Em abril de 2017, o Governo conservador britânico introduziu um limite de dois filhos para os apoios sociais à infância que as famílias podiam receber. Em causa estavam sobretudo dois benefícios sociais, o chamado “crédito universal” e os “créditos fiscais para as crianças”, e a restrição de acesso a partir do terceiro empurrou milhares de crianças para a pobreza como têm criticado as organizações não governamentais que trabalham no campo.
Apesar das críticas generalizadas, o novo executivo trabalhista, liderado por Keir Starmer, recusou-se a abolir o sistema esta terça-feira numa votação parlamentar em que sete dos deputados do partido não seguiram a linha adotada, votando a favor de uma emenda apresentada pelo Partido Nacional Escocês e subscrita pelos Verdes, pelo Plaid Cymru e três independentes. Entre eles Jeremy Corbyn, antigo líder trabalhista. Esta acabou por ser chumbada com 103 votos a favor e 363 contra.
A direção trabalhista suspendeu do grupo parlamentar por seis meses quem votou em sentido diferente da escolha do Governo. Entre os suspensos está John McDonnell, ex-ministro sombra das Finanças, junto com Apsana Begum, Richard Burgon, Ian Byrne, Imran Hussain, Rebecca Long-Bailey e Zarah Sultana. A deputada Rosie Duffield declarou que também teria votado da mesma forma mas como está com Covid não pôde votar.
Para além disso, há 42 outros deputados trabalhistas que se abstiveram, o que pode indiciar um mal-estar ainda mais profundo no seio dos trabalhistas que não ficaram convencidos com as justificações do governo de que não pode comprometer com este tipo de gastos mas “está empenhado em tomar medidas para combater a pobreza infantil” como disse o porta-voz do primeiro-ministro.
A suspensão, escreve o Guardian, “criou ondas de choque no partido e levou a críticas de alguns dos deputados que votaram com o Governo”. Há vários deputados a dizer que se trata de um erro estratégico. É o caso de Nadia Whittome que considera uma abordagem “terrível” à disciplina partidária, numa situação em que uma supermaioria devia “tolerar desacordos sem fazer ameaças” e aplicada a uma política “à qual quase todos os trabalhistas se opõem”.
O primeiro-ministro teve de vir a terreiro recuar na afirmação de que retirar a restrição discriminatória de quem tem mais filhos seria caro demais e admitir que pode vir a aprovar a medida. A sua secretária de Estado da Educação, Bridget Phillipson, também prometeu analisar uma possível implementação da medida.
O limite de dois filhos afetou o ano passado 1,6 milhões de crianças, uma em cada nove do total no Reino Unido. Estima-se que mais 250.000 sejam afetadas para o próximo ano e mais meio milhão até 2029.
Lynn Perry, diretora da Barnardos, uma organização que trabalha com crianças, explica que “a maioria das famílias que recebem o Crédito Universal estão a trabalham e muitas têm dificuldades por razões que ultrapassam o seu controlo: separação familiar, morte de um membro do casal ou perda de um emprego”. Para ela, esta política “nega às famílias o apoio de que necessitam para conseguir ter o básico para conseguir o suficiente que comer e aquecer as suas casas decentemente. São as crianças que acabam por pagar o preço, crescendo na pobreza e tendo que lidar com as suas consequências para o resto da sua vida”.