Não é de hoje que os políticos, indiscriminadamente (mas na sua grande maioría, de Direita), utilizam a religão como arma de arremesso político para atraír os enraivecidos, os crentes e os semi-crentes. Esta estratégia serve para angariar mais votos para o seu partido daqueles que acreditam. A meu ver, está na hora de instigar o divórcio no casamento tóxico entre a Política e a Religião.
Ao longo da História presenciámos vários momentos em que os atores políticos se aliaram à sua fé (ou ao que dela podiam tirar proveito) para alcançar algo. É exemplo disso, o ex-presidente dos Estados Unidos da América, George W. Bush. Durante o seu tempo na Casa Branca, assumiu uma posição conservadora em relação às políticas sobre gravidez e DSTs na adolescência. Bush era contra a educação sexual para adolescentes e deu prioridade a campanhas realizadas por grupos religiosos que incentivaram os jovens a manterem a virgindade como a melhor maneira de evitar uma DST ou gravidez na adolescência.
Um pouco mais abaixo, no continente sul-americano, mais propriamente no Brasil, existe uma situação primária e alarmante, onde a religião se entrelaça com a Política. Para além de existir uma grande parte de políticos fundamentalistas no Senado, existe também a bancada evangélica, uma bancada que agrupa deputados e senadores alinhados com pautas “morais” (e moralmente questionáveis).
Seja a norte ou a sul da linha do Equador, no Ocidente ou no Oriente, o uso da religião na política tem consequências gravosas. Seja pelo persuasivo linguajar político-religioso ou pela tentativa de retratação como “bons meninos”, pois, estas ações influenciam a maneira como nós, a população, votamos. E a prova disso são as situações preocupantes que se desenvolvem por todo o globo. É o caso das Repúblicas Islâmicas, do Estado Judaico ou a infusão de uma encapotada ideologia nacionalista, como a Hindutva na Índia, ou ainda do envolvimento da Igreja nas candidaturas políticas de Donald Trump e Jair Bolsonaro.
O grande perigo por detrás desta junção, entre a Política e a Religião, é o Fundamentalismo Religioso.
Parafraseando Roberlei Panasiewicz, o fundamentalismo religioso é um movimento que surgiu originalmente no seio de tradições religiosas como uma reação à modernidade e às suas implicações, como a autonomia do indivíduo, a secularização e a racionalidade científica. Em termos gerais, o fundamentalismo caracteriza-se por uma interpretação rígida e literal dos textos sagrados e uma rejeição de qualquer forma de adaptação ou modernização dessas doutrinas.
O uso do fundamentalismo religioso tem efeitos negativos em todos os níveis da sociedade. Seja pela revogação de direitos dos cidadãos, incluindo mulheres e pessoas queer, seja pelo aumento da intolerância religiosa entre pessoas diferentes daquilo que os fundamentalistas acreditam ser o modelo a seguir.
E por falar em fundamentalistas, por falar daqueles que utilizam a palavra de Deus e usam a doutrina religiosa para mascarar os seus ódios e os seus preconceitos. Estes não são os verdadeiros religiosos ou os verdadeiros cristãos. Estes são os mais impuros da nossa sociedade. Estes, que empregam o “direito que Deus lhes deu” para atacar minorias ousando dizer que o fazem em nome de Deus, como é o caso de um líder político de extrema-direita em Portugal. Estes sim, são os verdadeiros pecadores.
“Deus deve estar envergonhado de tanta maldade, crueldade e ódio sendo proferido em seu nome” - Erika Hilton, a primeira mulher trans negra eleita deputada federal no Brasil.
A ideia de que existe uma guerra entre pessoas queer e a igreja é uma das maiores inverdades que vivemos hoje. Não existe, nem nunca existiu nenhuma tentativa de combater a religião, de combater o evangelho e muito menos existe uma perseguição a religiosos por parte da comunidade. Não existe ódio proveniente da comunidade LGBTQIAP+.
O que se quer é defender direitos que custaram tantas vidas e tanto tempo a conquistar. O que verdadeiramente procuramos é lembrar que nós existimos, que as nossas vidas importam e que os nossos direitos são inegociáveis.
Mas é tudo mau? São todos horríveis?
Não. O problema não está em crer. Todos cremos em algo ou em alguém.
O sociólogo português Boaventura de Sousa Santos diz-nos que não é possível colocar todos os religiosos no mesmo grupo e eu concordo. Existem algumas diferenças causadas pela pluralidade de olhares políticos sobre os temas. Existem grupos religiosos, por exemplo, com uma postura muito mais progressista, que, inclusive, já se posicionaram publicamente contra leis que façam aumentar a violência contra a comunidade LGBTQIAP +. Existem até grupos religiosos que fazem parte de denominações pluralistas que abraçam pautas sociais, relacionadas a racismo, feminismo, desigualdade social e movimento LGBTQIAP +.
Esta não é uma luta de progressistas ou da comunidade LGBTQIAP+ ou da Esquerda contra religiosos. É uma luta contra o fundamentalismo religioso que envenena toda e qualquer nação.