O debate na CNN Portugal desta quinta-feira opôs os líderes do Bloco de Esquerda e da Iniciativa Liberal. E os temas trazidos à discussão serviram para deixar claras as diferenças entre as propostas dos dois partidos.
O primeiro dos temas abordados foi o reforço do investimento militar, com Rui Rocha a defender que o país tem de cumprir as metas fixadas pela NATO, nem que para isso tenha de reprogramar projetos do PRR e do Portugal 2030. O líder da Iniciativa Liberal diz que o reforço do orçamento militar traz “vantagens a prazo” com o desenvolvimento da área tecnológica para uma “economia de maior valor acrescentado”.
Por seu lado, Mariana Mortágua afirmou que “o que está em cima da mesa não é qualificar as Forças Armadas, é comprar mais armas”, coisa de que a Europa não precisa mas é do interesse da indústria alemã e francesa do armamento que anda “de mão estendida” em busca dos contratos públicos nos vários países. “Se queremos investir em inovação, vamos investir em inovação”, defendeu a coordenadora bloquista, reafirmando que “investir em mais armas não tem qualquer sentido racional”, pois “não é a produção de armamento que vai salvar Portugal”.
O debate prosseguiu com Rui Rocha a acusar o Bloco de ter desvalorizado a ameaça russa à Ucrânia antes da invasão e Mariana Mortágua a lembrá-lo que “ainda a IL apoiava a venda de vistos gold à oligarquia de Putin, já eu denunciava essa oligarquia”.
No tema da habitação, Mariana Mortágua defendeu que a proposta de tetos às rendas funciona e por isso eles “estão a ser prolongados na Alemanha e na Holanda”, país onde os liberais estão no Governo. Confrontada com o risco dos proprietários venderem as suas casas, respondeu que “se se vendem mais casas, há mais casas disponíveis” e isso ajudará a baixar os preços. O problema no mercado do arrendamento é que “60 m2 em Lisboa custam 1.300 euros no Porto 1.050”, enquanto os salários médios estão entre os 800 e os 1.000 euros. Ou seja, “já não há casas para a maioria das pessoas” e para elas o atual o mercado de arrendamento "é uma ilusão, porque o salário está abaixo da renda”.
Rui Rocha atacou a proposta dos tetos de rendas, afirmando que “correram sempre mal e estão a correr mal”. Em seguida deu exemplos de países e cidades onde a medida já é aplicada, como na Holanda, Berlim, Irlanda, Barcelona ou Suécia, sem conseguir explicar a razão de os supostos maus resultados levarem os respetivos governos a quererem prolongar e alargar a medida. Porém, o líder da IL acabou por admitir que quem já tem casa arrendada irá ver a sua renda baixar, prevendo depois um sacrifício das “futuras gerações”. A IL defende liberalizar ainda mais o mercado de arrendamento, acabando com o incentivo ao arrendamento de longa duração ao baixar o IRS para os contratos de curta duração. E diz que é preciso construir mais, baixar o IVA da construção e acelerar o licenciamento da construção, bem como uma justiça mais rápida e a reconversão dos imóveis devolutos do Estado.
Habitação
Resposta da Causa Pública desmente conclusões da SBE sobre controlo de rendas
Na réplica, Mariana Mortágua diz que todos estão de acordo sobre a necessidade de construir mais, mas lembrou que “a maior parte dos jovens não conseguem comprar nem arrendar, não saem da casa dos pais ou vão emigrar” e por isso precisam de resposta agora. “É inacreditável o esforço a que a IL se dedica com o setor imobiliário para tentar desacreditar uma medida que governos com partidos liberais na Holanda defendem e querem prolongar”, insistiu a coordenadora do Bloco, concluindo que “reduzir impostos e ficar à espera que o problema se resolva é o que une a IL aos governos do PS e PSD” e que apresenta como resultado “a maior crise de habitação de sempre”.
Quando o tema passou para a política de Saúde, Rui Rocha socorreu-se dos exemplos na Alemanha e Holanda para defender mais peso dos grupos privados sobre o setor público e voltou a defender as PPP na gestão dos hospitais, que no seu entender funcionavam bem. Em seguida comparou o esforço que foi feito para criar o SNS para defender que será preciso um esforço igual com apoio dos grupos privados da saúde para criar o sistema que defende.
Mariana Mortágua respondeu que “criar o SNS foi a decisão mais importante que a nossa democracia tomou” e criticou a IL por vir a esta campanha dizer “que é preciso destrui-lo”. Para o Bloco, “toda a gente deve ter direito ao mesmo tratamento independentemente do dinheiro que tem” e por isso “quero investir no SNS para que cumpra o seu propósito”, defendeu. Contra a proposta da IL, que consiste em “pegar no dinheiro público e entregá-lo a um privado”, Mariana evocou os EUA como “o maior exemplo de modelo privatizado de saúde” e lembrou os encaminhamentos de doentes graves das PPP para os hospitais públicos e as portas fechadas dos hospitais privados durante a pandemia.
O momento final do debate foi aproveitado pela coordenadora do Bloco para acusar a IL de não dizer como pretende pagar as suas propostas de baixa de impostos e de propor no seu programa um corte de “redundâncias” que corresponde à saída de 102 mil funcionários administrativos do Estado, quando só ali trabalham 92 mil. “Não é motosserra, é bulldozer”, rematou.
Rui Rocha respondeu atacando a proposta do Bloco de o país readquirir o controlo dos setores estratégicos da energia e aeroportos por custar, pelas suas contas, dezenas de milhões de euros. Ao que Mariana respondeu que só com “um ano de baixa do IRC da IL pagamos as quotas de controlo da EDP e REN ao preço de mercado”.