Jornalistas de órgãos de informação alemães como os canais televisivos WDR e NDR ou o jornal Süddeutsche Zeitung, tiveram acesso aos documentos a partir de uma fuga de informação na Social Design Agency (SDA), uma empresa tecnológica russa que teve a seu cargo várias campanhas de desinformação dirigidas a muitos países com o objetivo de diminuir o apoio da opinião pública à Ucrânia e beneficiar os partidos da extrema-direita com interesses alinhados com o Kremlin.
Os documentos foram partilhados com a Schemes, o serviço ucraniano da Radio Free Europe que resume no seu site algumas das conclusões da investigação. O método da campanha de desinformação, admite num vídeo interno o líder da SDA Ilya Gambashidze, era o de “recolher e analisar informações dos meios de comunicação ocidentais, desenvolver as nossas próprias narrativas e transformá-las em conteúdos”.
Os meios usados para fazer passar estes conteúdos passaram por vídeos falsificados, muitos memes e notícias falsas apresentadas com o grafismo de órgãos de comunicação credíveis, uma tática usada pelo Chega em Portugal e denunciada na altura pelo Público e a Rádio Renascença.
Segundo um dos documentos analisados, na mira dos analistas russos estiveram países como a Alemanha, França, Espanha, Itália e Polónia. Essa campanha passava por associar os “liberais e globalistas” a uma postura guerreira e militarista, contrapondo o risco de um ataque russo à UE, associar o apoio aos direitos LGBT como prejudicial à saúde mental das crianças, aumentar o descontentamento social com a inflação e o desemprego e acusar os “globalistas da UE” de quererem transformar a Europa num “campo militar totalitário” semelhante à Ucrânia. No caso alemão, o objetivo assumido seria conseguir que mais de metade da população “não estivesse disposta a sacrificar o seu bem-estar em troca da derrota da Rússia”, promovendo a narrativa de que os EUA estão a usar a Alemanha na sua guerra económica contra a Rússia, de que as armas alemãs enviadas para Kiev servem para cometer crimes de guerra e que já começaram a entrar no mercado negro.
Um dos memes produzidos no ano passado pela SDA a ridicularizar o presidente ucraniano chegou a ser partilhado pelo bilionário Elon Musk na rede social X, o que fez explodir o alcance com mais de 95 mil partilhas dos seus seguidores.
Entre janeiro e abril deste ano, a SDA produziu quase 40 mil conteúdos, dos quais 30 mi posts, 4.600 vídeos e 1.500 artigos. Um destes conteúdos, produzido com o grafismo do jornal sensacionalista alemão Bild, dizia que refugiados ucranianos tinham incendiado a casa da família alemã que os acolheu quando tentavam queimar uma bandeira russa. Outros mostravam documentos falsos supostamente da autoria do comando militar ucraniano, um deles a afirmar que os soldados que se rendessem seriam considerados traidores.
Um dos documentos consultados gaba-se não apenas do sucesso da extrema-direita nas eleições europeias, mas também do facto de ele ser entendido em todo o mundo como sendo um sucesso da política externa e da propaganda russa.