O jornal Expresso teve acesso aos documentos partilhados pelo diário italiano La Reppublica relativos ao mandado de detenção de uma assistente parlamentar do eurodeputado italiano da Forza Italia (PPE) Fulvio Martusciello. Nesses documentos é exposta a tese da investigação de que o lobista português Nuno Wahnon Martins terá passado faturas fictícias a duas empresas financiadas pelo ramo belga da Huawei por serviços de consultoria, recebendo em troca 49.450 euros em dinheiro. E terá depois, nos cinco meses seguintes, distribuído o dinheiro através de transferências bancárias por aquele eurodeputado (6.700 euros), a assistente detida em Itália, Lucia S. (1.000 euros) um outro assistente parlamentar (14.800 euros), Adam Mouchtar, que viu o gabinete selado na operação policial no interior do Parlamento Europeu, e mais 11.700 euros a outras pessoas não identificadas.
Parlamento Europeu
Lobista e sionista: português apanhado na corrupção da Huawei
porLuís Branco
Nuno Wahnon Martins ainda se encontra detido em França à espera de ser ouvido por um juiz de instrução para o extraditar para a Bélgica e será defendido pelo advogado Christophe Ingrain, que já foi advogado do ex-presidente Nicolas Sarkozy. O causídico disse aos jornalistas que Wahnon Martins “contesta os factos de que é suspeito” e que “reserva as suas explicações para o juiz de instrução”. Também a assistente italiana de Martusciello nega as acusações, alegando que tinha apenas tarefas de secretariado pessoal do eurodeputado, não conhece os restantes envolvidos e está pronta a esclarecer as dúvidas da justiça belga. Por seu lado, a Huawei diz que está a colaborar com a investigação e reafirma a sua política de “tolerância zero em relação à corrupção”
O principal suspeito deste Huaweigate é Valerio Ottati, que já trabalhou como assistente parlamentar de dois eurodeputados que lidavam com as relações com a China, antes de se tornar o homem das relações públicas para a Europa da Huawei em 2019. Numa escuta colocada no seu automóvel e citada no mandado de detenção, foi gravado a dizer a um funcionário da Huawei na Polónia que os lóbistas de Bruxelas “muitas vezes passam o risco e chegam a pagar por propostas de alteração” aos documentos sujeitos a votação.
Relação com lobista português vem desde que Martusciello presidia à comissão de relações com Israel
O caso em investigação remonta a 2021, no auge da pressão para que a União Europeia afastasse a Huawei dos seus equipamentos da rede 5G. Um grupo de oito eurodeputados italianos e romenos, liderados por Martusciello, enviou uma carta à Comissão Europeia a contestar o “racismo tecnológico” da medida. A investigação encontrou um rascunho da carta no computador de Ottati, indicando que ele teve algum papel na edição. O nome do criador do documento é alguém chamado “Nuno”.
Parlamento Europeu
Instituto ultraliberal suspende lobista apanhado na teia da Huawei
Nuno Wahnon Martins era presença assídua no gabinete de Martusciello pouco depois da sua entrada no Parlamento Europeu em 2014. Embora se apresentasse como assessor do eurodeputado, não estava contratado pelo Parlamento Europeu, mas representava o Congresso Judaico Europeu, do qual chegou a ser diretor dos assuntos europeus. Martusciello foi escolhido para presidir ao comité de relações com Israel e Wahnon Martins era o lobista sionista instalado no centro dos trabalhos da comissão. Atividade que mantém até ao momento, enquanto secretário-geral da Associação Lusa Portugueses por Israel. Até ser detido há dez dias, estava registado como lobista do ultraliberal Instituto Milton Friedman, liderado por outro lobista italiano também líder de uma organização sionista, a Alleanza per Israele. O instituto que premiou há poucos meses Javier Milei fez saber ao Esquerda.net que suspendeu Wahnon Martins mal foi noticiada a detenção e que desconhecia as suas atividades sob suspeita, acrescentando que o seu trabalho para a organização se resumiu a participar enquanto ouvinte num evento público realizado no Parlamento Europeu
Martusciello foi o primeiro signatário da carta favorável à Huawei e a investigação suspeita que terá sido recompensado com 15 mil euros, enquanto cada um dos restantes sete signatários terá recebido 1.500 euros. O diário belga Le Soir diz que os termos divulgados pela investigação se assemelham bastante a uma denúncia anónima recebida em 2022 pela Transparency International. A ONG encaminhou-a ao gabinete europeu anti-fraude (OLAF), que arquivou a queixa passados quatro meses.