Nos Países Baixos, os liberais do VVD, Partido Popular pela Liberdade e a Democracia, aliaram-se à extrema-direita de Geert Wilders numa coligação governamental. A decisão foi tema de debate durante a campanha para as eleições europeias e os liberais foram tratando de fazer saber que uma votação para expulsar este partido ocorreria posteriormente ao escrutínio, a 10 de junho.
Esta quinta-feira, o Euronews avançou que a expulsão da Aliança dos Democratas e Liberais pela Europa (ALDE), da qual faz parte a Iniciativa Liberal portuguesa, não ocorrerá, citando “duas fontes familiarizadas com as discussões”. E diz-se que afinal nunca houve nenhuma moção oficial de expulsão apresentada.
Uma das razões será a vontade de se manter como o terceiro maior grupo no Parlamento Europeu depois da perda de 21 deputados nas eleições.
Assim, a votação poderá ser adiada “sem fixar uma data” e refere-se a probabilidade de haver apenas “uma missão de observação” encarregue de “verificar se o partido está a ultrapassar alguma linha vermelha em termos de valores e princípios liberais”.
Num debate comigo, @jcf_liberal garantiu que os liberais holandeses (que se colocaram com a extrema-direita no governo) estavam afastados do grupo Liberal europeu. Afinal, nunca aconteceu. Liberais até dizer chega. https://t.co/NXN1pmzjxJ
— Catarina Martins (@catarina_mart) June 21, 2024
Uma decisão final sobre o tema será tomada no conselho da ALDE que reúne neste fim de semana em Vilnius e poderá adensar a crise que os liberais europeus vivem. Esta aliança integra o grupo parlamentar europeu Renew e os macronistas franceses, a braços com a concorrência de Le Pen, são adeptos de manter o “cordão sanitário” europeu face à extrema-direita. Aliás, Valérie Hayer, a francesa que preside a este grupo, tinha assinado em nome dele uma declaração, junto com socialistas, verdes e esquerda, em que se comprometia a “nunca cooperar nem formar uma coligação com os partidos de extrema-direita e radicais a qualquer nível”.
Países Baixos: a extrema-direita chega ao Governo
Europeias 2024
Países Baixos em campanha na ressaca da aliança dos liberais com extrema-direita
Nas eleições legislativas de novembro, o partido mais votado, com 23,5%, foi o PVV de Wilders, de extrema-direita e pertencente ao grupo europeu Identidade e Democracia. O grande derrotado foi o VVD do primeiro-ministro Mark Rutte, que cedo conseguiu outro emprego, passando agora a ser secretário-geral da Nato. Depois de meses de discussões, o seu partido aceitou voltar a fazer parte do executivo desta vez a quatro com o PVV, o Novo Contrato Social e o populista Movimento dos Agricultores-Cidadãos (BBB).
À extrema-direita caberão pelo menos cinco ministérios. Dois serão liderados por Marjolein Faber e Reinette Klever que, de acordo com a Dutch News, asseguram que se irão “comportar diferentemente” no governo do que nos muitos comentários ofensivos que fizeram ao longo da sua vida política.
Faber, por exemplo, será a ministra responsável pelo asilo e pelos refugiados. É conhecida por ter utilizado a teoria racista da “substituição populacional” na sua retórica política, por ter defendido a "abolição do Islão", por ter contestado a ligação entre as emissões poluentes e as alterações climáticas, por ter falsificado a origem étnica de um autor de um ataque à faca em Groningen que apresentou como sendo "do Norte de África" apesar de ser branco e holandês e de ter recusado retratar-se da manipulação feita. Agora diz que se vai portar “como um ministro o deve fazer”.
É a segunda escolha do partido de Wilders para esta pasta. A primeira tinha sido o deputado israelita-neerlandês Gidi Markuzower mas segundo o que o líder da extrema-direita escreveu no X este acabou por ser afastado depois de uma análise aos seus antecedentes feita pelos serviços secretos.
Reinette Klever, que também jura se irá manter dentro dos limites do aceitável na coligação, assume a pasta dos Negócios Estrangeiros. Ela que defendeu o fim completo de qualquer fundo dedicado a ajuda humanitária e que é co-fundadora de um órgão de comunicação social de extrema-direita, o Ongehoord Nederland, conhecido por divulgar teorias da conspiração e que foi multado várias vezes por espalhar notícias falsas.
A extrema-direita aponta também Fleur Agema à pasta de Saúde e quer que seja vice-primeira-ministra o que é contestado pelos seus parceiros por “incompetência” para as funções. O quadro fica completo com o ex-lobista Dirk Beljaarts nos Assuntos Económicos e com Barry Madlener nas Infraestruturas.
Liberais em crise ultrapassados pela extrema-direita
O prazo para formação dos grupos parlamentares ao nível europeu termina no próximo dia 4 de julho mas muito dificilmente o objetivo dos liberais se manterem como terceira força pode vir a ser alcançado.
Um dos mais recentes golpes para o Renew foi a saída partido checo ANO, do ex-primeiro-ministro bilionário Andrej Babiš. Para além dos que tinha perdido nas urnas, perde assim mais sete eurodeputados ficando provavelmente com 74, segundo a Euronews. Adianta-se que os motivos são a “luta contra a migração ilegal” e “revogação da proibição dos motores de combustão interna, mudando fundamentalmente o Pacto Verde”, justifica aquele líder partidário. Do lado do grupo liberal, Hayer diz que aquele partido tem “falta de vontade de continuar a empenhar-se nos valores liberais”.
O Renew assegurou a adesão de um deputado belga do partido Les Engagés mas não conseguiu o apoio do Volt Europa, um partido federalista que tem cinco eurodeputados e que preferiu juntar-se aos Verdes.
Por outro lado, a extrema-direita dos Conservadores e Reformistas da Europa está em crescimento. Juntou cinco eurodeputados do nacionalista AUR, Aliança para a União dos Romenos. E também Marion Maréchal, a sobrinha de Marine Le Pen que saiu do partido de Zemmour e decidiu apoiar a União Nacional, se juntará aos CRE, levando consigo Guillaume Peltier et Laurence Trochu. Para além destes, conseguiram ainda juntar mais um deputado dinamarquês, um búlgaro e um lituano.