A NATO para quê?

porLuís Fazenda

Fugir a esta espiral do militarismo obriga a uma posição de rutura com a NATO que é o cancro do belicismo. Hoje é muito mais claro para os europeus que esta não lhes serve de proteção como quando foi a invasão russa da Ucrânia. Os EUA que partilham e saqueiam a Ucrânia a meias com a Rússia, ameaçam a Dinamarca e o Canadá.

23 de março 2025 - 16:41
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Bandeiras dos EUA e NATO
Bandeiras dos EUA e NATO. Foto de NATO/Flickr
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1- Donald Trump deu um tiro fatal na NATO. Para além de várias atitudes de menosprezo pelos parceiros europeus, o presidente norte-americano declarou que não vai respeitar o artigo 5º do Tratado do Atlântico Norte. Perante o público do planeta, disse não acreditar que a Europa, mesmo só a França, auxiliassem os EUA em caso de agressão à superpotência americana. Isso justificaria a sua neutralidade em auxiliar a Europa face a ataques vindos das suas fronteiras leste ou sul. De imediato, sentiu-se a orfandade das elites liberais ao leme da União Europeia. Mais grave ainda, Trump e o seu dileto espavento Elon Musk sustentam abertamente a extrema-direita europeia contra as elites liberais. Ainda muito mais grave, Trump faz negócios políticos e económicos diretamente com Putin, inimigo declarado da Europa liberal, desconhecendo Londres, Bruxelas, ou qualquer capital europeia, salvo Budapeste do seu amigo Orban.

2- Uma aliança militar sem entreajuda militar não existe. Perguntamo-nos então sobre a continuidade da NATO enquanto organização. Resulta claro que a Casa Branca quer uma separação sem divórcio. A NATO dá jeito aos EUA para a proteção das suas bases militares estacionadas na Europa, para pressionar a compra de armamento americano através das estruturas de comando conjuntas, e também para subir a parada de impor aos europeus protecionismo tecnológico face à China. Para Londres, Paris e Berlim foi-se a ilusão de que disporiam do chapéu nuclear americano. E agora estão entre a ilusão de que o afastamento dos EUA seja temporário e o receio de represálias dos EUA se a Europa consumasse um divórcio de facto. Na dúvida entre as duas atitudes querem armar a Europa ocidental como nunca na história.

3- Esse Plano chamado de Rearmamento Europeu é a decisão mais estratégica da UE desde a criação da moeda única. O nome não é inocente, pretende fazer crer que a Europa está desarmada ou que não passa de um “anão militar”, no jargão de Bruxelas. Não é verdade, os Estados europeus da NATO já gastam em despesas militares 1,5 vezes mais do que a Rússia. Mesmo que numa ou noutra capacidade militar possa haver desequilíbrio de equipamentos que já estão ao nível da destruição mútua, o arsenal desses Estados europeus é mais do que convincente para a sua segurança e para alguma forma de cooperação entre si. Este Plano de 800 mil milhões de euros, obtidos a partir do endividamento dos Estados-membros, era precisamente a verba necessária para financiar a transição energética e os empregos e casas verdes.

4- O Diretório Europeu quer fazer das despesas militares, que não contam para limites de défice nem de dívida, a alavanca para uma grande intervenção do Estado na economia, puxar o capital privado para beneficiar da operação, e tentar sair da estagnação económica. Não quiseram a economia da Paz e do Ambiente mas instalam uma economia de guerra. Há pouco tempo, o almirante Gouveia e Melo dizia que era preciso morrer pela NATO se fosse preciso e que “não há manteiga sem canhões”. Por aqui se vê o programa destes supranumerários da NATO. O lema é cortar no estado social para comprar armas.Macron em França e Merz na Alemanha assumiram claramente que farão cortes nos serviços públicos para encaminhar os orçamentos militares.

5- Fugir a esta espiral do militarismo obriga a uma posição de rutura com a NATO que é o cancro do belicismo. Hoje é muito mais claro para os europeus que a NATO não lhes serve de proteção como quando foi a invasão russa da Ucrânia. Estados Unidos que partilham e saqueiam a Ucrânia a meias com a Rússia. Os Estados Unidos ameaçam a Dinamarca que lhes fica com a Gronelândia. Os Estados Unidos ameaçam outro membro da Nato de anexação: o Canadá.

A NATO confirma o que sempre foi, agora em modo de naufrágio, uma máquina de guerra ao serviço dos EUA. Os povos têm tudo a ganhar impondo um real divórcio face à NATO. Nós portugueses, teremos sempre de lembrar que a NATO apoiou o salazarismo e ameaçou a democracia em 1975. A nós portugueses, não basta sair da NATO, teremos de recuperar a base das Lajes para a soberania nacional. A NATO para quê?


Texto publicado originalmente na Contradição.

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