Parlamento Europeu

Instituto ultraliberal suspende lobista apanhado na teia da Huawei

17 de março 2025 - 18:12

Nuno Wahnon Martins deve comparecer na quarta-feira num tribunal de Paris para enfrentar a extradição para a Bélgica. O Instituto Milton Friedman retirou-lhe a credencial de acesso ao Parlamento Europeu para representar o think-tank italiano.

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Instituto Milton Friedman suspendeu Nuno Wahnon Martins
Instituto Milton Friedman suspendeu Nuno Wahnon Martins.

Continua detido em França o lobista português preso na quinta-feira no âmbito da operação da justiça belga que investiga um processo de alegada corrupção envolvendo a gigante chinesa dos equipamentos de telecomunicações Huawei e deputados e assistentes do Parlamento Europeu. Fonte próxima do processo afirmou à Agência France Presse que Nuno Wahnon Martins deverá ser ouvido num tribunal de Paris esta quarta-feira para dar seguimento ao pedido de extradição para a Bélgica.

No Parlamento Europeu, Wahnon Martins foi registado como lobista ao serviço do Instituto Milton Friedman, um think-tank ultraliberal sediado em Itália e também presidido por um lobista chamado Alessandro Bertoldi. A juntar Bertoldi e Wahnon Martins está também a atividade em prol do governo de Israel, com o primeiro a presidir ao grupo sionista Alleanza per Israele e o português a ocupar o cargo de secretário-geral da Associação Lusa Portugueses por Israel.

Num comunicado enviado ao Esquerda.net, o Instituto Milton Friedman dá conta da sua “total estranheza em relação ao caso judicial que envolveu o senhor Nuno Wahnon Martins, que, enquanto aguarda a possibilidade de esclarecer a sua posição, foi suspenso do Instituto”. Afirma ainda que a sua inscrição do Instituto no Registo de Transparência do Parlamento Europeu foi realizada em dezembro passado e “tem como único objetivo a promoção de nossos valores político-culturais e não a realização de atividades de lobbying de natureza comercial”. Nos poucos meses de atividade, dizem ter-se limitado “à participação, na qualidade de ouvintes, em eventos organizados por terceiros”.

Estes promotores das ideias libertarianas junto dos eurodeputados, que premiaram no ano passado Javier Milei e fizeram membro honorário a sua irmã Karina, nomeada pelo Presidente argentino para Secretária Geral da Presidência, retiraram também a credencial que dava a Wahnon Martins acesso às instalações do Parlamento Europeu como lobista registado. 

Segundo o histórico do site de transparência Lobby Facts, antes da ligação a este instituto desde novembro de 2024 e que agora termina, Wahnon Martins tinha sido lobista registado junto do Parlamento Europeu pela organização sionista B’nai B’rith entre janeiro de 2012 e março de 2015 e mais recentemente pela consultora brasileira Nostrum Partners entre setembro de 2023 e setembro de 2024. Mas nos corredores do Parlamento Europeu foi sempre conhecido sobretudo pelo trabalho de lóbi a favor de Israel como representante do Congresso Europeu Judaico, onde foi diretor de Assuntos Europeus. Ao longo desses anos, mesmo sem estar registado como assistente parlamentar, foi presença assídua no gabinete do eurodeputado do Forza Italia Fulvio Martusciello, que então presidia ao comité das relações com Israel e agora viu o escritório dos seus assistentes selado pela polícia belga na quinta-feira por causa da investigação sobre os subornos da Huawei.

A última reunião de Wahnon Martins com eurodeputados registada pelo Parlamento Europeu, poucos dias antes de ser detido, foi com o romeno Claudiu Târziu, do partido de extrema-direita AUR e que pertence ao grupo europeu de Giorgia Meloni. Nesse encontro, o lobista português surgiu acompanhado de Murat Efe, o líder do Fórum Económico Turco-Árabe, Gulhan Ozan, diretor do banco turco BankPozitiv e do representante permanente da Turquia junto da UE, Faruk Kaymakci. Um encontro ao qual o Instituto Milton Friedman diz desconhecer e ser alheio, adiantando que a única atividade de Wahnon Martins no âmbito da colaboração terá sido a participação como ouvinte num evento público.

“A ideia ao inscrevê-lo no registo [de lobistas da UE] era organizar eventos culturais sobre os nossos temas, mas, como é evidente, até agora não houve tempo para isso”, refere o Instituo ao Esquerda.net.

A operação policial de quinta-feira envolveu buscas no Parlamento Europeu, na sede da Huawei em Bruxelas e também noutros locais, alguns deles em Portugal ligados a Wahnon Martins. Além do escritório dos assistentes do eurodeputado italiano Fulvio Martusciello, foi também selado o gabinete de Adam Mouchtar, outro nome conhecido dos corredores de Bruxelas por já ter servido mais de uma dezena de eurodeputados e que atualmente está ao serviço de Nikola Minchev, deputado búlgaro do grupo liberal Renew. Mouchtar já tinha sido notícia após o Qatargate por ser um dos fundadores do grupo EU40, uma rede de contactos de jovens eurocratas presidida por Eva Kaili, a deputada socialista grega no centro do escândalo. O jovem assistente confirmou ao Politico que o seu gabinete foi selado pela polícia, mas nega qualquer atuação à margem da lei, o que não impediu o deputado búlgaro de o suspender de funções.