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Walter Bernstein: morreu um dos últimos perseguidos da “caça às bruxas” em Hollywood

O argumentista tinha 101 anos e em 1976 levou aos ecrãs a experiência de ter sido colocado na lista negra. Depois disso, escreveu na sua biografia que não abandonou “a ideia do socialismo, a possibilidade de que venha a haver um sistema que não é baseado na desigualdade e exploração”.
Walter Bernstein em 2016. Foto de Luigi Novini/ Wikimedia Commons.
Walter Bernstein em 2016. Foto de Luigi Novini/ Wikimedia Commons.

Walter Bernstein morreu aos 101 anos, esta sexta-feira. Era um dos últimos sobreviventes das pessoas que foram perseguidas no pós-guerra nos Estados Unidos por “atividades anti-americanas”. Impossibilitado de encontrar emprego por ter sido colocado na lista negra, vai sobreviver escrevendo em nome de outras pessoas, uma experiência que conta no argumento do filme The Front, de 1976, com Woody Allen como protagonista.

Natural de Brooklyn, Nova Iorque, Bernstein era descendente de imigrantes judeus da Europa de Leste. Na sua biografia, Inside Out, publicada em 1996, contava que cedo descobriu as suas duas paixões: os livros e o cinema. “Os livros abriram-me a cabeça. Os filmes abriram-me o coração”, escreveu. Já então com sentido político: Marx, Steinbeck e Eisenstein estavam na sua lista de preferências.

Na universidade de Dartmouth adere ao Partido Comunista e nele permanece até 1956, altura em que sai do partido mas não abandona o socialismo. Sobre isso escreveu que “tinha deixado o partido mas não a ideia de socialismo, a possibilidade de que venha a haver um sistema que não é baseado na desigualdade e exploração”.

Durante a 2ª Guerra Mundial vai ser correspondente de guerra, escrevendo depois um livro sobre isso, Keep Your Head Down. A seguir começa a trabalhar como argumentista em Hollywood. Mas os ventos dominantes nos EUA não são favoráveis a quem defenda os seus ideais. A “guerra às bruxas” vai ser implacável. O senador Joseph McCarthy e o seu Comité de Atividades Anti-Americanas perseguem quem é comunista ou quem se suspeite ter simpatias esquerdista. Faz-se dos interrogatórios um espetáculo, pressiona-se a delação, impedem-se os suspeitos de trabalhar.

No verão de 1950 o seu nome consta da lista negra e deixa de poder assinar o seu trabalho. Ao contrário de outros, Walter Bernstein não cede, não delata. A sua carreira podia ter sido destruída como outras mas tem sorte. Estava a escrever a série da CBN Danger e os responsáveis desta arriscam mantê-lo não assinando o seu trabalho. O mesmo acontece em alguns outros projetos.

O clima vai desanuviar mais tarde, a caça às bruxas vai perdendo força e em 1959 já escrevia That Kind of Woman que será protagonizado por Sophia Loren. Depois trabalha em The Magnificent Seven, a adaptação estilo western dos Sete Samurais de Akira Kurosawa. E no filme que Marilyn Monroe não chega a acabar, Something’s Gotta Give.

Quando finalmente pode contar a história de uma geração de atores, guionistas e outros, escreve The Front onde participa o ator Zero Mostel, outro dos perseguidos da época que teve a coragem de entrar em confronto com os interrogadores do Comité de Atividades Anti-Americanas. É nomeado para os Óscares por esse argumento.

Depois disso, tem uma carreira de sucesso ganhando um prémio de carreira da Screen Writers’ Guild em 1994. Foi ainda professor de guionismo na Universidade de Nova Iorque.

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