Trabalhadores do Facebook e stresse pós-traumático

11 de fevereiro 2020 - 10:19
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Os muitos moderadores que trabalham com o Facebook e o Youtube, contratados pela empresa Accenture, foram submetidos a assinar documentos em como entendem que o seu trabalho pode causar perturbação de stresse pós-traumático. Por Ernesto Oliveira

O Facebook está a ser alvo de processos na Califórnia e na Irlanda por parte de antigos trabalhadores, que dizem ter sofrido graves danos psicológicos na sua função de moderadores
O Facebook está a ser alvo de processos na Califórnia e na Irlanda por parte de antigos trabalhadores, que dizem ter sofrido graves danos psicológicos na sua função de moderadores

Existem profissões que em tempos foram tomadas como ficção científica. Se há uns anos ficção era passar os dias em frente a uma tela, em contacto com conteúdos traumatizantes produzidos por pessoas, para ganhar a vida, aqui está a viragem para a realidade.

Os muitos moderadores que trabalham com o Facebook e Youtube, contratados pela empresa Accenture, foram submetidos a assinar documentos em como entendem que o seu trabalho pode causar perturbação de stresse pós-traumático (PSPT). Esta perturbação caracteriza-se por episódios de dissociação da realidade. Certos sujeitos ou memórias são capazes de tirar a pessoa do presente, fazendo-a passar outra vez por aquilo que a traumatizou. PSPT (PTSD em inglês) é associado a perturbações de sonho e de ansiedade elevada e tem uma alta comorbilidade com perturbações depressivas.

"We regularly update the information we give our people to ensure that they have a clear understanding of the work they do", disse a empresa em comunicado. Este não aponta o dedo às consequências na saúde mental dos trabalhadores mas tenta tornar a situação legítima ao revelar que é transparente. É claro que compreender os riscos do trabalho não atenua as suas consequências.

A Google e o Facebook admitem ainda não terem analisado os documentos, no entanto exigem à Accenture que providencie suporte psicológico aos trabalhadores, algo que não acontece. Ao mesmo tempo, o Facebook está a ser alvo de processos na Califórnia e na Irlanda por parte de antigos trabalhadores. Estes dizem terem sofrido graves danos psicológicos na sua função de moderadores. Agressões físicas, tortura animal e pedofilia fazem parte daquilo que estes trabalhadores filtram todos os dias em vídeos e imagens: um dia normal de trabalho.

No Facebook, rede social com 1,6 mil milhões de utilizadores diários, a gigante Accenture emprega 15 mil moderadores por todo o mundo, direta e indiretamente. Imagine-se o número total de trabalhadores para esta função tendo em conta o resto de plataformas existentes na internet. Uma profissão fantasma, irreconhecida e esquecida pela maioria, cujos problemas diários ficam silenciados por acordos de confidencialidade às empresas. O esquema está montado.

Tendo em conta a realidade das redes sociais, das plataformas online, e da sua dimensão, já está mais que na altura de começar a deitar abaixo as paredes que tapam e escondem as dificuldades e limitações de direitos destes trabalhadores. Não existe justiça em sacrificar a saúde mental pelo lucro gerado através da experiência do utilizador. Existe uma necessidade de meter em prática novos métodos dignos e justos.

Artigo de Ernesto Oliveira