Está aqui

O que fazer no dia seguinte à saída do euro?

João Ferreira do Amaral e Francisco Louçã partiram de pontos de vista diferentes. Mas juntaram-se para pensar soluções tecnicamente razoáveis, quantificadas, uma alternativa que responda a dificuldades sem o recurso a slogans publicitários. O resultado é o livro “A Solução Novo Escudo”, lançado esta quinta-feira em Lisboa.
Uma alternativa para responder às dificuldades sem o recurso a slogans publicitários.

Na apresentação do livro editado pela Lua de Papel, Francisco Louçã explicou que os dois autores uniram esforços a partir de pontos de vista diferentes. “O João Ferreira do Amaral tem defendido sempre que a saída do euro é a primeira solução para Portugal. Eu tenho defendido, em contrapartida, que é a derradeira solução para Portugal, que é difícil”. Mas, explicou Louçã, “tenho vindo a pensar que não havendo reestruturação da dívida e não havendo, portanto, um alívio das condições estruturais da balança de pagamentos em Portugal, a mais difícil pode tornar-se a única solução no nosso contexto”.

Os dois colegas do ISEG juntaram-se no projeto deste livro porque não estão dispostos “a aceitar mais um debate em que tratam as alternativas como se fossem slogans publicitários. Nos queremos contrastar, tratando a natureza dos problemas, procurando identificá-los, apresentando o nosso ponto de vista, certamente discutível, mas comprometendo-nos com soluções tecnicamente razoáveis apresentadas, quantificadas”.

A soberania nacional exige

“Fizemos este livro para responder à pergunta: independentemente de considerarmos que é a melhor ou a única solução, se tivermos de optar pela saída do euro, o que é que fazemos?”

E enumera: os problemas jurídicos da relação com a União Europeia; os problemas práticos da emissão de moeda; o controlo das contas externas; impedir que haja fugas de capitais; garantir a segurança dos depósitos dos depositantes e das poupanças; garantir a estabilidade do sistema bancário; garantir as condições legais do Estado, do novo Banco de Portugal, a nova moeda, a política monetária, a política fiscal.

“Fizemos este livro para responder à pergunta: independentemente de considerarmos que é a melhor ou a única solução, se tivermos de optar pela saída do euro, o que é que fazemos?”

Esta alternativa pode ser feita em negociação com a Europa, que procuraria assim evitar um efeito dominó. “Mas não havendo um acordo com a UE, são exigidas à soberania nacional medidas de conjunto muito mais rápidas e muito mais profundas sem qualquer apoio de assistências de liquidez e de um entendimento jurídico” adverte Louçã. Seria então preciso redenominar os contratos, operar a reestruturação da dívida de um ponto de vista unilateral e ter um controlo sobre o sistema bancário que permita assegurar a proteção dos depósitos.

“Estudámos o seu impacto, simulámos o seu efeito, verificámos que tipo de desvalorização é que teria que ocorrer para se conseguirem estes resultados”.

Para Louçã, a alternativa da austeridade, para ter o mesmo impacto nas contas externas portuguesas, na balança de pagamentos, teria preciso baixar os salários em 60%. “Isso não é aceitável e não é possível baixar o rendimento da população portuguesa em 60%. Por isso se exige a procura de alternativas”, conclui.

Concretizar ideias

João Ferreira do Amaral revelou que a ideia do livro foi de Francisco Louçã, a que ele aderiu logo, porque depois da publicação do livro “Por que devemos sair do euro”, muita gente lhe disse que devia trabalhar mais em pormenor o que pode ser a saída do euro e concretizar algumas ideias que vinham no livro. “Permitiu-me chegar à conclusão de que a saída não tem de ser uma catástrofe. A teoria da catástrofe teve o seu papel político, nomeadamente em Portugal mas mais ainda na Grécia, servindo como um papão, evitando que as pessoas pensem em alternativas”, diz o economista, que afirma não ter dúvidas de que na Grécia, se tivesse saído do euro, as pessoas não estariam tão mal como agora, “mesmo que a saída tivesse corrido mal”.

O cenário da desagregação do euro é um cenário plausível”

João Ferreira do Amaral adverte que dentro da zona euro, “se houver uma nova crise financeira, e ela até nem tem de ser tão grave quanto as fases mais difíceis da de 2007, a Europa não está preparada para lhe resistir”.

João Ferreira do Amaral adverte que dentro da zona euro, “se houver uma nova crise financeira, e ela até nem tem de ser tão grave quanto as fases mais difíceis da de 2007, a Europa não está preparada para lhe resistir”. Os níveis de endividamento em muitos países continuam muito altos, a política de austeridade não serviu para os reduzir, muitos países continuam com a notação lixo ou próximo disso, o desemprego é estrutural, a recessão começa a tornar-se uma verdadeira depressão. “O cenário da desagregação do euro é um cenário plausível. O segundo risco é que Portugal se comprometeu com coisas que não pode cumprir. Comprometeu-se com o Tratado Orçamental sem o poder cumprir”.

E o professor do ISEG conclui: “Eu não aceito mais o debate de críticos que não dão alternativas. Ou saídas miríficas como não cumprir o Tratado Orçamental, ou que a Europa passe a ser de repente um espaço de ajuda. O debate tem de ser: se esta alternativa não é desejável, então qual é a alternativa exequível?”.

Artigos relacionados: 

Termos relacionados Sociedade
(...)