O debate desta terça-feira da moção de confiança apresentada pelo Governo ficou marcado pelas manobras de última hora do Governo. Primeiro tentou parar os trabalhos para ter um período de negociações com o Partido Socialista. Depois, já quase no final dos tempos de intervenção, afirmou aceitar retirar a moção de confiança se aquele partido aceitasse uma Comissão Parlamentar de Inquérito mas só se essa fosse feita em apenas 15 dias, alterando as condições de marcação deste instrumento que é decidido pela Assembleia da República - e não pelo executivo que é alvo desse inquérito - e impondo um prazo limitado para esse escrutínio.
Sobre isto, Mariana Mortágua vincou que as “Comissões Parlamentares de Inquérito não se regateiam em cima de debates de moções de confiança” e o que aconteceu foram “números políticos lamentáveis a que os portugueses não deviam estar obrigados a assistir”.
A moção de confiança acabou mesmo por ser rejeitada com os votos contra de PS, Bloco, PCP, Livre, PAN e Chega.
No debate que antecedeu a votação, a coordenadora do Bloco quis deixar clara a sucessão de acontecimentos que conduziu a este desfecho. Começou por recordar que o escrutínio sobre a Spinumviva foi iniciado “a partir de uma alteração inexplicável à lei dos solos feita por governantes que tinham interesses imobiliários” e que “um deles acabou por sair do Governo”. O Bloco começou por tomar “como boas” as explicações do primeiro-ministro de que esta empresa era “uma entidade para gerir um património de família, para gerir uma quinta no Douro, imóveis em Vila Real, e o Bloco não insistiu nessa questão”.
Entretanto ficou-se a saber que esta “não é nada daquilo que nos tentou fazer crer” Luís Montenegro, mas “uma empresa para gerir os seus negócios, é uma empresa que serve os clientes que foram angariados por Luís Montenegro e por mais ninguém, uma empresa que tem clientes que continuaram a pagar avenças enquanto o Luís Montenegro era primeiro-ministro e isso coloca em questão um dever legal de exclusividade”.
O Bloco entendeu na altura que o primeiro-ministro “tinha omitido informações importantes” e enunciou-as: os clientes, os pagamentos, os serviços e as datas dos serviços. A declaração ao país de Montenegro “não acrescentou nada” sobre isto, “anunciou a passagem da empresa, que alegadamente já não era sua para os seus filhos, e a anunciou que pediria escusa de decisões sobre um cliente que supostamente já não era cliente”, levando a coordenadora bloquista a questionar: “se entendia que não havia um conflito de interesses, porque é que pediu escusa? Se havia um conflito porque é que não o declarou antes das notícias virem a lume e o denunciarem?”
Em seguida, o Bloco de Esquerda enviou 14 perguntas escritas. Na resposta enviada uma semana depois, Montenegro “voltou a não dar esclarecimentos”, “não acrescentou nenhuma informação àquilo que já tinha sido divulgado” e respondeu a outras perguntas “que não fizemos”.
A porta-voz bloquista reiterou assim que, nesta fase, “continuamos sem saber o nome dos clientes não regulares, continuamos sem saber o valor das avenças, a prova dos serviços e os serviços especificamente prestados, quem prestou os serviços, como prestou os serviços, qual é o vínculo desses colaboradores e quanto foi cobrado por essa prestação”. Para além disso primeiro-ministro “continua sem conseguir justificar o negócio jurídico da venda das cotas” e sem dizer se declarou contas depósitos à ordem que no seu conjunto somam mais de 50 salários mínimos nacionais.
Mariana Mortágua rematou afirmando que um primeiro-ministro “não pode receber avanças de uma empresa que não existe fora da esfera do primeiro-ministro” ou “recusar-se a fornecer os dados sobre a empresa”. E destacando que foi Montenegro quem decidiu uma moção de confiança. Fê-lo, porque se pudesse continuar a ser Primeiro-Ministro, continuava, mas como não pode apresenta uma moção de confiança e atira o país para eleições”.