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A Revolução de Abril na imprensa italiana

Por singular coincidência, no dia 25 de Abril, em Itália, comemora-se o derrube definitivo do fascismo de Mussolini, em 1945. Por isso, na imprensa italiana de 26 de Abril de 1974, surge uma inevitável ligação entre os dois acontecimentos. Por Álvaro Arranja.

A Revolução de 25 de Abril, colocou Portugal nas primeiras páginas da imprensa internacional. O derrube da mais velha ditadura do continente europeu, a festa da libertação nos primeiros dias, incluindo o 1º de Maio, surpreendeu a Europa e o mundo.

Por singular coincidência, no dia 25 de Abril, em Itália, comemora-se o derrube definitivo do fascismo de Mussolini, em 1945. Por isso, na imprensa italiana de 26 de Abril de 1974, surge uma inevitável ligação entre os dois acontecimentos que partilham a primeira página de periódicos de diferentes tendências.

É o que podemos ver em jornais ligados às três principais forças políticas da Itália de 1974.

Il Popolo, diário da Democracia Cristã, partido no governo de Itália desde a queda do fascismo, concede à atualidade portuguesa um título a toda a largura da primeira página, na edição de 26 de abril. Numa análise aos antecedentes imediatos da revolução, o jornal sublinha a questão colonial, nomeadamente a repercussão da expulsão dos “missionários católicos que tinham denunciado as sanguinárias consequências de uma guerra absurda”. Refere-se concretamente aos “massacres de Moçambique” que fizeram “a questão portuguesa alcançar a opinião mundial”. Como jornal católico, sublinha as posições do Bispo de Nampula contra a guerra e a situação colonial, denunciando “as situações que ofendem a dignidade, a expressão cultural, política e social do homem africano”. Ao contrário de outros jornais, Il Popolo sublinha que aquele é “o dia dos jovens oficiais” e não dos generais.

L` Unitá, jornal do PCI do eurocomunista Enrico Berlinguer, segunda força política italiana (atingiria 34% dos votos em 1976), dedica a 1ª página do dia 26 ao “25 APRILE” italiano e à revolução portuguesa. Para o jornal, “o regime fascista que exibia na Europa o primado da estabilidade, caiu ontem em poucas horas, em circunstâncias que provam espetacularmente a sua falência no plano interno, internacional e africano.” .Segundo o L`Unitá, “da falência da guerra colonial ao agravamento da crise social interna, toda a política do regime provocava há muito o descontentamento entre os oficias subalternos. A revolta de 16 de março tinha já mostrado como tinha entrado nos quartéis a tensão social existente no país.” Apesar da pública divergência entre PCI e PCP, na edição de 3 de maio, o jornal publica uma mensagem de Berlinguer (naqueles anos defensor do “compromisso histórico” com os democratas-cristãos) para Álvaro Cunhal, enviando “calorosas saudações e um abraço fraterno”.

O Avanti, histórico jornal do Partido Socialista Italiano, também divide a primeira página de 26 de abril entre os dois “25 de Abril”. Num artigo sobre o “fim do salazarismo”, refere que “também os portugueses tiveram o seu 25 de Abril”. Sublinha que “o facto de a população de Lisboa tenha vindo para as ruas em liberdade”, permite ver “para Portugal um futuro de liberdade”. Outro espaço do jornal é dedicado à posição de Mário Soares, “no exílio há quatro anos”, de apoio ao golpe e o “seu desejo de voltar a Portugal”.

La Stampa, um dos diários italianos de grande expansão, propriedade do grupo FIAT, refere na primeira página de 26 de abril que, “com o golpe de Lisboa, acaba o mais velho fascismo europeu”. Antes de 25 de Abril, “Portugal era desafio à história deste tempo, já que enquanto todas as principais potências europeias tinham abandonado há anos os seus impérios, Salazar tinha continuado a acreditar na missão africana dos portugueses, expressão que escondia uma impiedosa repressão colonialista”.

Lotta Continua é um jornal ligado ao movimento político com a mesma designação, habitualmente qualificado como de extrema-esquerda e particularmente ativo nos anos 70. Também dá relevo à situação nas colónias portuguesas, referindo na edição de 27 de abril que na Guiné e Angola, os movimentos de libertação continuarão a sua luta, até ao reconhecimento do direito à independência. Noticia que “o PAIGC anunciou o reforço da luta armada”. Esta luta é considerada como “um apoio concreto ao povo português”.

Esta festa da liberdade dos dias iniciais da revolução terá o seu ponto culminante no 1º de Maio. No L`Unitá de 3 de maio, fala-se em título no “Poderoso Primeiro de Maio em Lisboa”.

O jornal resume o ambiente daqueles dias.

“Hoje há nos portugueses orgulho de si próprios.”

“Lisboa foi a cidade mais feliz do mundo”.

Sobre o/a autor(a)

Professor e historiador.
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