Reportagem incluída no último Mais Esquerda, que pode ser visto aqui e incluiu ainda uma reportagem sobre o IN-Mouraria, um centro para pessoas que usam ou usaram drogas (que pode ser vista aqui) e sobre a celebração do Dia Internacional Contra a Discriminação Racial na Faculdade de Ciência Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa (aqui).
A Vida Independente é uma filosofia que defende o direito de as pessoas com deficiência viverem a sua vida como quiserem. Diogo Martins, presidente do Centro de Vida independente explica ao esquerda.net que, segundo esta filosofia, é "essencial termos o controlo sobre as nossas próprias vidas. Não poderá haver terceiros a decidir aquilo que podemos ou não podemos fazer, não poderá haver terceiros a considerar se devemos fazer as coisas de determinada maneira. Temos de ser nós próprios, enquanto pessoas, a ter direito à nossa autorrepresentação e a termos direito a exercê-la".
Não poderá haver terceiros a decidir aquilo que podemos ou não podemos fazer, não poderá haver terceiros a considerar se devemos fazer as coisas de determinada maneira. Temos de ser nós próprios a ter direito à nossa autorrepresentação e a termos direito a exercê-la
Esse é um direito que, muitas vezes, é negado às pessoas com deficiência. "Esse direito durante muitos anos não nos tem sido permitido. Vivemos numa realidade em que muitas das decisões relacionadas com as nossas vidas são tomadas por técnicos, sejam eles médico ou doutras áreas, e sempre numa perspetiva muito reabilitadora. É como se estivéssemos a vida toda a adaptarmo-nos à deficiência que temos, e na maioria dos casos, não precisamos de nada deste tipo de reabilitação, de adaptação. Precisamos é de ter a capacidade de nos autorrepresentar e de podermos executar essa autorrepresentação", sublinha Diogo Martins.
Há neste momento fundos europeus destinados a modelos de vida independente, isto é, ao financiamento de assistentes pessoais, que são profissionais contratados para substituir as funções que a pessoa com deficiência não consegue executar. "Se não conseguirmos abrir uma porta tem que haver alguém que o faça. Se não conseguirmos ter uma comunicação suficientemente explícita ou audível para outra pessoa poder interagir connosco e que isso não dependa de outros meios de comunicação, o assistente pessoal poderá ser o intérprete. São pessoas que suprimem necessidades que não são suprimidas com tecnologia ou acessibilidades", explica Diogo Martins.
O governo apresentou um projeto com propostas sobre o tema, cujo prazo de consulta pública terminou na semana passada. A proposta apresentada pelo governo tem vários problemas, como sublinha o deputado bloquista Jorge Falcato. "Detetámos, logo à partida, um problema com as horas de assistência que são possíveis ter. Fica limitado a 40 horas por semana por utente e isto vai deixar uma série de pessoas de fora que assim não poderão, realmente, decidir sobre a sua vida", afirma. "Continuarão dependentes das famílias, o que é uma pecha que se tem mantido na política de deficiência, que é o Estado delegar nas famílias aquelas que são as suas responsabilidades".
No projeto do governo, a assistência pessoal fica limitada a 40 horas por semana e isto vai deixar uma série de pessoas de fora que assim não poderão decidir sobre a sua vida. Continuarão dependentes das famílias, que é uma pecha que se tem mantido na política de deficiência, é o Estado delegar nas famílias as suas responsabilidades
Por outro lado, é obrigatório que as entidades gestoras dos projetos de vida independente sejam IPSS. Algo que vai "completamente contra a filosofia de vida independente" pois "as IPSS, que normalmente não têm ninguém com deficiência na sua direção são as instituições que têm tido uma política de institucionalização das pessoas, uma política assistencialista", explica Jorge Falcato.
Por outro lado, o projeto só se aplica a quem tiver um atestado multiusos de, pelo menos, 60% de incapacidade. Isto pode deixar de fora pessoas que precisam de apoio que tenham, por exemplo, deficiências mentais. Exige-se ainda que exista uma equipa técnica com formação superior em ciências sociais, de comportamento humano, ou da reabilitação. "Isto é o modelo de médico a funcionar. As pessoas com deficiência não precisam duma tutela técnica para saberem da sua vida, para lhes dizerem como é que vai ser a sua vida ou como é que deve ser a sua vida", prossegue o deputado do Bloco, que exige que se tenha em conta, na resolução que vier a ser aprovada em Conselho de Ministros, as opiniões da comunidade de pessoas com deficiências.
O Centro de Vida Independente (CVI) lançou a campanha “Agora és tu”, com um vídeo a divulgar o que é a Vida Independente (que pode ser visto aqui). "Queremos despertar nos outros a vontade de ter uma vida livre como nós graças à assistência pessoal também começamos a ter", explica Diana Santos, do Centro de Vida Independente. Por outro lado, o objetivo do vídeo também é divulgar o CVI pois "para participar nos projetos piloto é preciso ter-se um Centro de Vida Independente ao qual pertencer. Quem não consiga, quem não tenha um com o qual se identifique, seja de que ponta de Portugal for, pode sempre recorrer ao CVI e pode ser sempre um de nós", apela Diana Santos.