Privatizar hospitais resulta em piores cuidados de saúde, conclui estudo

05 de março 2024 - 13:04

Investigadores da Universidade de Oxford publicaram na revista Lancet uma análise de treze estudos realizados em países desenvolvidos que privatizaram a gestão hospitalar. O que se poupou na despesa pagou-se caro no excesso de mortalidade.

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Quarto de hospital
Foto Ken Jarvis/Flickr

O estudo publicado na semana passada na revista The Lancet Public Health foi dirigido por Benjamin Goodair, investigador em pós-doutoramento no Departamento de Política e Intervenção Social da Universidade de Oxford. Na apresentação, ele sublinhou que "esta análise põe em causa as justificações para a privatização dos cuidados de saúde e conclui que o fundamento científico da privatização dos cuidados de saúde é fraco. Em termos gerais, a privatização dos hospitais pode reduzir os custos, mas fá-lo à custa da qualidade dos cuidados de saúde".

A análise efetuada teve como base treze estudos científicos sobre casos concretos de privatização de serviços de saúde em países como o Canadá, Croácia, Inglaterra, Alemanha, Itália, Coreia do Sul, Suécia e Estados Unidos. Cada um deles verificou a qualidade dos cuidados de saúde prestados ao utente antes e depois da privatização, quer ao nível do hospital quer a nível regional. Entre os indicadores usados estão os níveis de pessoal, a combinação de doentes por tipo de seguro, o número de serviços prestados, a carga de trabalho dos médicos e os resultados em termos de saúde dos doentes, tais como as hospitalizações evitáveis.

Entre as principais conclusões, está a de que as privatizações correspondem em geral a piores cuidados de saúde. De facto, nenhum estudo analisado conseguiu comprovar sem margem para dúvidas a existência de efeitos positivos para os resultados em termos da saúde das pessoas atendidas.

Outra das conclusões é que os hospitais que passam da gestão pública para a privada tendem a apresentar maiores lucros, o que é conseguido através da redução de pessoal e da redução da proporção de doentes com cobertura limitada de seguro de saúde. Um dos efeitos do corte no pessoal, neste caso os funcionários da limpeza hospitalar, é o de maiores taxas de infeção dos doentes em hospitais.

Nalguns dos estudos analisados, os maiores níveis de privatização de hospitais corresponderam a maiores taxas de mortes evitáveis. O estudo aponta ainda que nalguns casos, como na Croácia, a privatização levou à melhoria do acesso dos doentes aos serviços de saúde, nomeadamente com a maior eficácia do sistema de marcação de consultas e a introdução de novos mecanismos de contacto, como as chamadas telefónicas para os doentes fora do horário normal de serviço.

A conclusão geral a partir dos resultados das privatizações na saúde, ao contrário do que advogam os seus defensores, é de que a concorrência no mercado não serve para melhorar os cuidados de saúde, bem pelo contrário. Como sublinha Aaron Reeves, co-autor do estudo, numa altura em que os sistemas de saúde "estão sob pressão devido ao envelhecimento da população, às restrições orçamentais e às repercussões da pandemia de COVID-19", alguns governos olham para a privatização como "uma solução única e simples para as pressões". O investigador alerta para o risco de que essa procura de reduções de despesa a curto prazo possa ser feita em detrimento dos resultados a longo prazo, uma vez que "a externalização de serviços para o sector privado não parece proporcionar simultaneamente melhores cuidados e cuidados mais baratos".

Os mesmos dois autores já tinham publicado em 2022 na mesma revista científica um outro estudo, desta vez incidindo sobre a externalização de serviços no NHS (o SNS britânico) para empresas privadas entre 2013 e 2020.  A conclusão a que chegaram foi que o maior recurso ao sector privado "correspondeu a um aumento significativo das taxas de mortalidade tratável, potencialmente em resultado de uma diminuição da qualidade dos serviços de saúde".

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