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Homenagem a escritora palestiniana cancelada na Feira de Frankfurt, carta aberta contesta

Esta sexta-feira, Adania Shibli deveria receber um prémio pelo seu romance “Detalhe menor”. A organização cancelou e mais de 600 escritores e editores falam em silenciamento das vozes palestinianas. Editora inglesa decidiu oferecer a versão e-book do romance.
Adania Shibli.
Adania Shibli.

Mais de 600 escritores, como os prémios Nobel da Literatura Annie Ernaux, Abdulrazak Gurnah e Olga Tokarczuk, a filósofa Judith Butler e editores de vários pontos do globo assinaram esta segunda-feira uma carta aberta contra o cancelamento da cerimónia de atribuição de um prémio ao romance “Detalhe menor” da escritora palestiniana Adania Shibli. A homenagem relativamente ao LiBeraturpreis 2023 estava marcada para esta sexta-feira, durante a Feira do Livro de Frankfurt, apresentada como o maior acontecimento mundial do setor livreiro, mas a Litprom, a associação alemã que atribuiria o galardão, desmarcou o evento alegando que “ninguém está no espírito de celebração neste momento”.

A organização justificou que esta decisão foi tomada em conjunto com a autora, o que é negado pela agência dela que contrapôs que a escritora queria na ocasião “refletir sobre o papel da literatura nestes tempos cruéis e dolorosos”. Por sua vez, o diretor do certame, Juergen Boos, emitiu um comunicado sobre os ataques do Hamas no qual informou que a Feira do Livro de Frankfurt decidiu “dar mais espaço” às vozes israelitas.

Na carta aberta fala-se em “silenciamento” das vozes palestinianas e defende-se que esta feira literária tem “a responsabilidade de criar espaços para escritores palestinos compartilharem seus pensamentos, sentimentos e reflexões sobre literatura nestes tempos terríveis e cruéis e não de silenciá-los”. Num momento de “séria crise humanitária, é crucial dar voz aos oprimidos através de todos os meios de expressão, incluindo livros e literatura”, dizem os subscritores, sublinhando que “ironicamente, a Feira do Livro de Frankfurt - o maior evento anual de livros do mundo – fez exatamente o oposto”.

A associação de escritores PEN Berlim corrobora esta posição, com a sua porta-voz, Eva Menasse, a afirmar que “nenhum livro se torna diferente, melhor, pior ou mais perigoso porque a situação das notícias muda” e que “ou um livro é digno de um prémio, ou não é. A decisão do júri em relação a Shibli, que foi tomada há semanas atrás, foi, em minha opinião, muito boa. Retirar-lhe o prémio dela seria fundamentalmente errado, tanto do ponto de vista político quanto literário”.

Paralelamente, algumas editoras anunciaram que, por este motivo, não estarão presentes na Feira. Entre elas conta-se a Arab Publishers Association, a Emirates Publishers Association, a Sharjah Book Authority e a PublisHer.

Já a editora do livro em inglês, a Fitzcarraldo, anunciou que durante o certame o livro estaria disponível para ser descarregado sem qualquer custo.

A escritora Adania Shibli nasceu em 1974 e tem dividido a sua vida entre a Inglaterra, Suíça, Alemanha e Jerusalém Oriental. Depois de ter sido professora convidada da Cátedra de Literatura Mundial na Universidade de Berna, vive agora numa residência artística na Literaturhaus Zurich. É doutorada em Estudos dos Meios de Comunicação Social e Cultura pela Universidade de East London e depois disso fez um pós-douramento no Instituto de Estudos Avançados de Berlim. Lecionou ainda na Universidade de Nottingham e Birzeit, na Palestina.

Este livro foi considerado pelo júri do LiBeraturpreis 2023 como “uma obra de arte composta formal e linguisticamente com rigor que fala do poder das fronteiras e do que os conflitos violentos fazem às pessoas”. Está dividido em duas partes. Numa primeira, em 1949, relata-se um episódio real e amplamente documentado em que soldados israelitas atacaram beduínos no deserto de Neguev, tendo apenas uma jovem sobrevivido depois de ter sido violada. Na segunda parte, conta-se a história fictícia de uma jornalista palestiniana que décadas mais tarde vai investigar o sucedido.

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