Beirute: Milhares de manifestantes exigem justiça

08 de agosto 2020 - 18:02

Este sábado, milhares de pessoas exigiram explicações sobre as explosões e acusaram o governo de corrupção. Polícia disparou gás lacrimogéneo contra manifestantes. Presidente do Líbano admite hipótese de bomba ou míssil mas recusa inquérito internacional. Sociedade civil mobiliza-se para reconstruir Beirute.

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Explosões em Beirute.
Explosões em Beirute. Imagem da Sky News.

Os manifestantes, reunidos na Praça dos Mártires, ergueram uma “forca de mentira” para os principais políticos do Líbano. “O povo quer a queda do regime” foi uma das frases mais entoadas durante o protesto, durante o qual foram ostentados cartazes com frases como “vão embora, vocês são todos assassinos”. Um grupo tentou romper a barreira que bloqueava uma rua de acesso ao Parlamento, sendo travado pelas forças de segurança com gás lacrimogéneo.

“Queremos um futuro com dignidade, não queremos o sangue das vítimas da explosão desperdiçado”, afirmou Rose Sirour, citada pelo Guardian.

Ainda que o presidente do Líbano tenha prometido na sexta-feira que todos os oficiais responsáveis pela explosão seriam levados à justiça, independentemente das suas posições, os manifestantes puseram em causa a fiabilidade do executivo no que respeita a investigar o acidente.

Uma das principais emissoras do país, a LBC, anunciou, entretanto, que não iria transmitir quaisquer discursos políticos ou declarações de líderes sobre uma investigação prometida sobre a catástrofe. Este boicote não impediu, contudo, a transmissão pela dos discursos de Aoun, ou do líder do Hezbollah, Hassan Nasrallah, que foram transmitidos pela LBC na sexta-feira.

Presidente do Líbano não exclui “possibilidade de interferência externa”, indicando que as duas explosões poderão ter sido resultado ou de um míssil ou bomba.

“A causa ainda não foi determinada. Existe a possibilidade de interferência externa através de um míssil ou bomba ou outro ato semelhante”, afirmou Michel Aoun, citado pela agência Reuters. O chefe de Estado do país recusa qualquer inquérito internacional.

Desde o início das investigações sobre a origem das explosões, já foram detidas 16 pessoas e interrogadas outras 18, avançou o comissário do Tribunal Militar, Fadi Akiki, citado pela Agência Nacional de Notícias do Líbano. Os visados são responsáveis do porto e das alfândegas, bem como funcionários encarregados da manutenção do hangar em que as 2.750 toneladas de nitrato de amónio estavam armazenadas. De acordo com a Associated Press, que citou fonte dos serviços de alfândega do Líbano, a situação era do conhecimento do gabinete do ex-primeiro-ministro Saad Hariri.

A CNN noticiou que o ativista de Direitos Humanos Wadih Al-Asmar e o atual diretor alfandegário do Líbano, Badri Daher, bem como o seu antecessor, Chafic Merhi, recorreram, por inúmeras vezes, a tribunais de Beirute desde 2014 para a retirada dos materiais perigosos do porto.

“Devido ao extremo perigo causado pelos artigos armazenados em condições climáticas inapropriadas, reiteramos o nosso pedido às autoridades portuárias para que reexporte esses bens imediatamente, de modo a manter a segurança do porto e daqueles que lá trabalham”, escreveu Chafic Merhi em 2016, numa missiva endereçada a um juiz envolvido no caso.

O Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos pediu esta sexta-feira uma investigação independente às explosões, insistindo que “os pedidos de responsabilização das vítimas devem ser ouvidos”. Já a Organização Mundial de Saúde alertou para a escassez dos medicamentos e a sobrelotação dos hospitais e apelou ao apoio internacional. As explosões afetaram os maiores silos de armazenamento de cereais do Líbano, com a destruição de perto de 15 mil toneladas de trigo, milho e cevada. Uma fábrica de farinha também foi destruída.

Até ao momento, estima-se que as explosões tenham causado pelo menos 154 mortos, mais de cinco mil feridos e 300 mil desalojados. Cerca de 300 mil pessoas, mais de 12% da população da capital libanesa, não podem regressar às suas habitações tendo em conta a dimensão das explosões.

Nas ruas de Beirute é visível a massiva mobilização da sociedade civil, que se empenha na reconstrução da capital libanesa. Milhares de jovens asseguram a distribuição, nas ruas, de alimentos e água potável.