Obama nomeia lobista da Monsanto para área de alimentos

22 de julho 2009 - 13:23
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Michael TaylorO presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, nomeou Michael R. Taylor para o cargo de assessor sénior de Margaret Hamburg, presidente da Food and Drug Administration (FDA), órgão do governo americano que regulamenta alimentos e medicamentos. O passado de Taylor está intimamente ligado à aprovação dos transgénicos nos EUA (e, em consequência, no mundo). Artigo do Boletim ASPTA (Brasil).

 

 

A porta giratória entre a indústria e o governo continua a rodar nos EUA. Em 6 de Junho, Barack Obama nomeou Michael R. Taylor para o cargo de assessor sénior de Margaret Hamburg, presidente da Food and Drug Administration (FDA), órgão do governo americano que regulamenta alimentos e medicamentos.

Taylor é um antigo conhecido daqueles que acompanham a novela dos transgénicos. Sua história está intimamente ligada à aprovação dos transgénicos nos EUA (e, em consequência, no mundo).

Fazendo uma retrospectiva. Em 1991, após os cientistas da FDA concluírem que não havia segurança suficiente para a distribuição de alimentos transgénicos no país, o governo de Bill Clinton criou um posto no órgão especialmente para Taylor, que trabalhara por sete anos como advogado da Monsanto.

No cargo de "deputy commissioner for policy", uma espécie de conselheiro para políticas, Taylor comandou a criação do famoso conceito da "equivalência substancial" para comparar plantas transgénicas e convencionais. Segundo o método, fazendo-se uma comparação química grosseira entre uma planta transgénica e sua similar convencional, pode-se concluir que a transgénica é "substancialmente equivalente" à convencional e portanto, por princípio, é segura. Mais ainda, se ela é quimicamente equivalente e portanto segura, não é necessária a realização de testes exaustivos para verificar sua segurança. Brilhante, não?

Importante notar ainda que, segundo este incrível conceito, além de se comparar uma lista bastante limitada de elementos (como as quantidades de proteínas, carboidratos, vitaminas e minerais, entre alguns outros), em nenhum lugar são estabelecidos os níveis de similaridade que uma planta transgénica deve ter em relação à sua contraparte convencional para ser considerada equivalente.

E como se não bastasse a precariedade científica do conceito, ele costuma ser aplicado da forma mais tosca possível. Vejamos, por exemplo, o caso da soja tolerante ao herbicida glifosato. Conforme descreveram três renomados cientistas na revista Nature em 1999, "Embora nós saibamos há cerca de dez anos que a aplicação de glifosato na soja altera significativamente a sua composição química (por exemplo, o nível de componentes fenólicos como isoflavonas), a soja resistente ao glifosato usada nos testes de composição cresceu sem a aplicação de glifosato. Isto apesar do facto de que as lavouras comerciais de soja tolerante ao glifosato seriam sempre tratadas com o produto para eliminar plantas invasoras. Os grãos testados eram, portanto, de um tipo que jamais seria consumido, enquanto aqueles que seriam consumidos não foram avaliados."

Já naquela época os cientistas alertavam: "A equivalência substancial é um conceito pseudo-científico porque é um julgamento comercial e político mascarado de científico. Ele é, além disso, inerentemente anti-científico, porque foi criado primeiramente para fornecer uma desculpa para não se requererem testes bioquímicos e toxicológicos."

Mas foi a partir deste princípio de Taylor que os transgénicos foram autorizados nos EUA, dispensando-se as análises de risco. O conceito foi difundido pelo mundo e possibilitou a libertação dos transgénicos em diversos países - inclusive no Brasil.

Na sua passagem pela FDA, Taylor também foi responsável pela autorização da distribuição nos EUA da hormona de crescimento bovino transgénico (rBST ou rBGH, nas siglas usadas em inglês), da Monsanto. O produto é injectado em vacas para aumentar a produção de leite, mas diversos estudos apontam evidências de que ele produz efeitos colaterais nas vacas (como aumento da incidência de mastite) e que provoca no leite o aumento do nível de outra hormona associado ao surgimento de câncer de mama, próstata e colo. Além disso, o uso de hormona transgénica pode estar relacionado ao alto nível de nascimentos de gémeos.

Taylor não só conseguiu que a hormona do leite fosse aprovada nos EUA, como impediu que a informação sobre o uso do produto aparecesse nos rótulos de embalagens de leite e derivados (a Monsanto chegou a processar os produtores que rotularam seu leite como "livre de rBST"; recentemente um grande movimento de consumidores conseguiu, em alguns estados americanos, impedir a aprovação de leis para proibir os rótulos "livre de hormona de crescimento")

Após cumprir estes serviços Taylor saiu da FDA, em 1994. Foi para o Serviço de Inspecção e Segurança de Alimentos (FSIS) do USDA (ministério de agricultura dos EUA) e, em 1998, tornou-se um dos vice-presidentes da Monsanto, actuando na área de "políticas públicas" (espécie de "lobista-chefe" da empresa). Taylor ocupou este cargo por dois anos.

Agora de volta à FDA, Taylor enterra qualquer esperança que se poderia ter de que o governo de Obama conseguisse manter a independência das indústrias de biotecnologia e promover mudanças importantes na precária política para a segurança dos alimentos no país.

Muda-se o piloto, mas mantém-se o resto da tripulação, que se encarrega de não permitir alterações de rota. Aliás (e infelizmente) este fenómeno é também bastante comum por aqui, especialmente nesta área - afinal, quem diria, há dez anos, que o Brasil escancararia as portas aos transgénicos justamente sob o PT de Lula?

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