Está aqui

Uma feminista portuguesa que já falava de socialismo e Rosa Luxemburgo – em 1907!

Maria Veleda foi uma das mais aguerridas republicanas que defendeu que o lugar das feministas não era nos partidos burgueses mas nos que defendiam a causa operária. Por Luís Carvalho.
Maria Veleda.
Maria Veleda.

A feminista Hortense de Almeida criticava “os historiadores da República” que “deram a conhecer os nomes dos homens que se evidenciaram na defesa dos ideais que marcaram a luta política contra a monarquia mas, injustamente, silenciaram a acção das mulheres que a seu lado se bateram pelo mesmo objectivo”.

Chamava a atenção que “essas mulheres, não obstante a amnésia dos historiadores, não foram figuras anónimas no seu tempo”. Muito pelo contrário, “a sua actuação no movimento revolucionário tornou-as conhecidas tanto de correligionários como de adversários políticos e fê-las merecer a simpatia do povo que as tratava com carinho e respeito por “senhoras republicanas”.

E apontava a professora Maria Veleda como uma das “mais aguerridas” dessas “senhoras republicanas”.1

Efetivamente, ela teve um papel destacado. Desde logo pela sua intervenção na imprensa.

Chegou inclusive a ser condenada a uma pesada multa, por um artigo em que criticou a rainha Amélia por esta “não ter deixado de assistir a um espectáculo teatral a que se dirigia quando a sua carruagem atropelou uma mulher e o seu filho de colo, que ficou esmagado”.2

Já depois de derrubada a monarquia, Maria Veleda liderou a «Liga Republicana das Mulheres Portuguesas».

Salientou-se ainda pelas conferências que proferiu em vários pontos do país. Algumas das quais reuniu e publicou num livro, em 1909, com o título «A Conquista».

Uma dessas conferências realizou-se no concelho de Abrantes, em Rossio ao Sul do Tejo. Numa iniciativa do Partido Republicano Português.

Corria o ano de 1907, e ainda era rei Carlos de Bragança.

Há relato de que a iniciativa teve “grande concorrência de público, entre o qual se via representado em larga escala o elemento feminino”. E de que no final, Maria Veleda “foi extraordinariamente aplaudida”.3

Ela falou ali acerca da história da mulher através dos séculos, da sua influência “na educação e na emancipação dos povos”, e do seu papel numa “sociedade futura”.

E terminou com este apelo: “Levemos a mulher para o socialismo [...] O lugar da feminista não é nas fileiras burguesas nem tão poucos nas alas reacionárias: – é nos partidos operários, em volta da bandeira vermelha!”.4

Evocou mesmo o exemplo de algumas das mais célebres socialistas europeias da época, como Rosa Luxemburgo e Clara Zetkin.

Maria Veleda não chegou a aderir a um partido operário. Mas, no seio do feminismo republicano, representou de facto uma linha mais progressista, mais aberta às ‘mulheres do povo’. Diferente da linha mais elitista e burguesa personificada por Ana de Castro Osório.

Sem esquecer que também houve então, em Portugal, feministas operárias, socialistas e anarquistas. Numa história mais plural do que é uso dizer-se…

 

Notas:

1 Hortense Almeida (1995), Maria Veleda, págs. 145 e 147

2 Ibidem, pág. 155

3 «O Abrantes», 08/09/1907, pág. 2

4 Maria Veleda (1909), A Conquista, pág. 202

Termos relacionados Esquerda com Memória, Cultura
(...)