Boa noite.
Este filme foi feito com o meu acordo e a minha colaboração ao longo de muitos anos de trabalho e sem quaisquer apoios oficiais. Muito agradeço aos seus autores, Nelson Guerreiro e Pedro Fidalgo.
Só não estou hoje aqui porque decidi não participar nos “festejos” dos 40 anos do 25 de Abril. Festejar o quê? Foi isto que quisemos? Como é que aqui chegámos? Acaso estamos vivos? Deixámos que esta geração de gestores iníquos, filhos de Cavaco e netos de Salazar, alinhassem as nossas almas no seu dormitório. Deixámos que os homens pequenos, agora, sejam demais e se tenham tornado fatais. E, de novo, o trono é de um charlatão.
Eu estou outra vez exilado. Mas agora cá dentro, como diz Daniel Filipe. Continuo a trabalhar no meu ofício, no meu namoro com a menina gigante, mas sem saber, neste momento, em que combate combater. Qual será a chave escondida deste beco sem saída, se a minha gente se esqueceu da pergunta “De quem é o Carvalhal?”. E muito mais da resposta. Não há nenhuma ribalta ideológica, artística ou moral na qual me faça sentido exibir este tipo de trabalho que ando a fazer. Ou irei repetir tudo com a plateia a acender isqueiros como velas de Fátima para alumiar a nossa incompetência histórica? Para pentearmos um macaco. Para, perfilados de medo, disfarçarmos o medo que nos salva da loucura. E para cantarmos que vimos de longe e vamos para longe se já nos esquecemos de onde viemos e para onde vamos. A culpa dos heróis é serem sempre poucos. Acaso somos mais? Ou tão somente loucos? Conseguiremos ser loucos o suficiente para não nos contentarmos em gritar “Agarra, que é ladrão!” mas sim corrermos todos e cada um atrás do ladrão e impedir que nos continue a roubar na empresa, no bairro, na escola, em cada comunidade. Águas paradas não movem moinhos. ‘Raiz’, palavra de onde vem ‘radical’ e radicalidade, é o que está na base de todos os problemas e de todas as soluções. Raiz, onde é que estás, raiz de mim? Não estou hoje aqui, nem em palco nenhum. Se decidirem mudar de vida, contem comigo. Eu não esqueci que A Cantiga é uma Arma. Mas a cantiga só é arma quando a luta acompanhar.
José Mário Branco
25 de Abril de 2014
Ouça aqui a mensagem de José Mário Branco.