagar a festa do que fogem com os dólares do país".

“Se não mudam as políticas públicas, se não mudam o modelo económico, se não muda a sua relação com os trabalhadores e trabalhadoras, o que se tem que mudar é o Presidente”, afirmou o líder sindical, sublinhando que o governo Macri precisa do “desaparecimento estrutural dos direito laborais. Por isso nos ataca com a reforma laboral e por isso é que elimina o Ministério do Trabalho.

Centenas de cientistas e investigadores reagiram logo na segunda-feira ao anúncio do fim do Ministério da Ciência e Tecnologia, criado em 2007 durante a presidência de Cristina Kirchner como uma das suas bandeiras pelo progresso do país. Os manifestantes rodearam o edifício do ministério agora extinto, contestando também o corte para metade no acesso à carreira de investigação científica, a falta de orçamento para pagar bolsas, comprar o equipamento previsto ou honrar compromissos internacionais.

“A destruição do sistema de Ciência e Tecnologia é coerente com a política económica do governo, dizem os cientistas do grupo Ciência e Técnica Argentina (CyTA), responsabilizando os membros do governo Macri pelo “plano destruidor” e apelando à mobilização para impedir o avanço das políticas do governo e do FMI no país.

Por seu lado, a Confederação de Trabalhadores da Educação (Ctera) anunciou uma greve para 13 de setembro, com manifestação junto ao Congresso Nacional, contra o acordo com o FMI. “Com este caminho de cortes selvagens, a educação está em perigo e não vamos ser cúmplices da destruição da educação das nossas crianças e jovens” diz o comunicado citado pelo jornal Página 12.

Esta terça-feira, sob o lema “Migrar não é delito”, centenas de migrantes protestaram junto ao Congresso Nacional contra as políticas xenófobas de Macri, em particular o decreto que alarga o âmbito de aplicação dos processos-relâmpago para expulsão do país. Esta foi a segunda Greve Migrante na Argentina, que acusa o governo de criminalizar os migrantes, aumentar a sua precarização e restringir-lhes direitos básicos como a saúde e a educação.

O decreto da polémica já foi declarado inconstitucional, mas o governo recorreu para o Supremo Tribunal. Ele estabelece o controlo dos antecedentes criminais tanto dos candidatos como dos migrantes que já trabalham no país. A gota de água foi o anúncio do governo de que vai lançar uma “app” de telemóvel para detetar imigrantes ilegais ou com antecedentes penais.

 

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