Espanha

Extrema-direita promove “caça ao imigrante” em Múrcia

15 de julho 2025 - 10:21

Os grupos anti-racistas insistem que atos de violência como o de Torre Pacheco seguem um padrão comum: a instrumentalização de um ato violento, a disseminação do medo e do racismo nas redes sociais e linchamentos sob o pretexto de “justiça social”.

por

Aurora Báez Boza

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Torre Pacheco: saudação nazi
Torre Pacheco: saudação nazi

Pela segunda noite consecutiva, Torre Pacheco foi o epicentro do ódio e do racismo; grupos de extrema-direita juntaram centenas de pessoas nas ruas da cidade com o objetivo de “caçar o imigrante”. Apoiantes de extrema-direita de outros territórios chegaram à cidade, prontos para participar nas auto-proclamadas “patrulhas” organizadas nas redes sociais para “limpar Espanha”. A violência da noite de domingo fez pelo menos três feridos e uma pessoa detida, segundo fontes policiais. Os organizadores, grupos racistas violentos, para além das perseguições que causaram, com ataques físicos e destruição material, também deixaram mensagens de ódio nas ruas e nas redes sociais, onde falam em perseguir a população migrante para “encontrá-los e fazer justiça direta para reuni-los com Alá”. Estas ações estão a colocar grupos antirracistas em alerta em todo o país. “Estamos a falar de caçadas com total impunidade. Perguntamo-nos onde está a proteção”, reflete a ativista antirracista Chaimaa Boukharsa, cofundadora da Afrocolectiva, nas redes sociais.

O SOS Racismo denunciou também os atos de violência e pediu às instituições que “parem a máquina do ódio” e protejam de forma imediata as pessoas migrantes locais. Embora muitos meios de comunicação social e grupos extremistas como a Frente Obrero, Deport Then Now e VOX justifiquem os linchamentos devido a um alegado ataque a um habitante local por parte de jovens migrantes, o coletivo anti-racista insiste: "Não procuram reparação, procuram vingança racial; um ato violento nunca poderá justificar o terror racista que foi desencadeado. Não agem por ética, mas por ódio.” O coletivo local Afromurcia salientou que “esta onda de ódio não é um incidente isolado: é o resultado direto de discursos institucionais e mediáticos que discriminam, criminalizam e desumanizam as pessoas com base na sua origem ou cor de pele”.

A representante do governo regional insistiu que enviou uma força policial especial para lidar com a situação e anunciou que “em breve serão feitas detenções pelos vários incidentes ocorridos ontem e anteontem, quando o morador de Torre Pacheco foi atacado”. O presidente da comunidade autónoma, Fernando López Miras, emitiu uma mensagem tíbia de condenação dos ataques e pediu que a localidade “volte à normalidade”. Disse ainda que “compreende a frustração” e prometeu que “o ataque ao morador de Torre Pacheco não ficará impune”. O grupo Esquerda Unida de Múrcia identificou o presidente regional como um dos impulsionadores do racismo na região: “Mais uma vez, estamos a assistir às consequências do discurso de ódio que, longe de ser anedótico, está a tornar-se uma política institucional com a conivência – quando não o impulso direto – do governo regional de Fernando López Miras, completamente sequestrado pela extrema-direita do Vox.”

As fraudes e a disseminação do ódio

A cobertura mediática, juntamente com imagens descontextualizadas publicadas por grupos extremistas nas redes sociais, estão a desempenhar um papel fundamental na escalada da violência. Várias agências de combate às notícias falsas estão a alertar para as informações falsas que circulam atualmente. O VerificaRTVE forneceu provas de que o vídeo da alegada agressão da passada quarta-feira que está a circular na rede X é falso, assim como as várias fotos que mostram os rostos dos alegados agressores. Grupos antirracistas e pró-direitos humanos manifestaram o seu receio de que a violência se possa alastrar a outros territórios. Na noite de domingo, na cidade de Piera, em Barcelona, um grupo de ultras incendiou uma mesquita que estava prestes a ser inaugurada. A Rede Acoge pediu a responsabilização de vários atores sociais e políticos: “Pedimos responsabilidade a todos: aos meios de comunicação social, aos representantes políticos e aos cidadãos, para que não alimentem o fogo dos preconceitos ou caiam em discursos que só geram divisão.”

Os grupos anti-racistas insistem que atos de violência como o de Torre Pacheco repetiram-se em diversas ocasiões em locais como El Ejido em 2000, no Reino Unido recentemente, ou nos Estados e seguem um padrão comum: a instrumentalização de um ato violento, a disseminação do medo e do racismo nas redes sociais e linchamentos sob o pretexto de “justiça social”.


Aurora Báez Boza é uma jornalista andaluza.

Texto publicado originalmente no El Salto.

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