Especialista em desigualdades sociais e étnico-raciais, o sociólogo Ugo Palheta, co-diretor da revista marxista Contretemps, é um dos que desde há muito considera seriamente a "possibilidade do fascismo". Autor de vários livros sobre este assunto, é também responsável, desde 2022, pelo podcast "Minuit dans le siècle" (Meia-noite no Século), onde examina o funcionamento do "neofascismo" contemporâneo. Nesta entrevista pretende-se compreender com maior profundidade a tentação autoritária e racista que atravessa a França e discutir formas de impedir a catástrofe que representaria a chegada ao poder da União Nacional (Rassemblement National/RN).
Há anos que observas as dinâmicas do "neofascismo" e, em vários livros publicados desde 2018, alertas para a "trajetória de catástrofe" em que a sociedade francesa parece ter embarcado. Como analisas este momento de particular aceleração que se vive, desde a dissolução da Assembleia Nacional pelo Presidente Macron?
A crise política que a França atravessa há já 15 anos entrou numa fase aguda, o que constitui uma prova de fogo. O problema é que a extrema-direita se apresenta em vantagem, dado o seu sucesso nas eleições europeias. Mas poderemos ter uma dinâmica eleitoral em torno da Nova Frente Popular, se esta não se tratar de um mero arranjo entre partidos, e se contar com a participação dos movimentos sociais, dos sindicatos, das organizações de bairro, dos coletivos feministas e ambientalistas, etc., numa palavra, se contar com todos e todas aquelas que estiveram no centro das vigorosas lutas populares dos últimos 10 anos.
Desde 2017, a França tem sido caracterizada por uma tripartição do campo político, com polos de força aproximadamente igual (pelo menos em 2022): um polo neoliberal (liderado por Macron), um polo de esquerda (dominado pela France Insoumise há alguns anos) e um polo de extrema-direita (onde a RN é de longe a força dominante). Esta situação não poderia durar para sempre, não só porque Macron já não dispõe de uma maioria absoluta na Assembleia Nacional desde 2022, mas também porque o polo neoliberal acaba de sofrer um revés eleitoral nas eleições europeias.
Desde a sua chegada ao poder que Macron dispunha de uma base social estreita devido aos seus planos de regressão social. No entanto, esta base estreitou-se ainda mais desde a sua eleição em 2017, tendo sido apenas compensada pela reunião de sectores do eleitorado de direita que anteriormente votavam Les Républicains. A ponto de os economistas Julia Cagé e Thomas Piketty afirmarem em 2022 que o voto em Macron era "o mais burguês da história de França" (com base num estudo empírico das eleições em França desde a Revolução Francesa). Se a isto acrescentarmos a desconfiança muito profunda no país em relação às elites políticas, em particular aos macronistas, e as grandes lutas sociais que, desde 2016, desestabilizaram ainda mais o poder (os coletes amarelos, os movimentos contra a reforma das pensões, a mobilização pela saúde pública, etc.), torna-se evidente que o macronismo já não é de todo capaz de arrastar forças e que a situação se tornou amplamente ingovernável.
Quais são, na tua opinião, as principais razões que explicam o aumento constante do poder da extrema-direita, que se verifica nas urnas, ao longo dos últimos 15 anos?
Em primeiro lugar, convém recordar que o avanço da extrema-direita a nível nacional remonta às eleições europeias de 1984. A Frente Nacional/União Nacional (FN/RN) tem, portanto, uma base antiga que não foi corroída por experiências de poder a nível nacional, uma vez que este partido sempre se recusou a governar numa posição subordinada no âmbito de uma coligação de direita. Pode, portanto, jogar a cartada de “afastamento do poder" ou do "anti-sistema", ligada ao simples facto de não ter governado durante as últimas décadas, mesmo que o seu programa económico esteja hoje em plena continuidade com os partidos que se sucederam no poder durante os últimos 40 anos: uma política liberal e a favor das empresas que nada traz de bom, antes pelo contrário, a assalariados e assalariadas.
O que me parece estar no centro dos êxitos da extrema-direita é o facto de esta ter conseguido politizar os medos que atravessam a nossa sociedade (nomeadamente o medo da despromoção social, para si ou para os filhos, o medo do desemprego, da precariedade, da insegurança, etc.) sob o ângulo da ameaça da imigração, dos estrangeiros, dos muçulmanos, etc. A extrema-direita consegue transformar esses medos numa esperança em que se poderia viver melhor se se acabasse com a imigração, se se "controlassem" as minorias, etc. E isto resultou porque, ao mesmo tempo, as próprias forças políticas dominantes têm difundido uma retórica xenófoba, islamófoba e securitária.
Outra razão importante é que as coligações de esquerda que chegaram ao poder com o PS (nos anos 1980, entre 1997 e 2002 e, depois, entre 2012 e 2017) provocaram uma grande desilusão e desorientação entre as classes trabalhadoras e, mais genericamente, entre assalariados, ao seguirem políticas económicas muito semelhantes às da direita. Se a abordagem "nem direita nem esquerda" (defendida por Le Pen, pai e filha, desde os anos 1990) funcionou tão bem, é devido ao facto de a esquerda, particularmente sob Hollande, ter governado à direita.
Além disso, a propaganda política e mediática impôs a uma grande parte da população a ideia segundo a qual não é possível uma repartição mais igualitária da riqueza entre trabalhadores e patrões, entre ricos e pobres, que não é possível mudar a sociedade, que não há alternativa. Tudo isto alimentou a ideia de que a única coisa possível é uma política de tirar aos estrangeiros para dar aos franceses (ou aos "verdadeiros franceses", numa visão racista), e de atacar as minorias para favorecer a maioria.
A ascensão de uma forma de fatalismo de classe a partir dos anos 80 (um ceticismo quanto à possibilidade de impor um equilíbrio de forças aos detentores, ao capital) foi, em certa medida, compensada pela emergência de um voluntarismo racista. Toda a política de "preferência nacional", que se tornou "prioridade nacional" na retórica atual da FN/RN, funciona no imaginário da extrema-direita e de uma grande parte do seu eleitorado como uma prioridade racial.
Quais são os diferentes grupos sociais que constituem atualmente o eleitorado da RN? O que nos dizem os estudos recentes das ciências sociais sobre as motivações do voto de extrema-direita?
Contrariamente ao que se pensa, o eleitorado de extrema-direita não é homogéneo: está longe de ser constituído apenas por pessoas da classe trabalhadora, como por vezes se afirma, e parece ser mais um conglomerado. Vimos nas últimas eleições presidenciais que Zemmour obteve excelentes resultados em comunas ou bairros ricos. No entanto, a FN/RN também conseguiu, em vários momentos da sua história, atrair eleitores das classes privilegiadas, e fá-lo cada vez mais atualmente, à medida que o macronismo se desmorona e a extrema-direita aparece, para os mais ricos e os patrões, como uma alternativa à esquerda unificada.
Dito isto, a FN/RN dispõe de forças e de fatores que predispõem ao voto na extrema-direita. De um ponto de vista de classe, a extrema-direita é particularmente forte entre as pessoas que conseguiram estabilizar-se economicamente apesar de baixos níveis de instrução, nomeadamente entre pequenos trabalhadores independentes (comerciantes, artesãos, proprietários de pequenas empresas), mas também entre as franjas superiores das classes trabalhadoras (recrutadas de forma privilegiada entre trabalhadores brancos), por exemplo, operários com contratos estáveis e detentores de casa própria. Esta ancoragem social acentua-se nas pessoas vivem em cidades pequenas ou naquilo a que o sociólogo Benoît Coquard chamou o "mundo rural em declínio" (o que não significa todo o mundo rural), particularmente em regiões historicamente hostis à esquerda.
Duas ideias comuns que fazem da FN/RN o partido dos pobres e dos jovens também precisam de ser postas em causa. Durante a primeira volta das eleições presidenciais de 2022, Jean-Luc Mélenchon estava em pé de igualdade com Marine Le Pen no voto entre pessoas que ganhavam menos de 1.250 euros líquidos por mês e à frente dela entre os que ganhavam entre 1.250 e 2.000 euros, enquanto a RN estava à frente dele entre os que ganhavam entre 2.000 e 3.000 euros. E, embora a extrema-direita tenha progredido entre os jovens em comparação com a década de 1990, Marine Le Pen foi claramente derrotada em 2022 por Jean-Luc Mélenchon, tanto entre os jovens de 25-34 anos como entre os de 18-25 anos.
No que diz respeito às motivações do eleitorado de extrema-direita, é importante sublinhar que o desejo de maior poder de compra por um lado, e o desejo de travar a imigração e de atacar os "imigrantes", os "estrangeiros" e as "minorias" (todas estas categorias são utilizadas de forma deliberadamente vaga pela extrema-direita) por outro, funcionam de forma articulada. É toda uma perceção racializada e racista do mundo – ela própria enraizada num mundo racializado (de segregação racial do espaço, da escola, do mundo do trabalho, etc.) e racista (discriminação sistémica) – que desempenha o papel de cimento ideológico para o eleitorado de extrema-direita.
A FN/RN conseguiu estabelecer uma ligação estreita entre o "social" (melhorar as condições materiais de vida) e o "racial" (defender os "nacionais", mas com uma conceção implicitamente racista, uma vez que a extrema-direita opõe os "franceses nativos" ou “verdadeiros franceses" por um lado, e os "franceses de papel" por outro, aqueles franceses que a extrema-direita considera não serem suficientemente franceses culturalmente, ou que não amam suficientemente o seu país).
Na tua opinião, qual é o impacto das recentes mudanças no campo da comunicação social, sob a influência de acionistas poderosos, como Vincent Bolloré, e defensores de ideias reacionárias?
Os principais meios de comunicação social desempenharam um papel importante em todo o processo político que conduziu à ascensão da extrema-direita, em todas as fases.
Em termos gerais, houve um período inicial (dos anos 80 aos anos 2000) em que a extrema-direita teve pouca visibilidade nos meios de comunicação social (apenas Jean-Marie Le Pen era convidado a aparecer, e mesmo assim era bastante raro), mas em que as obsessões da FN – em particular a insegurança e a imigração – se tornaram cada vez mais proeminentes na imprensa, nos telejornais, nos debates, etc. A este ambiente cada vez mais ansiogénico juntou-se a criação de um sentimento generalizado de impotência em relação às questões económicas e sociais, com a ideia de que não há alternativa à austeridade neoliberal (privatizações, retrocessos no direito do trabalho, pensões, etc.).
Num segundo período, que se inicia nos anos 2010, a extrema-direita começa a colonizar o espaço mediático. Desde logo, assistimos à presença de um número muito maior de líderes políticos da FN convidados em todos os espaços (incluindo as rádios públicas) mas é sobretudo o aparecimento do império Bolloré que vai mudar a situação decuplicando a audiência de pseudojornalistas (mas verdadeiros ideólogos racistas e reacionários) da Valeurs Acteurs, Causer, Boulevard Voltaire, etc., e desinibindo certos vetustos veteranos da imprensa de direita (Zemmour, Théard, etc).
Este cocktail revela-se explosivo uma vez que à “fachoesfera”, já poderosa ao nível da internet e das redes sociais há mais de quinze anos, se junta então um certo número de órgãos de comunicação social tradicionais (CNews, Europe 1, JDD, etc.) e que difundem em contínuo o senso comum da extrema-direita.
Porque é que a esquerda, apesar da sua proposta social, se confronta com a indiferença, e até hostilidade, por parte de alguns setores populares da RN?
Primeiro é preciso referir que houve sempre uma parte das classes populares que votou na direita (com variações ao nível do território importantes): uma parte do eleitorado popular da FN/RN provém de um eleitorado que sempre foi de direita e que se radicalizou a partir dos anos 80. Mas também ocorreu aquilo a que os politólogos chamam “desalinhamento” entre a esquerda e as classes populares, que se desenvolveu em várias etapas.
Porque não a esquerda consegue falar às classes populares? A primeira razão, no meu entendimento, é o falhanço de todas as experiências da esquerda, dominadas pelo Partido Socialista, no poder (de Miterrand a Hollande, passando pelo Jospin), na medida em que estes governos, no essencial traíram as esperanças que lhes haviam sido atribuídas. Miterrand, que prometia “mudar a vida”, operou a “viragem do rigor”1. Jospin, que pretendia romper com os governos de Balladur e Juppé, privatizou mais que todos os governos de direita juntos. Hollande, que chegou a afirmar “o meu inimigo é a finança”, executou políticas de oferta hiper favoráveis aos ricos e ao capital.
Claro que há outros aspetos, por exemplo, a legitimação de ideais racistas e securitários, principalmente a propaganda mediática e da sua apropriação por dirigentes políticos de primeiro plano, mas foi sobretudo o rescaldo da esquerda no poder, e em particular do Partido Socialista, que devem ser ressalvados. O paradoxo resultou numa parte das classes populares que pensa que a esquerda e as elites as abandonaram a favor de imigrantes e minorias, enquanto imigrantes (e muito frequentemente seus filhos e filhas) e minorias foram os primeiros a ter sofrido (e a sofrer), especialmente enquanto trabalhadores e trabalhadoras, com as políticas de regressão social, desemprego e precariedade.
Escreves que o desastre é possível mas “resistível”. Existem exemplos de territórios, em França ou no estrangeiro, onde observamos um declínio da extrema-direita? Por outras palavras, existem estratégias eficazes contra a extrema-direita?
Existem territórios onde a extrema-direita não conseguiu penetrar eleitoralmente, como a Valónia belga, sem dúvida porque não só aí se manteve um “cordão sanitário” (os representantes da extrema-direita não são convidados nos órgãos de comunicação social), mas também porque o movimento de trabalhadores tradicional (notavelmente, o movimento sindical), com atos de solidariedade concretos, mantém um peso muito relevante. Mas é preciso perceber que não há nenhuma receita miraculosa que faça a extrema-direita regredir ou que, quando ela se instala no jogo político, a faça desaparecer – nem mesmo quando chega ao poder (como já se viu nos anos 1990 na Itália ou na Áustria, no contexto de coligações com a direita). Há, portanto, um trabalho de longo prazo a fazer, pelo menos a três níveis.
Em primeiro lugar, a militância no terreno, particularmente em espaços onde a esquerda e os movimentos sociais (principalmente sindicatos) estão pouco presentes (territórios rurais, pequenas cidades, pequenas e médias empresas), não apenas para refutar as mentiras da extrema-direita, notavelmente na questão da imigração, mas para criar um discursos de igualdade e justiça social, de construção de solidariedades, etc., para defender a ideia de que é possível construir coletivamente um futuro melhor, não por oposição aos imigrantes ou às minorias, mas impondo uma relação de forças contra a classes abastadas.
Depois, a batalha político-cultural que passa pelo trabalho no terreno onde se difundem as ideias e também pela construção de órgãos de comunicação social independentes, de produção e difusão de pensamento crítico (sobre as desigualdades de classe, as discriminações racistas, a violência de Estado, etc.). E, por fim, a questão da alternativa política: não se consegue fazer regredir a extrema-direita sem que um governo de esquerda consiga mostrar no concreto que a melhoria das condições de vida da maioria (aumento dos salários, descida da idade da reforma, diminuição do tempo de trabalho, etc.) não está em contradição com, por exemplo, o acolhimento digno de exilados e exiladas, independentemente de serem ou não reconhecidos como refugiados ou refugiadas.
Tendo em conta o exercício do poder das extremas-direitas contemporâneas (Itália, Hungria, Argentina) o que poderiam ser os primeiros meses de um governo Bardella?
Creio que, se conseguir chegar ao poder, a extrema-direita procurará dar garantias ao seu eleitorado, mas também tranquilizar o poder económico e atacar sectores militantes capazes de contestar o seu domínio.
Dar garantias ao seu eleitorado não passará por medidas sociais (todos os anúncios recentes de Bardella mostram que estão prontos a renunciar a todas as medidas ditas “sociais” do seu programa). O que vai é significar uma intensificação dos ataques racistas que visam, há já vários anos, os grupos constituídos como “inimigo interno” (exilados e exiladas, muçulmanos e muçulmanas, comunidades ciganas, bairros populares e de imigrantes), com consequências imediatas em termos de perseguição e expulsão de imigrantes indocumentados, pondo em causa o direito ao asilo, direitos dos estrangeiros e das minorias (nomeadamente as religiosas) e também nos já escasso recursos de muitas famílias imigrantes, incluindo muitas crianças (pondo em prática a “prioridade nacional” que consiste em reservar os apoios sociais, os empregos e a habitação social aos franceses).
Tranquilizar o poder económico implicará prolongar a política da oferta que tem vindo a ser aplicada por todos os governos anteriores: baixa de impostos para as empresas e, principalmente, para os ricos, aplicação das reformas das pensões e do subsídio de desemprego já iniciadas no período Macron, cortes orçamentais drásticos para compensar as referidas baixas de impostos, etc.
É preciso não esquecer que, em acedendo ao poder, a extrema-direita terá o controlo da instituição policial, cujos membros já adquiriram em larga medida as suas ideias e que esperam, com grande impaciência, a grande “limpeza”. Confrontada com uma sociedade civil vigorosa, que conduziu lutas populares importantes nestes últimos anos, não há qualquer dúvida que a FN/RN utilizará motivos falaciosos e leis já existentes para acabar com as resistências, indo bem mis longe do que já foi Darmanin: dissolução de inúmeros coletivos, criminalização de ideais e movimentos contestatários, detenções visadas, entraves à ação sindical (principalmente restrição do direito à greve), etc.
Acreditas na possibilidade de uma vitória da Nova Frente Popular, com esta campanha relâmpago?
Creio que as únicas batalhas perdidas são aquelas que recusamos fazer e que, como dizia o Ras l’Front2 nos anos 1990, os avanços da extrema-direita fazem-se dos nossos recuos. Temos o direito de ter medo mas é importante não ceder ao pânico, e a melhor maneira para isso é organizarmo-nos e agirmos coletivamente, num momento que vai ser decisivo para o futuro.
Foi crucial que os partidos de esquerda se unissem, num tão curto espaço de tempo, e isso deu cabo de uma parte dos planos de Macron que contava com a desunião à esquerda para construir, mais uma vez, um falso duelo entre ele e a direita. Mas a unidade não é suficiente, ou antes, como dizíamos num editorial da Contretemps, a unidade é um combate.
E que encerra várias implicações: é um combate porque para ser vitoriosa eleitoralmente e para, em seguida, conduzir a conquistas, é necessário que a unidade não se resuma a uma união passageira entre organizações políticas cujos laços com a sociedade são fracos. É, portanto, necessário que amplos setores da população, especialmente as classes populares e os grupos oprimidos, se empenhem na campanha através das suas organizações (sindicatos de trabalhadores e trabalhadoras, coletivos de bairro, organizações antifascistas e feministas, associações de defesa dos direitos humanos, etc.), imponham as suas aspirações e façam esta frente existir bem para além de um simples cartel de organizações. Este foi precisamente um dos melhores aspetos da Frente Popular original de 1936.
E, depois, a unidade é um combate porque precisamente no seio da união das forças de esquerda social e política há divergências, sendo, portanto, necessários debates sobre a orientação política. Para que haja vitória, durante as eleições de depois, é necessário que seja feito um balanço do hollandismo, principalmente, e que jamais se repita tal experiência de traição dos interesses populares.
No concreto, isto implica eleger um máximos de deputados e deputadas da ala esquerda da Nova Frente Popular, em particular representantes da France Insoumise mais também determinadas figuras das lutas sociais deste último período: Rachel Kéké, já eleita em 2022, mas também Amal Bentounsi, militante infatigável com os crimes policiais, Philippe Poutou, trabalhador militante, Adel Amara, militantes dos bairros populares, ou ainda Raphaël Arnault, muito ativo nas mobilizações antifascistas dos últimos anos.
Não venceremos a extrema-direita mobilizando simplesmente os medos (que, de resto, são legítimos, tendo em conta o projeto racista e reacionário do FN/RN). É imperativo que esta frente popular seja uma verdadeira alternativa às políticas de regressão social e ao mundo tal como ele é, à sociedade capitalista, racista, patriarcal, produtivista, que seja vista como uma frente da esperança.
Entrevista de Elsa Gautier publicada originalmente no Socialter. Tradução de Tatiana Moutinho.
Notas:
1 Expressão porque ficou conhecida a alteração radical da política económica, decidida em março de 1983, após o falhanço de um programa económico keynesiano de relançamento da economia francesa (relance Mauroy) e que consistia essencialmente num programa de rigor económico extremo.
2 Ras l’front ou RLF, rede associativa francesa de esquerda, criada nos anos 1990, para combater a Frente Nacional