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Barragem do Baixo Sabor: Autarquias acusam EDP de não pagar o que deve

A Associação de Municípios do Baixo Sabor diz que a elétrica não está a cumprir as suas obrigações no pagamento da renda e na dotação do fundo para adaptação e desenvolvimento sustentável da região.
Barragem do Baixo Sabor. Foto Agência Portuguesa do Ambiente

A associação composta pelos municípios de Alfândega da Fé, Macedo de Cavaleiros, Mogadouro e Torre de Moncorvo (AMBS) reclama o pagamento da renda devida pela EDP pela exploração da barragem do Baixo Sabor, cuja construção teve início em 2008 numa zona protegida que integra a Rede Natura 2000.

Desde então, a renda anual prevista não foi paga. Questionada pelos municípios, a EDP respondeu que as formas de cálculo da renda previstas no decreto-lei 424/83 deixaram de ser aplicadas com a reorganização do setor elétrico e da estrutura de tarifas aprovada pela ERSE.

Os municípios do Baixo Sabor contestam esta interpretação da lei e dizem que aquele decreto-lei se mantém em vigor. Para além disso, sustentam que a obrigação do pagamento da renda anual não colide com a reestruturação da EDP, a estrutura das tarifas aprovada pelo regulador ou a transparência dos critérios de relacionamento entre os intervenientes no setor eléctrico. Quanto às iniciativas da EDP, em articulação com estas autarquias, para dinamizar as zonas afetadas pela barragem, a AMBS considera-as complementares à renda anual, “atento o desfasamento existente entre as rendas que são devidas aos municípios e os ganhos que a EDP obtém com a exploração do centro eletroprodutor”, justifica o relatório das autarquias.

Outra razão de queixa sobre o incumprimento da EDP é o seu contributo para o Fundo do Aproveitamento Hidroelétrico do Baixo Sabor, criado no âmbito da Declaração de Impacte Ambiental da barragem em 2004. A empresa está obrigada, para além das medidas de compensação e monitorização, a contribuir para este fundo que visa “iniciativas de desenvolvimento sustentável com base na valorização ambiental dos recursos naturais e patrimoniais da região”. 

Para esse efeito, a EDP está obrigada a contribuir com “uma verba calculada de base de 3% do valor líquido anual médio de produção” desde o início da construção, refere um anexo da Declaração de Impacte Ambiental, onde se define a forma de cálculo desta contribuição anual.

Em 2012, a EDP apresentou aos municípios do Baixo Sabor a sua previsão da dotação do fundo até 2050, com os valores crescentes a partir do início da exploração da barragem. Com base nessa projeção, os municípios elaboraram o Plano Estratégico de Desenvolvimento Sustentável do Baixo Sabor para adaptar o território às alterações trazidas pela barragem e potenciar as condições de atratividade da região no plano turístico e ambiental.

Porém, no ano seguinte, a EDP propôs mudar a fórmula de cálculo das suas contribuições para este fundo de compensação ambiental. Na prática, o valor a pagar em 2016, primeiro ano de exploração da barragem, ficou-se pelos 226 mil euros, quantia inferior à que foi paga durante os anos de construção. Questionados pelas autarquias sobre os fundamentos da alteração da fórmula de cálculo, nem EDP nem o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas deram qualquer resposta até à data. O Bloco já questionou por escrito o governo sobre estas denúncias de incumprimento da EDP feitas pelas autarquias.

Bloco propôs fim do subsídio às novas barragens e cancelamento do projeto do Fridão

No debate do Orçamento do Estado para 2017, o Bloco de Esquerda propôs a eliminação do subsídio ao investimento em novas barragens por parte da EDP e da Iberdrola. Esse subsídio de de 22 milhões incide sobre a fatura dos consumidores como parte da chamada “garantia de potência”.

"O subsídio às novas barragens não se justifica sob nenhum ponto de vista e devia ter sido terminado há muito tempo”, afirmou o deputado Jorge Costa em fevereiro deste ano ao Jornal de Negócios.

O deputado lembrou que "não há qualquer custo para o Estado na eliminação deste subsídio, pois ele não consta nos contratos com as concessionárias", sendo que, inclusive, o subsídio é "frontalmente contrário às próprias recomendações da Comissão Europeia e da troika, devendo ser classificado como mais uma renda excessiva do setor elétrico".

Quanto às hídricas ainda por construir, Jorge Costa defendeu que "na ausência deste subsídio, estas barragens seriam revistas, e isso seria bom, pois são barragens totalmente inúteis e excedentárias, e ambientalmente absurdas".

Já junho deste ano, o Bloco questionou o ministro do Ambiente sobre o prolongamento do prazo de validade do projeto para a construção da Barragem do Fridão, no rio Tâmega. A decisão do governo “beneficia a empresa privada com direitos sobre a barragem, em detrimento da economia local”, afirmou Jorge Costa, que também reclamou a elaboração de um  novo Estudo de Impacto Ambiental e uma nova consulta pública para o projeto.

O Bloco já tinha questionado o governo sobre a segurança das populações a jusante da barragem projetada, nomeadamente na cidade de Amarante, defendendo o cancelamento da sua construção.

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Neste dossier:

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