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Barragens e biocombustíveis questionados no Parlamento

A linha do Tua vai ser submergida pela barragemO Bloco de Esquerda apresenta esta quarta feira na Assembleia da República uma proposta de resolução que visa suspender a decisão governamental de construir dez novas barragens em território nacional. Em particular, o Bloco propõe que o governo recue na decisão de construção de três dessas barragens (Foz Tua, Fridão e Baixo Sabor). Na semana passada, o BE já tinha apresentado outra proposta na área do aproveitamento energético, no sentido de rejeitar a incorporação de 10% de biocombustíveis nos transportes exigida pela União Europeia.

O Governo português estabeleceu como objectivo estratégico para a energia hídrica a obtenção de 7.000 MW de potência instalada em 2020. Para alcançar esse objectivo, aprovou o reforço de potência nas centrais de Picote e Bemposta (+ 409 MW) e a concretização da duplicação da central de Alqueva (+ 260 MW), decidiu avançar com os aproveitamentos de Ribeiradio (70 MW) e Baixo Sabor (170 MW), e seleccionou 10 novas barragens a serem construídas (1.150 MW), dentre 25 alternativas possíveis analisadas no Plano Nacional de Barragens de Elevado Potencial Hidroeléctrico – PNBEPH, sujeito a uma Avaliação Ambiental Estratégica. 

O Bloco considera que "tendo em conta que o incremento da energia de origem renovável, a diminuição de dependência energética nacional e a redução das emissões de gases de efeito de estufa são as razões apresentadas para justificar o superior interesse público das novas barragens, seria interessante avaliar de forma mais aprofundada as alternativas de política energética para a concretização desses mesmos objectivos em relação à eficácia e aos impactos económicos, sociais e ambientais". 

Na proposta de resolução apresentada lembra-se que "no PNBEPH assume-se a necessidade da continuação do aumento do consumo de electricidade (na ordem dos 30%), apesar de reconhecer que o nível de ineficiência e intensidade energética em Portugal é muito superior à média europeia e que existe uma margem muito significativa para economias de energia muito interessantes do ponto de vista económico. O PNBEPH refere também que as restantes energias renováveis destinadas à produção de energia eléctrica (solar, biomassa, biogás, minihídrica, ondas e microgeração) não serão a médio prazo atractivas, sendo por isso que a forte aposta em termos de renováveis se realiza a nível da eólica e da hídrica". 

Para o Bloco de Esquerda, "estes são dois dos pressupostos patentes na Estratégia Nacional de Energia, os quais justificam a proposta de construção de 12 novas grandes barragens, que consideramos erradas do ponto de vista da política energética". 

Das novas barragens incluídas no PNBEPH, seis situam-se na bacia do Douro (Foz Tua, Fridão, Padroselos, Gouvães, Daivões, Vidago), cinco das quais na sub-bacia do Tâmega, três delas interceptando o curso principal (Fridão, Daivões e Vidago) e duas em seus afluentes (Padroselos no rio Beça e Gouvães no rio Torno/Louredo). Duas barragens situar-se-ão na bacia do Tejo (Almourol e Alvito), uma na bacia do Mondego (Girabolhos) e uma na bacia do Vouga (Pinhosão). O grupo parlamentar do BE considera que "dentro das propostas de reforço da potência hidroeléctrica e do PNBEPH, são especialmente polémicas as novas barragens de Foz Tua, Fridão, Almourol e do Baixo Sabor pelas suas consequências ambientais, patrimoniais, paisagísticos e de segurança das populações".

Em particular, a barragem do Foz Tua irá afectar uma zona de tem condições paisagísticas singulares. Como refere o próprio PNBEPH “a barragem do Foz Tua situa-se na unidade paisagística do Douro Vinhateiro”, tratando-se “de uma paisagem única e singular que, pelo seu valor, foi incluída na lista de Património da Humanidade da UNESCO". Segundo a proposta do Bloco de Esquerda, "são estas condições paisagísticas de excelência e a linha de caminho de ferro do Tua, já considerada uma das mais belas da Europa, que todos os anos atraem inúmeros turistas e visitantes para descobrir a beleza das gargantas apertadas que caracterizam o vale do Tua e praticar um conjunto de actividades associadas ao rio e à natureza. A linha ferroviária do Tua, uma importante obra de engenharia com cerca de 120 anos, só por si já é um importante património cultural que deveria ser classificado". 

 A proposta de resolução que o Bloco de Esquerda apresenta pretende que o governo "recue na decisão de construção das barragens de Foz Tua, Fridão e Baixo Sabor", "estude a possibilidade de implantação de mini-hídricas como alternativa à construção da barragem de Almourol", "não permita que a albufeira da barragem de Almourol, caso avance, tenha um nível de pleno armazenamento superior à cota 19", "suspenda todos concursos de concessão das barragens previstas no PNBEPH até estarem concluídos os processos de Avaliação de Impacte Ambiental de cada um dos aproveitamentos hidroeléctricos", "inclua uma análise dos impactes cumulativos ao nível de cada bacia hidrográfica nos processos de Avaliação de Impacte Ambiental" e "elabore um plano de recuperação da qualidade da água do rio Tâmega, não permitindo que a albufeira da Barragem do Torrão ultrapasse a cota 62".

Na semana passada, o Bloco de Esquerda tinha apresentado outra proposta de resolução, no sentido de recomendar ao governo a rejeição da meta de incorporação de 10% de biocombustíveis nos transportes proposta pela União Europeia, que em 2003 publicou a Directiva 2003/30/CE, de 8 de Maio, para promover o uso de biocombustíveis nos transportes, estabelecendo uma meta de incorporação de 5,75% até 2010 para cada Estado Membro. Em 23 de Janeiro de 2008 a Comissão Europeia lançaria nova proposta de directiva para a promoção do uso de energia proveniente de fontes renováveis, traçando o objectivo de incorporação de 10% de biocombustíveis até 2020 para cada Estado Membro. 

Vários relatórios da Agência Europeia de Ambiente têm vindo a alertar para os riscos dos combustíveis, e em particular da meta proposta pela Comissão Europeia.  A meta traçada dos 10% até 2020 tem sido sujeita a intensas críticas, inclusive dos próprios organismos científicos afectos à UE. Perante os alertas dos cientistas e instituições internacionais, vários Estados membros têm vindo a reformular os incentivos públicos que dão aos biocombustíveis: é o caso do Reino Unido, França, Alemanha e Holanda. 

Tendo em conta todos estes estudos, relatórios e alertas de cientistas, a Comissão Europeia parece indisponível para recuar no objectivo. É, por isso, necessário que mais Estados Membros recusem as metas propostas pela Comissão Europeia e imponham critérios para a utilização de biocombustíveis, como seja a não utilização de culturas alimentares. Caso a Comissão insista em ter objectivos para a incorporação dos biocombustíveis, é necessário que estes não sejam de cumprimento obrigatório a nível nacional. 

Nesse sentido, a proposta de resolução apresentada pelo BE recomenda ao Governo que exija junto da Comissão Europeia "a suspensão do objectivo de incorporação de 10% de biocombustíveis até 2020", "a impossibilidade de utilização, no espaço europeu, de biocombustíveis provenientes de culturas alimentares e/ou cultivos agrícolas intensivos em termos de área ocupada, recursos naturais e factores de produção" e "que quaisquer metas de incorporação de biocombustíveis não sejam de cumprimento obrigatório para os Estados Membros mas apenas valores de referência".

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