Na noite das eleições autárquicas, a 1 de Outubro de 2017, percebemos três particularidades do resultado eleitoral em Lisboa: o Partido Socialista foi a força política mais votada; o PSD teve um resultado eleitoral que remeteu a sua representatividade a metade da bancada do CDS; e o Bloco de Esquerda conseguiu garantir a eleição de um vereador. E na manhã seguinte chegou a novidade que faria a diferença: o Partido Socialista não consegue garantir a maioria absoluta, acabando um ciclo que lhe garantiu o poder absoluto durante duas décadas. Ignoraram-se durante anos as propostas à esquerda que poderiam garantir direitos fundamentais, como o da habitação ou mobilidade. António Costa, enquanto presidente da Câmara Municipal de Lisboa, incentivou a especulação imobiliária e a alienação de património municipal, chegando até a ponderar a venda dos bairros municipais.
O resultado, mesmo no contexto de um acordo que condicionou à esquerda a governação do país, não tornava certo o acordo ou aceitar responsabilidades num executivo. Após um mês de negociações, o resultado foi um documento com cerca de 80 pontos, com metas e prazos, que não sendo, obviamente, uma réplica do programa do Bloco, ultrapassou os limites do que se considerava possível na governação da cidade.E impôs ao PS um conjunto de medidas transformadoras para Lisboa.
As medidas que constroem o acordo respondem a direitos fundamentais que permitem a criação de um programa público de habitação, a renegociação da expansão do Metro e reforço de transportes para a zona ocidental, a gratuitidade dos manuais em Lisboa ou, ainda, a criação das primeiras salas de consumo vigiado, adiadas durante duas décadas. São propostas que o Bloco de Esquerda sempre defendeu e que neste novo contexto, acumula força para que aconteçam.
Foi a capacidade de conquista destes avanços para a cidade que tornou possível aceitar a responsabilidade do Pelouro da Educação e dos Direitos Sociais. O Bloco de Esquerda não recua perante a possibilidade de garantir direitos fundamentais e, além do que está estipulado no acordo ou nas grandes opções do plano, existem áreas que tendo em conta as responsabilidades executivas assumiram todo o destaque na agenda do Bloco. Falamos do aumento de investimento nos programas de pessoas em situação sem abrigo, na construção de um processo de diagnóstico do estado e reabilitação das escolas baseado na transparência e diálogo com a comunidade escolar, ou no aumento de 500 lugares de jardim de infância.
A relação entre o Bloco de Esquerda e o Partido Socialista na CML não é diferente da esfera nacional e é, como não podia deixar de ser, tensa. São partidos com visões diferentes para a cidade, programas eleitorais distintos e um acordo a ser cumprido. E, sem ilusões, sabemos que o Partido Socialista continua a apoiar-se na direita para aprovar projetos urbanísticos danosos para a cidade, mega-eventos como o web summit, ou chumbar propostas do Bloco, como é exemplo a proposta do Bloco para manter o miradouro do Adamastor como um espaço de acesso público sem vedação. É fundamental que o Bloco tenha as melhores propostas, construídas com e para quem mora em Lisboa.
O facto de o Partido Socialista não ter maioria absoluta, deu também uma nova expressão aos movimentos em defesa do espaço público. A política não está alienada pela decisão de um só partido e isso reflete-se também nas ruas e nos movimentos que lutam por causas como o Teatro Maria Matos, a praça do Martim Moniz, a torre da Portugália ou o miradouro do Adamastor.
O Bloco tem estado com estes movimentos, transformando as suas reivindicações em propostas concretas para mudar o curso de políticas do PS. Nem todas as lutas representam vitória, mas a inversão de importantes decisões na cidade, alicerçada nos movimentos sociais, mostra o caminho e traz novidade, como nos mostrou o grupo de cidadãos que se mobilizaram pela Praça do Martim Moniz, obrigando Fernando Medina e Manuel Salgado a desistir do projeto que respondia somente a interesses de privados.
A responsabilidade aceite pelo Bloco de Esquerda, em Lisboa, não condiciona a sua ação, pelo contrário, aumenta a sua proposta política, a sua influência cresce, permitindo dar mais força às reivindicações de movimentos e moradores.
Este painel não responderá certamente à complexidade que o título do debate representa. Governar uma cidade é uma realidade ainda distante da responsabilidade do Bloco de Esquerda em Lisboa. Isto não significa que o desafio do debate, tal como o do Bloco, seja menor. Será certamente um espaço para debater a responsabilidade executiva do Bloco em duas áreas fundamentais para a cidade, o cumprimento do acordo e a relação com o Partido Socialista e de como construir uma cidade para quem quer morar em Lisboa.
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