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“Várias ‘Odemiras’ do país são retrato de modelo de negócio que atropela direitos humanos”

O Bloco agendou para esta quarta-feira um debate parlamentar sobre o combate ao trabalho forçado e à exploração. José Soeiro apresentou o projeto de lei para acabar com a impunidade, responsabilizando diretamente toda a cadeia de subcontratação e as empresas utilizadoras.

Durante a sua intervenção, o deputado bloquista defendeu que “as várias ‘Odemiras’ do país são o retrato de um modelo de negócio que atropela o território e os direitos humanos, que põe a nu a ausência de planeamento infraestrutural, que revela a submissão do Estado às estratégias privadas de acumulação de lucro (como ficou patente nas regras para o armazenamento dos trabalhadores), que resulta de uma divisão internacional do trabalho assente na exploração laboral de migrantes através do esquema das subcontratações e das falsas empresas ‘prestadoras de serviço’”.

E “o problema não é de agora”, assinalou. José Soeiro lembrou que, há quase cinco anos, no verão de 2016, o Parlamento aprovou uma nova lei para “combater as formas modernas de trabalho forçado”. “Na altura, por iniciativa do Bloco, abriu-se um debate que permitiu introduzir no Código do Trabalho uma alteração que despertou a fúria das confederações patronais: a responsabilização solidária de toda a cadeia de contratação pelas violações dos direitos dos trabalhadores, pelos créditos e encargos sociais, bem como pelo pagamento das respetivas coimas”, assinalou.

O deputado recordou ainda que “a direita esteve contra esta lei e as quatro confederações patronais divulgaram um comunicado conjunto em que diziam ‘repudiar veementemente o conteúdo’ do diploma, em resultado do qual, alegavam, ‘as empresas de trabalho temporário, as agências privadas de colocação e os respetivos utilizadores ficam, na prática, proscritas, atento o enorme risco que passam a comportar’”.

Infelizmente, “a aplicação da lei mostrou-se muitíssimo difícil e o problema continuou, tendo até aumentando de escala”, alertou José Soeiro. “Na realidade, mais do que condenações, as empresas agrícolas de Odemira nos últimos anos tiveram sobretudo a lambugem dos benefícios fiscais” que, em 2019, “ascenderam a mais de meio milhão de euros”, continuou.

As dificuldades são variadas: logo a nível das ações inspetivas, prendem-se com a identificação e notificação das redes mafiosas encapotadas através de “empresas na hora”, criadas por falsos empresários que funcionam como testas-de-ferro. “Sem interlocutores, o processo é normalmente arquivado e a impunidade garantida”, avançou o dirigente bloquista.

Esta realidade condiciona a materialização da responsabilidade solidária. Acresce que “a estes bloqueios somam-se dificuldades processuais. A lei do processo de trabalho que temos não obriga o inspetor a identificar logo no auto o dono da exploração, toda a cadeia de subcontratação e os respetivos administradores. Mas devia obrigar”, explicou José Soeiro.

"Lei deve sancionar todos os que retiram benefícios das práticas ilícitas de exploração"

É neste contexto que o Bloco de Esquerda apresenta um projeto de lei que reforça os mecanismos de combate ao trabalho forçado e a outras formas de exploração laboral, responsabilizando diretamente toda a cadeia de subcontratação e as empresas utilizadoras, bem como gerentes, administradores e diretores.

“Para acabar com a impunidade, é necessário avançar para a responsabilização direta de toda a cadeia”, frisou o deputado.

Respondendo a quem argumenta que não se pode imputar, sem mais, a culpa ao dono da exploração, José Soeiro disse aquilo que “todos e todas sabemos: “o dono da exploração agrícola é na realidade não apenas cúmplice, mas o principal beneficiário destes abusos”. “As empresas prestadoras de serviços, os engajadores, só existem porque há quem as contrate e recorra a elas. Os donos das estufas são na verdade os grandes promotores destas práticas ilícitas, mesmo que não seja a mão deles a que segura o chicote”, acrescentou.

“A lei deve, por isso, sancionar todos os que retiram benefícios das práticas ilícitas de exploração. É pois fundamental imputar diretamente essa responsabilidade a todos os agentes para que se faça justiça e para começarmos a acabar com esta afronta”, rematou José Soeiro.

 

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