Está aqui

Estudo revela que escolas públicas preparam melhor para universidade

No acesso ao ensino superior, as cinco melhores escolas são privadas e as cinco piores são públicas. Contudo, a situação inverte-se logo nas notas dos alunos no primeiro ano de faculdade. Há muitas escolas privadas a inflacionar resultados do secundário.
Foto de Paulete Matos.

Maria Conceição Silva (professora na Católica Porto Business School), Ana Camacho e Flávia Barbosa (professoras na Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto) publicaram um estudo na revista Omega em que apresentam um ranking alternativo das escolas secundárias.

Neste trabalho, o desempenho das escolas secundárias é avaliado com base nos resultados dos alunos no final do primeiro ano na universidade, sendo que as medidas de desempenho existentes baseadas em exames nacionais no final do ensino médio são complementadas com o desempenho das escolas na preparação dos alunos para o sucesso da universidade.

Para este efeito, foram utilizados dados da Universidade do Porto e da Universidade Católica do Porto, por um período de três anos, correspondendo a mais de 10.000 estudantes de 65 cursos.

Os resultados a que Maria Conceição Silva, Ana Camacho e Flávia Barbosa chegaram revelam que o ranking das escolas elaborado com base nas notas que os seus estudantes tiveram nos exames não tem qualquer relação com o ranking feito com base nos resultados dos estudantes no primeiro ano da universidade. De uma lista de 64 secundárias com alunos colocados em 65 cursos da Universidade do Porto e da Universidade Católica do Porto, as 15 que preparam estudantes com mais sucesso no ensino superior são públicas. Já entre aquelas em que os alunos apresentam menos sucesso ao fim de um ano, 60% são do ensino particular e cooperativo.

É ainda de assinalar que, entre as escolas que ocupam os primeiros cinco lugares dos rankings que têm em conta os resultados dos exames nacionais, duas constam também entre as cinco piores quando se privilegia os resultados dos seus ex-alunos na universidade: o Externato Ribadouro do Porto e o Colégio D. Diogo de Sousa. Ambos os estabelecimentos de ensino estão referenciados como escolas que sistematicamente inflacionam as notas dos seus alunos.

Inspeção abriu 20 processos por inflação de notas no secundário

No último ano, a Inspeção-Geral da Educação e Ciência (IGEC) abriu 20 processos contra estabelecimentos de ensino, ou contra os seus representantes, devido à atribuição de notas inflacionadas aos alunos do ensino secundário, com vista a facilitar o seu acesso ao ensino superior. A maioria dos casos envolve colégios privados, sendo que o Externato Ribadouro é alvo de três processos disciplinares que podem, inclusive, levar ao seu encerramento. Este estabelecimento de ensino privado já tinha sido notícia face às classificações elevadas atribuídas aos seus alunos na disciplina de Educação Física.

Os dados relativos ao ano letivo de 2017/2018, divulgados no portal Infoescolas no início de 2019, revelam que, apesar das consecutivas advertências da IGEC, o mesmo grupo de onze escolas continua, ano após ano, e durante a última década, a inflacionar as notas dos seus estudantes. São quase todas privadas. Na lista só figuram duas escolas públicas na lista: as secundárias de Monção e de Fafe. A estas somam-se os colégios privados D. Diogo de Sousa e Carvalho Araújo, de Braga; D. Duarte, Ribadouro e Luso-Francês, no Porto; Camões e Paulo VI, ambos em Gondomar; e ainda o Colégio da Trofa e o Colégio de Lamego.

Queda do ensino privado no PISA 2018

Ainda assim, e comparando os desempenhos de 2015 com 2018, os resultados dos alunos do ensino privado no Programa Internacional de Avaliação de Alunos (em inglês: Programme for International Student Assessment - PISA) registaram uma quebra abrupta.

“Em média, os alunos do privado descem de 541 para 493 (-48 pontos), aproximando-se assim do valor registado em 2018 pelo ensino público (492), que por sua vez diminui apenas 2 pontos face a 2015”, regista Nuno Serra, assessor de Pedro Nuno Santos e doutorando na faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, no blogue “Ladrões de Bicicletas”. Esta quebra é comum em todos os domínios avaliados: matemática, leitura e literacia científica.

Nuno Serra sinaliza a dupla “estranheza que esta evolução suscita”, já que “não só entre 2000 e 2015 o ensino privado sempre assumiu valores bastante acima dos registados no ensino público (ao contrário do que sucede em 2018), como o nível de competências dos seus alunos chegou a estar acima da média do privado na OCDE (entre 2009 e 2015), para se situar agora bem abaixo do valor obtido a essa escala”.

Já o ensino público português não só tem vindo a progredir consistentemente no PISA desde 2000, como suplanta a média da OCDE desde 2015.

A intensificação das lógicas de “’preparação intensiva para os exames’, em linha com a sobrevalorização desta modalidade de avaliação durante o consulado de Nuno Crato”, é uma das justificações avançadas por Nuno Serra para justificar este fenómeno.

Termos relacionados Sociedade
(...)