Natal, comemoramos o que importa ou a nossa hipocrisia coletiva?

por

Isabel Oliveira

22 de dezembro 2024 - 11:33
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Enquanto brindamos ao "espírito natalício", e adornamos árvores com luzes cintilantes, fechamos os olhos ao caos que ajudamos a alimentar. O Mundo está dilacerado pela fome, pela guerra, pela exclusão e pela destruição ambiental. Será que temos coragem de enfrentar a verdade?

Luzes de Natal
Fotografia de Pedro - Caixa de Luz/Flickr

O Natal é, para muitos, uma época de celebração e partilha. Mas sejamos honestos: será que celebramos o que importa ou apenas a nossa hipocrisia coletiva?

Enquanto brindamos ao "espírito natalício", e adornamos árvores com luzes cintilantes, fechamos os olhos ao caos que ajudamos a alimentar. O Mundo está dilacerado pela fome, pela guerra, pela exclusão e pela destruição ambiental. Será que temos coragem de enfrentar a verdade?

Falamos de amor e solidariedade enquanto caem bombas que destroem comunidades inteiras, enchemos carrinhos de compras com presentes, enquanto milhões de pessoas, incluindo os sem-abrigo à porta das nossas casas, passam frio e fome. É essa a "paz na Terra" que celebramos? É essa a "humanidade" que nos orgulhamos de partilhar?

O mundo está repleto de tragédias humanitárias às quais fechamos os olhos, convenientemente distraídos pela correria natalícia. O povo palestiniano, por exemplo, vive há 75 anos subjugado por uma ocupação que parece interminável. Israel extermina a Gaza e a sua população invade e ocupa a Cisjordânia, bombardeia a Síria por prevenção, bombardeia o Líbano por retaliação… e o que fazemos nós? Publicamos mensagens de "boas festas" nas redes sociais enquanto ignoramos as explosões que ecoam nas terras deles e o silêncio ensurdecedor da indiferença global. Sim, pois apesar de grande parte dos países ao redor do mundo condenar o genocídio palestiniano, Israel continua sem enfrentar boicotes significativos que o impeçam de continuar. Mas talvez o mais revoltante seja a forma como justificamos a nossa apatia. Dizemos que "não podemos fazer nada", mas será verdade? Cada presente descartável que compramos, cada refeição que desperdiçamos e cada recurso natural que esgotamos contribuem diretamente para a manutenção de um sistema que perpetua desigualdades e destrói o planeta. E nós somos cúmplices, conscientes ou não.

A realidade é simples: mudar depende de nós.  Depende da nossa capacidade de sair da bolha do privilégio, de questionar o sistema e de fazer escolhas mais conscientes, pressionar os governos, boicotar as grandes corporações e gritar bem alto que não nos representam.

Que tal começar agora?  Podemos começar por encarar as ruas iluminadas não como um símbolo de alegria, mas como um contraste gritante com a escuridão em que vivem os esquecidos, sejam eles os sem-abrigo que vemos todos os dias e ignoramos, sejam as famílias que lutam contra a fome, sejam os povos esmagados por guerras intermináveis. Podemos olhar para o excesso nas nossas mesas e pensar no que estamos a destruir: recursos naturais, equilíbrio ambiental e a própria possibilidade de futuro.

Este Natal, não nos  limitemos a comemorar. Perguntemos: que papel estamos a desempenhar neste sistema que alimentamos perpetuamente? Estamos a lutar por justiça social e ambiental ou a contribuir para a desigualdade e o caos?

O verdadeiro espírito natalício não está no dar e receber presentes. Está em abrir os olhos para o que importa e transformar palavras bonitas em ação concreta. A mudança que o mundo precisa começa no Natal – e começa em nós.

É preciso também aprender com os jovens que, apesar de serem frequentemente desvalorizados, têm a coragem de se organizar e lutar por um mundo mais justo e sustentável. Respeitar a sua voz e apoiar as suas causas é mais do que uma obrigação; é reconhecer que eles estão a carregar o peso da mudança que muitos evitam.

Que este Natal não seja apenas uma festa, mas o início de uma revolução: pela dignidade, pela justiça, pela juventude que ousa sonhar e por um futuro onde todos tenham lugar.

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