I.
Hoje, 29 de Junho de 2021, é o 110º aniversário da morte de Eudóxio Azedo Gneco.
Durante cerca de 40 anos, ele esteve na linha da frente como organizador e propagandista, em Portugal, das várias vertentes do movimento operário: sindical e política, cooperativa e mutualista, passando pela imprensa e as celebrações do 1º de Maio.
Já foi um elemento activo nos primeiros protótipos de central sindical, a Associação Fraternidade Operária (fundada em 1872) e a Associação dos Trabalhadores na Região Portuguesa (em 1873). Foi um dos principais fundadores do Partido Socialista Português (em 1875) e da Confederação Nacional das Associações de Classe (em 1894).
II.
Azedo Gneco foi um dos raros portugueses que trocaram correspondência com Friederich Engels, nos anos de 1876/77 – depois de José Nobre França e José Fontana. Desconhecemos as cartas que Gneco terá recebido de Engels, mas das cartas que lhe enviou, o historiador César de Oliveira publicou três, guardadas no Instituto Internacional de História Social de Amesterdão.1
São cartas em que Gneco informava Engels das actividades socialistas em Portugal e lhe manifestava o seu apoio à corrente marxista, nomeadamente nas divergências com a corrente anarquista.
Nessa altura, já dois importantes textos marxistas haviam sido traduzidos e publicados em Portugal, o Manifesto Inaugural da Associação Internacional dos Trabalhadores e o Manifesto do Partido Comunista. Saíram ambos em 1873, no jornal Pensamento Social, que funcionou como órgão da Associação Fraternidade Operária.
Em 1875, um novo jornal socialista, O Protesto, com Gneco na redacção, tinha vindo acrescentar já alguma divulgação de O Capital de Marx, do qual publicou pequenos excertos, ao longo de dois meses. Seguiu-se um trabalho mais extenso de José Nobre França, sobre “A situação do proletariado”, que se apresentava como baseado no Capital de Marx.
III.
Quando Marx morreu, em 1883, foi-lhe prestada uma homenagem em Lisboa, organizada pela Associação dos Trabalhadores na Região Portuguesa. E Azedo Gneco foi o principal orador nessa iniciativa.
Desconhecemos o conteúdo do seu discurso. Mas segundo o relato do jornal A Voz do Operário, “a sessão esteve animada pelo belíssimo discurso pronunciado pelo sr. Azedo Gneco”. E parece que, “durante cerca de uma hora e um quarto teve aquele sr. a assembleia suspensa dos seus lábios, pela sua palavra fluída, pela correcção da sua frase, pelos elevados princípios que proclamou e sustentou, mas tudo numa linguagem de fácil compreensão, levantando assim a convicção a todos os espíritos”.2
IV.
Em 1896, Azedo Gneco foi o delegado da Associação dos Trabalhadores na Região Portuguesa ao congresso da Segunda Internacional, que se realizou em Londres. E aí reafirmou o seu apoio à corrente marxista que já expressava nas suas cartas a Engels vinte anos antes.
Uma das decisões mais marcantes desse congresso foi a exclusão da corrente anarquista. Apesar de todas as divergências, tinha havido um caminho comum até então, entre marxistas e anarquistas, no seio da Internacional. Gneco foi um dos que votaram a favor dessa ruptura e exclusão.
Azedo Gneco foi no seu tempo o mais destacado porta-voz da corrente marxista no movimento operário português, nomeadamente na defesa da participação política dos trabalhadores (contra anarquistas) e da sua independência de classe (contra republicanos).
É sem dúvida um nome a recordar na história do marxismo em Portugal.
Notas
1Oliveira, César (1978), 13 cartas de Portugal para Marx e Engels, Lisboa: Iniciativas Editoriais, pp. 55 a 68. Este volume inclui ainda uma quarta carta de Gneco que não identifica o destinatário, sendo possível que também tivesse sido endereçada a Engels.
2A Voz do Operário, 22/04/1883, p.3