Incêndios

“Todas as lições foram esquecidas”: Bloco anuncia comissão de inquérito ao combate aos incêndios

25 de agosto 2025 - 14:34

Mariana Mortágua visitou no domingo e segunda-feira áreas ardidas no centro do país, acompanhada por bombeiros, sapadores florestais e investigadores.

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A coordenadora do Bloco de Esquerda (BE), Mariana Mortágua (E), conversa com o agricultor Hélder Correia (D), durante a visita às zonas afetadas pelos incêndios, que já tinham sido afetadas pelos incêndios em 2017 e voltou a ver as suas terras destruídas pelo fogo, em Avô, Oliveira do Hospital, 25 de agosto de 2025.
A coordenadora do Bloco de Esquerda (BE), Mariana Mortágua (E), conversa com o agricultor Hélder Correia (D), durante a visita às zonas afetadas pelos incêndios, que já tinham sido afetadas pelos incêndios em 2017 e voltou a ver as suas terras destruídas pelo fogo, em Avô, Oliveira do Hospital, 25 de agosto de 2025. Foto de Paulo Novais/Lusa

“Esta noite ainda conseguimos dormir alguma coisa”, diz um dos bombeiros em tom de piada. No Santuário de Santa Luzia, em Castelejo, juntam-se vários aderentes do Bloco de Esquerda na região, encabeçados pela coordenadora nacional do partido. Durante a manhã deste domingo, observam a área ardida, consequência dos incêndios que têm devastado o país, e encontram algumas dezenas de bombeiros que também visitam o Santuário depois do turno de trabalho.

Durante algumas horas, a comitiva bloquista troca impressões com os bombeiros e Mariana Mortágua agradece o seu trabalho. São bombeiros que vêm sobretudo da Grande Lisboa, e passaram o dia anterior a combater o incêndio que deflagrou em Piódão. Agora, falam de outro incêndio em Pedrógão Grande.

Entre os bloquistas está Isabel Rocha, que durante muitos anos trabalhou como sapadora florestal, e que apesar de estar reformada, esteve a ajudar a combater os fogos no Paul, naquela mesma área. Trocando impressões com os bombeiros em cumplicidade, lembra os grandes incêndios de outra década no Paul e a forma como a floresta foi ordenada para prevenir que o mesmo voltasse a acontecer. Mesmo assim, o fogo chegou lá.

Pinheiros e eucaliptos são espécies que permitem que o fogo se espalhe facilmente, e naquele que é um dos maiores incêndios florestais que Portugal já viu, isso é um fator importante. Mas também a falta de corredores e de limpeza devida, ou seja, a falta de uma estratégia de gestão e ordenamento numa grande parte da floresta, que permita prevenir os incêndios e impedir que tomem estas dimensões.

Sobre os incêndios na região, Isabel diz que “foi assustador” e aponta a “descoordenação” dos meios para combate ao incêndio, mobilizando bombeiros de forma ineficiente. “O povo foi acudir e só assim se evitou uma desgraça maior e não arderam casas”, explica. “Mas a perda do património florestal daquela zona, que estava ordenada, foi por falta de manutenção”.

A ex-sapadora florestal fala na necessidade de prevenção, dizendo que “temos de apostar em folhosas, trava-fogos, carvalhos, nogueiras” para conseguir ter um ordenamento florestal que resista regularmente aos incêndios.

Também presente na visita esteve Inês Gomes, investigadora na área dos incêndios rurais, que explicou um pouco da história do planeamento da floresta e de como chegámos à atual situação, em que os incêndios são muito regulares.

“Antigamente os terrenos estavam limpos, as pessoas iam para os matos, pastavam as ovelhas e cabras, tiravam lenha para se aquecer e cozinhar”, explica. “E tudo isso se perdeu, essas coisas não vão voltar. Mesmo que as pessoas voltem para as aldeias, já não têm a agricultura de subsistência, isso já não é uma realidade”.

Bloco avança com comissão de inquérito

Já na manhã de domingo, Mariana Mortágua este na freguesia de Avô, em Oliveira do Hospital, com Hélder Correia. Hélder vive ali, e viu a sua casa e as suas colheitas serem destruídas, num prejuízo de 60 mil euros. Não é a primeira vez. Já em 2017, o agricultor tinha perdido uma parte dos seus terrenos para o fogo.

“O que Hélder nos conta é que esperava que, depois de 2017, as coisas mudassem. Mudassem não só no combate aos incêndios, como no ordenamento do território, que é muito composto por eucaliptos. E o que ele nos diz é que nada mudou”, diz aos jornalistas a coordenadora do Bloco de Esquerda. “Sete anos depois, as coisas voltam a acontecer, voltam a arder e a pergunta que faz é: Para que é que serve investir? Se uma pessoa investe e de sete em sete anos as coisas ardem, todas as lições são esquecidas”.

A deputada do Bloco de Esquerda anunciou uma Comissão de Inquérito à coordenação e aos meios de combate aos incêndios, dizendo que “neste momento, o mais importante é perceber como é que funcionaram as cadeias de comando e a desorganização de combate aos incêndios” e “perceber porque é que os organismos de prevenção não funcionaram e compreender porque é que Portugal continua a não ter os meios aéreos necessários para combater os fogos”.

Depois do contacto com os bombeiros no domingo, Mariana Mortágua diz que parece ter havido “problema de hierarquia política", e que os relatos são de “uma enorme desorganização", não dos operacionais no terreno “mas das cadeias de comando”.

Nesta comissão de inquérito, o Bloco quer “apurar a disponibilidade, contratação e manutenção dos meios de combate, investigando a responsabilidade governativa na indisponibilidade de helicópteros e aviões Canadair”, analisar a coordenação entre entidades responsáveis e investigar os sistemas de monitorização, vigilância e deteção precoce, apurando as razões para a não integração de tecnologias de deteção remota em tempo real.