O futuro da crise climática

05 de janeiro 2025 - 18:20

Ao contrário do que afirmam os chamados “colapsólogos”, o futuro ainda não foi escrito. Os fatalistas que proclamam em voz alta que a sorte está lançada contribuem, com sua inércia, para o desfecho fatal. A luta, a resistência e a mudança de sistema são possíveis. Mas é urgente.

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Michael Löwy

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Manifestação da Greve Climática Estudantil.
Manifestação da Greve Climática Estudantil. Foto de Ana Mendes.

A crise climática já começou. Cada ano é o mais quente jamais registado. Vemos todos os dias nos jornais: enormes incêndios florestais, inundações e secas, colheitas perdidas, espécies ameaçadas, rios desaparecendo, regiões do planeta onde o aumento das temperaturas torna qualquer atividade impossível, etc. Há cada vez mais vítimas nos quatro cantos do planeta.

A maioria dos humanos sente diretamente na pele o início do aquecimento global em algum momento do ano. Para onde estamos a ir? A eleição do negacionista do clima Donald Trump como presidente dos Estados Unidos pode agravar o perigo.

Os cientistas admitem que as suas previsões até agora têm sido muito otimistas. O processo de mudanças climáticas avança muito mais rapidamente do que o previsto. Eventos dramáticos correm o risco de acontecer não no final do século mas nas próximas décadas. Alguns exemplos:

(i) O derretimento das calotas polares e a elevação do nível do mar. Tudo está a acelerar, seja na Gronelândia ou na Antártida. E o nível do mar sobe inexoravelmente. Se todo o gelo se desfizer, esta elevação poderá atingir 80 metros. Basta um ou dois metros para que as principais cidades costeiras da civilização humana – Veneza, Amesterdão, Londres, Nova Iorque, Rio de Janeiro, Xangai – desapareçam no mar.

(ii) O derretimento dos glaciares dos Alpes, dos Himalaias, etc. Num primeiro momento, isto provocará imensas inundações. Num segundo momento, os grandes rios desaparecerão. Onde encontraremos água para beber?

(iii) O aquecimento global, os incêndios florestais, o desaparecimento dos rios e a seca provocam a desertificação das terras. A agricultura será impossível em grandes extensões de deserto.

(iv) O aumento das temperaturas tornará inabitáveis vastas regiões. Até onde poderá ir este aumento? A partir de qual temperatura a vida humana – e a de muitas outras espécies – estará ameaçada?

Na Divina Comédia, Dante Alighieri descreve a condição dos condenados no sétimo Círculo do Inferno da seguinte forma: vagueiam numa vasta extensão de areia árida, ardente, sujeitos a uma chuva de chamas.

É este o futuro que nos espera? Se permitirmos a continuação do business as usual, não podemos excluir esta evolução.

Contudo, ao contrário do que afirmam os chamados “colapsólogos”, o futuro ainda não foi escrito. Os fatalistas que proclamam em voz alta que a sorte está lançada contribuem, com sua inércia, para o desfecho fatal. A luta, a resistência e a mudança de sistema são possíveis. Mas é urgente. Comecemos pela Blockadia: parar, impedir e desmantelar os projetos ecocidas mais evidentes. Ter como horizonte o projeto de mudança de civilização, em rutura com o sistema capitalista industrial moderno.

Os obstáculos são imensos? O inimigo é poderoso? A consciência do que está em jogo é pouco difundida? Certamente, mas os nossos antepassados enfrentaram desafios semelhantes quando afrontaram a monarquia absoluta, a escravatura ou o fascismo. Como resumiu Bertolt Brecht: os que lutam podem perder, os que não lutam já perderam.


Michael Löwy é diretor de investigação em Sociologia no Centre nationale de la recherche scientifique (CNRS). Autor, entre outros livros, de Franz Kafka sonhador insubmisso (Editora Cem Cabeças).

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