Está aqui

Gigantes do agronegócio tentaram enfraquecer propostas da UE contra desflorestação

Oito dias antes estavam na Cimeira do Ambiente da ONU e juravam estar comprometidos com a proteção do ambiente. Mas sabe-se agora que pouco depois tentavam pressionar a Comissão Europeia a alterar a sua proposta.
Desmatamento causado por uma exploração de palma no Brasil. Foto de  USAID Biodiversity & Forestry/Flickr.
Desmatamento causado por uma exploração de palma no Brasil. Foto de USAID Biodiversity & Forestry/Flickr.

Enquanto a União Europeia preparava legislação para banir as importações de produtos alimentares que causam desflorestação, cinco das maiores empresas do agronegócio esforçavam-se por enfraquecê-la. Em contraste gritante com o que assumiam em público oito dias antes na Cimeira do Ambiente da ONU.

Segundo documentos obtidos pelo Guardian, as empresas pressionaram para alterar a regulamentação comunitária apresentada no passado dia 17 de novembro. Reconhecendo o papel dos mercados europeus na desflorestação e que, entre 1990 e 2020, o mundo tinha perdido uma área de floresta superior ao espaço da UE, a Comissão Europeia propunha-se aplicar regras que garantissem que os produtos consumidos no seu espaço não estavam a contribuir para a desflorestação.

A 10 de novembro, três associações de comércio, a Coceral, Fediol e Fefac, que representam as empresas ADM, Bunge, Cargill, LDC e Viterra, avisavam por escrito o responsável pelo plano climático europeu, Frans Timmermans, que se a regulamentação avançasse os preços iriam subir e a comida faltar. Nas suas palavras encarar-se-iam “aumentos importantes de preços e problemas de disponibilidade” para além de uma “redução da oferta de alimentação a preços comportáveis, aumentos de preços para agricultores e indústrias da UE e aumento de risco de falta de abastecimento de material com elevado teor de proteínas”. Alegavam igualmente que a separação e identificação de produtos ligados à desflorestação como o café, a soja e a carne de vaca não seria concretizável.

Em alternativa, propunham “um sistema de balanço de massa para monitorizar e certificar “volumes sustentáveis” de mercadorias ao longo das cadeias de abastecimento”. Ouvido pelo jornal britânico, Sini Eräjää, da Greenpeace, descodifica do que se trata. Para ela, a legislação sobre desflorestação passaria a ser insignificante com estas alterações: “um sistema de balanço de massas permite misturar bens que atingem os critérios de sustentabilidade com os que não os atingem”, o que daria a possibilidade de introduzir “vastas quantidades de bens insustentáveis e ilegais” no mercado europeu.

Estas associações voltaram à carga com uma segunda carta enviada a 3 de fevereiro, desta feita a Barbara Pompili, ministra francesa para a transição ecológica. Nela alegavam que quem pagaria com a nova legislação seriam os pequenos agricultores porque a utilização de dados de geolocalização para detetar as origens do produto seria um problema para eles.

A 1 de março, os grupos que representam mais de 34 mil pequenos produtores de cacau da Costa do Marfim escreviam aos ministros e deputados do Parlamento Europeu defendendo precisamente o contrário. Para eles, a tecnologia que permite a deteção da origem seria uma “oportunidade única” para lidar com problemas de justiça social como o respeito pelos preços oficiais do produto, ou o não pagamento dos prémios de sustentabilidade prometidos e intermediários. “Os agentes industriais que estão a tentar impedir o sistema de rastreamento, que envolve a geolocalização de cada parcelas e a identificação de cada produtor, estão na realidade a fazer campanha para que nada mude”, acusam estes produtores.

Termos relacionados Ambiente
(...)