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Regulador repudia decisão do Governo de entregar novo negócio de resíduos à Mota-Engil

Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos acusa executivo de impor alterações legislativas que “colocam em causa os poderes regulatórios” e de entregar “em exclusivo” e sem concurso público o negócio de recolha de resíduos orgânicos urbanos à empresa EGF, do grupo Mota-Engil.
Foto: Pedro Ventura/Agência Brasília.
Foto: Pedro Ventura/Agência Brasília.

O Expresso, na sua edição de sexta-feira, cita Orlando Borges, presidente da Entidade Reguladora dos Serviços de Águas e Resíduos (ERSAR), que defende que “a proposta de alteração do DL 96/2014, aprovada em Conselho de Ministros, corresponde a uma interferência grave do poder político e uma afronta aos princípios da independência desta entidade reguladora, permitindo de forma encapotada que o executivo possa reformular decisões do regulador”.

O responsável frisa ainda que o despacho aprovado em Conselho de Ministros, a 28 de julho, “faz uma alteração ilegal ao objeto da concessão [da exploração dos sistemas multimunicipais de tratamento e recolha seletiva de resíduos urbanos]” e opõe-se à decisão do Governo de entregar “em exclusivo” e sem concurso público o negócio de recolha de resíduos orgânicos urbanos à empresa EGF, do grupo Mota-Engil.

O presidente da ERSAR refere que o despacho, no qual consta a assinatura do secretário de Estado do Ambiente, João Ataíde, “não integra o objeto dos contratos de concessão celebrados entre o Estado e as empresas do grupo EGF atualmente vigentes” e que “representaria um privilégio restritivo da concorrência”.

Numa carta endereçada ao Ministério do Ambiente, o regulador assinala que estão a ser “postos em causa princípios de concorrência, igualdade e transparência” e destaca que “jamais poderá aceitar que os investimentos relativos à atividade de recolha dos resíduos orgânicos sejam integrados na base dos ativos regulados das concessionárias do grupo EGF e suportadas pelas tarifas a cobrar aos utilizadores”.

A Associação de Empresas para o sector do Ambiente (AEPSA) partilha desta avaliação, considerando que estão em causa “práticas restritivas de concorrência” que privilegiam “de forma inaceitável” o grupo Mota-Engil.

“Este despacho tem vários vícios e viola os princípios constitucionais”, sinaliza o presidente da AEPSA, Eduardo Marques, lembrando que, até 2023, Portugal tem de recolher seletivamente os biorresíduos, sendo que estes representam 40% dos resíduos urbanos, o que “corresponde a 1,8 milhões de toneladas por ano e a um negócio de mais 60 a 70 milhões de euros que seria entregue à EGF sem concurso público” e com “prejuízos para os associados da AEPSA”.

Ao semanário, o ministério respondeu que “quem aprova os investimentos é o Estado, não só porque é o concedente, mas também porque é o responsável pelas políticas públicas”. A tutela sublinhou que as alterações legislativas não implicam “qualquer favorecimento ou limitação concorrencial”.

“Existe a possibilidade de os municípios protocolarem o entendimento que melhor lhes convier, ou seja, deliberarem delegar na EGF os investimentos para a recolha seletiva ou efetuarem por modo próprio a mesma operação”, avançou, reconhecendo, contudo, que “as concessionárias de todos os sistemas multimunicipais têm, por lei, exclusivo nos territórios em que atuam, para as atividades que o Estado lhes cometeu, entre as quais, a recolha seletiva”.

Para o ministro João Pedro Matos Fernandes “não se anteveem razões para a revogação do referido despacho”. De qualquer forma, “foi solicitado parecer ao Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da República, cujo teor se aguarda”.

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