O relatório da Comissão para a Igualdade e Contra a Discriminação Racial (CICDR) de 2020 tem por base os dados provisórios da Direção-Geral da Política de Justiça e os números são revelados na notícia desta sexta-feira no jornal Público. Em 2020, as autoridades policiais registaram 132 crimes por discriminação e incitamento ao ódio e violência em 2020. Face aos 82 casos de crimes da mesma natureza em 2019, trata-se de um aumento de 37%, num ano em que o número total de crimes caiu de 335.614 para 298.797.
Quase metade destes 132 crimes foi registada no distrito de Lisboa, (57 casos). A seguir surgem os do Porto (19), Setúbal (12), Aveiro e Coimbra (6 casos cada).
Quanto ao número de queixas, a CICDR revela ter recebido 655 em 2020, relativas a 405 situações. Um aumento de 50.2% em relação às 436 queixas recebidas em 2019. Mas apenas 5% das queixas resultaram em processos de contra-ordenação, sobretudo na área do comércio por recusa de fornecimento ou atendimento. Mais de dois terços das queixas foram encaminhadas para entidades com competência para a investigação de crimes, como o Ministério Público, a Inspeção-Geral da Administração Interna (IGAI), a Provedora de Justiça, o Banco de Portugal, a ASAE.
As multas previstas na lei podem ir até mais de 4 mil euros e das quatro multas aplicadas pela CICDR em 2020, a mais pesada foi aplicada a André Ventura - 3.370.86 euros - por uma publicação nas redes sociais a atacar a comunidade cigana. Para a comissão, no texto do deputado da extrema-direita “é publicamente imputada a prática de ilícitos criminais a pessoas da comunidade cigana, desconhecendo-se se tais ilícitos foram efetivamente praticados por pessoas daquela etnia, fomentando a discriminação racial e étnica e contribuindo de forma inequívoca para o reforço de estereótipos e preconceitos sobre a comunidade cigana, consubstanciando uma prática discriminatória em razão da origem étnica, na forma de assédio”.
Quanto à origem das queixas, apenas cerca de um terço foi apresentada pelas vítimas. Metade foram apresentadas por terceiros e 17.6% por associações e organizações. A PSP entregou apenas 1.7% do total de queixas recebidas pela CICDR. A discriminação da nacionalidade é a razão que justifica as queixas em um terço das 405 situações reportadas, seguindo-se a cor da pele (16%) e a origem racial e étnica (13.6%). A internet e os meios de comunicação social são os veículos reportados por mais de 60% das queixas, destronando o comércio (10%) em relação aos anos anteriores, o que é justificado pelas restrições da pandemia.
Em declarações ao Esquerda.net em março, após a divulgação do aumento do número de queixas, a deputada bloquista Beatriz Gomes Dias justificou-as com o facto de o debate sobre o racismo estar “cada vez mais presente no espaço público, aumentando a consciência e o conhecimento sobre o fenómeno, o que terá influenciado as organizações e as cidadãs e cidadãos a apresentar queixa contra os comportamentos racistas e preconceituosos de que são alvo sobretudo as pessoas negras, ciganas, migrantes e refugiadas”.
No entanto, acrescentou a atual candidata do Bloco à Câmara Municipal de Lisboa, é necessária uma revisão do quadro legal, pois no seu entender “o regime contraordenacional já provou ser manifestamente insuficiente e ineficaz para a prevenção e combate à discriminação racial”.