Miguel Albuquerque alvo de buscas por suspeitas de corrupção

24 de janeiro 2024 - 10:51

Megaoperação da Polícia Judiciária tem como principais alvos o presidente do Governo Regional da Madeira e o presidente da Câmara do Funchal, Pedro Calado, apontado como sucessor do líder do PSD regional. Coordenadora do Bloco/Madeira diz que as buscas "não são surpreendentes".

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Miguel Albuquerque
Miguel Albuquerque numa sessão do PSD em Santa Cruz na véspera das buscas. Foto PSD Madeira/Facebook.

Segundo a CNN Portugal, cerca de duzentos operacionais da Judiciária estão a realizar mais de 50 buscas desde a manhã de quarta-feira no Funchal. Em causa estão três inquéritos que incluem suspeitas de corrupção e outros crimes praticados por altos titulares de cargos públicos e políticos na Madeira, a começar pelo presidente do Governo Regional e líder do PSD/Madeira, Miguel Albuquerque, e o seu antigo vice e atual presidente da Câmara do Funchal, Pedro Calado. As buscas da Judiciária decorrem também no Palácio do Governo Regional da Madeira, na residência oficial do Presidente do Governo e nos serviços de algumas secretarias regionais, além da Câmara Municipal do Funchal. O Jornal da Madeira acrescenta que as buscas decorrem também noutros locais do país, incuindo nos Açores, em empresas que venceram concursos públicos na Região, nomeadamente construtoras, mas também fornecedores de outros bens e serviços.

As suspeitas que envolvem Miguel Albuquerque não são novas. A venda de uma quinta do líder do PSD/Madeira em 2017 a um fundo imobiliário, que depois a arrendou ao Grupo Pestana para exploração turística, na mesma altura da renovação da concessão da Zona Franca da Madeira ao mesmo Grupo Pestana, foi alvo de investigação nos últimos anos.

Albuquerque é suspeito de ter participação no fundo a quem vendeu a quinta do Arco (mais conhecida como Quinta das Rosas) e que os 3,5 milhões pagos sejam uma contrapartida pelo ajuste direto da Zona Franca àquele grupo, um processo liderado por Pedro Calado enquanto governante. Em 2021, o DCIAP promoveu buscas à residência de Miguel Albuquerque, que não foi constituído arguido. Enquanto presidente do Governo Regional, Albuquerque goza de imunidade.

No caso de Pedro Calado, além da já conhecida intervenção no caso do ajuste direto ao Grupo Pestana, a CNN revela que o Ministério Público suspeita que o autarca tem um pacto corruptivo com o grupo AFA, que detém os hotéis Savoy, materializado no favorecimento do licenciamento camarário em troca de contrapartidas. Calado foi vereador das Finanças quando Albuquerque era presidente da autarquia funchalense. Depois foi trabalhar para o grupo AFA, antes de assumir a vice-presidência do Governo Regional e ter vencido as autárquicas em 2021.

Três detidos e muitas suspeitas sob investigação

Em comunicado, o Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) afirma que foram realizadas buscas domiciliárias e não domiciliárias em cerca de 60 locais (aproximadamente 130 mandados), 45 desses locais na Região Autónoma da Madeira. Foram detidas três pessoas, cuja identidade não revelou. Segundo o Observador, tratam-se do presidente da Câmara do Funchal, Pedro Calado, do líder do grupo AFA, Avelino Farinha, e do líder da sucursal do grupo em Braga, Caldeira Costa.

As investigações "incidem, sobretudo, sobre a área da contratação pública, essencialmente sobre o elevado número de contratos de empreitada celebrados pelo Governo Regional da Madeira e várias entidades públicas da Região Autónoma com empresas da região". Concretamente, a operação visou "várias dezenas de adjudicações em concursos públicos envolvendo, pelo menos, várias centenas de milhões de euros", existindo "suspeitas de que titulares de cargos políticos do governo regional da Madeira e da Câmara Municipal do Funchal tenham favorecido indevidamente algumas sociedades/grupos em detrimento de outras ou, em alguns casos, de que tenham exercido influência com esse objetivo".

Também sob investigação estão um conjunto de projetos ligados às áreas do imobiliário e turismo recentemente aprovados, as suspeitas de pagamento pelo Governo Regional da Madeira a uma empresa de construção e engenharia da região de elevados montantes a coberto de uma transação judicial num processo em que foi criada a aparência de um litígio entre as partes e as suspeitas sobre adjudicações pelo Governo Regional de empreitadas de construção civil relativamente aos quais o Tribunal de Contas suscitou dúvidas e pediu esclarecimentos.

O DCIAP refere ainda investigações sobre "atuações que visariam condicionar/evitar a publicação de notícias prejudiciais à imagem do Governo Regional em jornais da região, em moldes que são suscetíveis de consubstanciar violação da liberdade de imprensa" e os "benefícios obtidos por titulares de cargos políticos, por causa dessas funções, que ultrapassam o socialmente aceitável".

"Em causa estão factos ocorridos a partir de 2015, suscetíveis de consubstanciar crimes de atentado contra o Estado de direito, prevaricação, recebimento indevido de vantagem, corrupção passiva, corrupção ativa, participação económica em negócio, abuso de poderes e de tráfico de influência", resume o comunicado.

Dina Letra: "Favorecimento a grandes grupos económicos é visível e é falado em todas as campanhas"

Em reação à notícia das buscas desta quarta-feira, a coordenadora do Bloco de Esquerda/Madeira afirmou à SIC que o partido acompanha "com preocupação" as operações em curso e vai "aguardar pelo desfecho do que está acontecer", considerando que "os detentores de cargos públicos devem estar acima de quaisquer suspeitas".  

Para Dina Letra, estas buscas "não são surpreendentes tendo em conta todo o contexto que nós temos aqui e que vem sendo divulgada ao longo dos tempos e também por aquilo que nós sentimos na própria Região que há um claro favorecimento do Governo Regional, da Câmara Municipal do Funchal a grandes grupos económicos e isso é visível e é falado em todas as campanhas". Mas "uma coisa é o que se diz e outra é existir provas concretas de que facto há favorecimento ou prevaricação", prosseguiu a coordenadora bloquista madeirense, lembrando as declarações do antigo deputado e governante do PSD/Madeira Sérgio Marques numa entrevista ao Diário de Notícias no ano passado, em que reforçou as suspeitas e afirmou que a sua saída do Governo de Albuquerque em 2017 se ficou a dever a pressões de empresários. 


Notícia atualizada às 12h30 com a reação da coordenadora do Bloco/Madeira e às 15h20 com as informações do comunicado do DCIAP.

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