Escolha de Vitalino Canas para Tribunal Constitucional gera onda de críticas

22 de fevereiro 2020 - 16:28

Bloco repudiou a indicação do “provedor maravilha das empresas de trabalho temporário”. Mas as críticas vêm de vários quadrantes, como é o caso de Ana Gomes, Paula Teixeira da Cruz e Manuel Alegre. O histórico socialista afirma que este não é o melhor caminho "para a limitação da promiscuidade entre as instituições e os negócios".

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Vitalino Canas, o "provedor maravilha das ETT" no Congresso Nacional do PS, em 2013. Foto de Estela Silva, Lusa.
Vitalino Canas, o "provedor maravilha das ETT" no Congresso Nacional do PS, em 2013. Foto de Estela Silva, Lusa.

Pedro Filipe Soares, líder parlamentar da bancada bloquista, afirmou que a escolha de Vitalino Canas, “conhecido por acompanhar o setor de atividade que mais precariedade tem no nosso país e de ser o garante dessa precariedade por voz dos seus patrões”, é uma escolha contra os direitos dos trabalhadores e “será a voz da precariedade no Tribunal Constitucional”.

Em 2007, o então deputado e porta-voz do PS foi nomeado pela APESPE, isto é, a associação das empresas de trabalho temporário (ETT), Provedor da Ética Empresarial e do Trabalhador Temporário. Vitalino Canas foi contratado pelos patrões das ETT’s com o objetivo de “melhorar a imagem do setor” e receber queixas dos trabalhadores temporários.

Nesse próprio ano, Vitalino esforçou-se por defender os privilégios de quem o contratou, assumindo-se no Parlamento contra a proposta de limitar os contratos de trabalho temporário a um máximo de dois anos. Durante a discussão da reforma do Código do Trabalho que incluía uma revista Lei do Trabalho Temporário, Vitalino afirmava:

"É com inquietação que constato que, em aparente contraciclo, o novo regime de trabalho temporário é mais restritivo do que aquele que o PS apresentou inicialmente. (...) É o caso da responsabilidade do utilizador por dinheiros devidos ao trabalhador quando a ETT não lhe paga. Que utilizador quer correr esse risco?".

Vitalino denunciava também a limitação dos contratos de trabalho temporário a um máximo de dois anos (e de um ano se a justificação do contrato for acréscimo excecional da atividade), quando no projeto inicial do PS o prazo era de três anos. E concluía:

"Não é de esperar que, perante estes obstáculos, as empresas optem por soluções ‘habilidosas', menos transparentes, de trabalho ilegal sem grandes hipóteses de fiscalização?"

Críticas vêm de vários quadrantes

Mas as críticas à indicação do ex-deputado do PS e ex-porta-voz do Governo Sócrates para o Tribunal Constitucional vêm de vários quadrantes, inclusive do próprio Partido Socialista.

Manuel Alegre, citado pela revista Sábado, considera que “não é uma boa escolha" e que "Vitalino Canas está muito conotado com o mundo dos negócios”.

“Não me parece que seja o caminho mais acertado para a transparência e para a limitação da promiscuidade entre as instituições e os negócios, sobretudo numa instituição como o Tribunal Constitucional", afirmou o histórico socialista, sinalizando a sua preocupação face a “este tipo ligeireza nas nomeações".

Sobre o facto de o PS não ter negociado a substituição dos dois Juízes que saíram do TC com o Bloco e o PCP, Alegre frisou que “não são boas notícias para a dignidade das instituições nem para a estabilidade", avançando que também não compreende estas nomeações "em circuito fechado".

Ana Gomes também considera que Vitalino Canas “não tem perfil”, e vê com preocupação a sua “ligação ao mundo dos negócios". "É muito estranho que a proposta para o Tribunal Constitucional implique uma redução do número de mulheres", acrescentou ainda a ex-eurodeputada socialista.

A ex-ministra da Justiça Paula Teixeira da Cruz também não concorda com a escolha de Vitalino Canas: “Não me parece bem que haja uma politização tão extrema do TC", afirmou Teixeira da Cruz, apontando que não é correto "passar de deputado a juiz do TC".