“Nada sobre nós sem nós” (Nothing about us without us) é o lema do Manifesto para uma Transição Justa lançado em 2022 pelo Sindicato Europeu industriAll, que representa 7 milhões de trabalhadores da indústria transformadora, mineira e energética de 39 países europeus.
Judith Kirton-Darling, secretária-geral desta estrutura sindical, participou do encontro “Now the People” realizado em fevereiro, em Copenhaga, do qual resultou o lançamento de uma plataforma política comum, composta por dez partidos progressistas da esquerda verde europeia, entre os quais o Bloco de Esquerda, que quer colocar as necessidades dos cidadãos à frente dos interesses dos lóbis e das multinacionais, e que encarna a alternativa à convergência entre a direita e a extrema-direita.
No âmbito desse encontro, Judith Kirton-Darling integrou o painel de um seminário sobre transição justa e verde e empregos de qualidade, que juntou representantes sindicais e ativistas climáticos, bem como Catarina Martins, do Bloco, Li Anderson, do Vasemmistoliitto (Vas), da Finlândia, Pernando Barrena, do partido Euskal Herria Bildu (EH Bildu), do País Basco, e Maciej Konieczny, do Razem, da Polónia.
A dirigente sindical deixou o apelo coletivo dos trabalhadores do industriAll Europe por “uma Europa que, efetivamente, coloque as preocupações dos trabalhadores no centro da tomada de decisões política”, e em que a voz dos trabalhadores seja “ouvida na formulação de políticas a todos os níveis”.
Judith Kirton-Darling explicou que, no manifesto do sindicato europeu, os trabalhadores industriais exortam os decisores políticos de toda a Europa a garantirem uma transição para uma economia verde que seja justa para todos os trabalhadores e que não destrua, mas preserve e crie empregos de qualidade. E que essa transição deve ser pensada, gerida e negociada com os trabalhadores em todos os aspetos que lhes dizem respeito.
Judith Kirton-Darling, secretária-geral do industriAll Europe no encontro "Now the People". Foto Esquerda.net.
De acordo com a representante do industriAll Europe, 25 milhões de trabalhadores industriais na Europa enfrentam potenciais reestruturações e perdas de emprego devido à transformação verde das indústrias. Judith Kirton-Darling alertou que, neste contexto, falta garantir que será uma transição justa “para todos os trabalhadores em todas as regiões, em todos os locais de trabalho, em todos os contratos de trabalho, em todos os setores”.
A dirigente sindical salientou também que “os trabalhadores e as estruturas que os representam reconhecem a ciência climática, sabem o caminho que é preciso percorrer e a velocidade com que temos que agir” e que esta é, inclusive, também uma “questão existencial”. Assim como os trabalhadores sabem “que, na Europa, temos que levar a sério as nossas responsabilidades históricas e também as nossas responsabilidades ao nível das cadeias globais de produção”, acrescentou.
Enfatizando que as “transições verdes não são, pela sua natureza, más transições”, Judith Kirton-Darling afirmou que, no entanto, “o movimento sindical tem tido muita experiência” no que respeita a “más transições”.
A esse respeito, deu o exemplo de “empresas da indústria siderúrgica que estão a fechar locais de trabalho e a transformar-se em tecnologia verde, mas qualquer preocupação pela transição social”. Ou de multinacionais que, nos últimos anos, “têm obtido lucros extraordinários à custa de pessoas comuns em toda a Europa no contexto da crise dos preços da energia”, e que “transferiram essa riqueza diretamente para ações, opções de recompra, dividendos, uma transferência de riqueza do trabalho para o capital como nunca vimos antes”.
Perigo da extrema-direita para os trabalhadores
“Sabemos o quão má pode ser esta transição. E também sabemos que a extrema direita está aí, com respostas muito simples para problemas muito complexos. Eles cantam uma canção sobre os direitos dos trabalhadores e sobre melhores dias no futuro. A extrema direita apresenta-se como ‘amiga dos trabalhadores’, mas, quando assume o poder, implementa a mais severa legislação neoliberal que esmaga os sindicatos e os direitos laborais”, enfatizou a representante do industriAll Europe.
Judith Kirton-Darling destacou que, na Finlândia, nomeadamente, a extrema-direita está a ameaçar o modelo nórdico de relações industriais, conhecido pelo poder da paz social e pela força da negociação coletiva.
E é por isso que, sabendo o que a agenda da extrema direita “realmente significa”, a dirigente sindical alertou que “isso é extremamente perigoso”.
Judith Kirton-Darling apelou a que os políticos se unam ao movimento sindical e que dessa união saia uma proposta para “uma Europa alternativa que tem a transição justa no seu centro”.
“Impor austeridade é autossabotagem”
A secretária-geral do industriAll Europe realçou que temos uma escolha se quisermos evitar voltar a “cometer todos os erros do passado”. Judith Kirton-Darling referiu que, ao ouvir agora falar de austeridade, tem “uma péssima sensação de dejà vú”, recordando-se de que os seus efeitos já foram “tão prejudiciais” para a Europa.
“E, nas vésperas das eleições europeias, o facto de os governos europeus e os membros do Parlamento Europeu quererem inscrever-nos numa austeridade ainda mais profunda do que a que tínhamos na época da crise financeira e económica é autossabotagem, porque não faz sentido, e terá um elevado custo social, económico e político durante décadas”, vincou.
De acordo com Judith Kirton-Darling, “temos de levantar as nossas vozes coletivamente para dizer: “Não. Nem agora, nem nunca”.
Manifestação em frente à reunião do Conselho de Ministros das Finanças da União Europeia para dizer NÃO à austeridade. Foto publicada na página de Facebook de Judith Kirton-Darling, secretária-geral do industriAll Europe.
A dirigente sindical assinalou ainda que a escala da revolução no setor industrial significa que teremos que requalificar milhões de trabalhadores. “Somente no setor automóvel, 2,4 milhões de trabalhadores precisam de se qualificar ou reciclar até 2030. Esse é um desafio colossal para nós hoje. E não podemos fazê-lo com políticas fragmentadas. Precisamos de um plano social, um plano industrial e isso exige um plano de investimento a nível europeu”, apontou.
Eleições europeias moldarão futuro das indústrias e empregos
O industriAll Europe apela aos trabalhadores industriais de toda a Europa para que votem nas eleições para o Parlamento Europeu “em candidatos que defendam bons empregos industriais”.
“Estamos chocados com o facto de a Europa parecer estar a regressar à austeridade numa altura em que a justiça, os salários dignos e o investimento são desesperadamente necessários. O atual clima político e económico é um terreno fértil para forças que semeiam divisão e conflito social e atacam os direitos dos trabalhadores. Isto pode ser visto onde a extrema direita está no poder”, refere a estrutura sindical.
A organização sindical que representa 7 milhões de trabalhadores industriais em toda a Europa, sai em campanha “por um Parlamento Europeu que defenda os direitos dos trabalhadores e bons empregos industriais numa Europa democrática”.
O industriAll Europe acredita que “muito pode ser alcançado com o apoio de aliados no Parlamento Europeu que defendem os interesses e valores sindicais”.