Vladimir Putin anunciou esta segunda-feira o reconhecimento por parte do Estado russo da independência das duas regiões russófonas da Ucrânia, Donetsk e Lugansk, que se tinham autoproclamado repúblicas populares autónomas em 2014. Ao mesmo tempo, pediu ao Parlamento para “ratificar acordos de amizade e colaboração” com estas e mandou avançar com militares para “garantir a paz” nestes territórios enquanto tais acordos não sejam formalmente assinados.
O presidente russo disse que é uma “decisão amadurecida desde há muito tempo” e sublinhou que “para nós, a Ucrânia não é apenas um país vizinho, é uma parte indivisível da nossa história, da nossa cultura, do nosso espaço espiritual. Desde há muito tempo, os habitantes do sudoeste das antigas terras russas se dizem russos e ortodoxos”. Mandou ainda um recado ao governo deste país para “parar imediatamente as suas ações militares”. Se não o fizer, “a continuação do derramamento de sangue será completamente da sua responsabilidade”.
Já esta terça-feira, Sergei Lavrov, o ministro russo dos Negócios Estrangeiros, desfez uma das dúvidas principais geradas pelo anúncio presidencial: a Rússia reconhece as fronteiras atuais destes territórios e não reivindica as de 2014 quando as repúblicas foram declaradas na sequência do golpe que se seguiu à chamada “revolução de Maidan”.
A declaração significa uma alteração de posição do governo russo que, até agora, apoiava os acordos de Minsk, reconhecendo a soberania ucraniana sobre estes territórios e procurando que estes fossem reintegrados mediante a aprovação de um estatuto especial.
Os Estados Unidos reagiram com o anúncio de sanções às duas repúblicas separatistas. Jen Psaki, porta-voz da Casa Branca, especificou que se trata de uma proibição de novos investimentos, de comércio e de quaisquer transação económica pela parte de cidadãos e instituições dos EUA no território.
A União Europeia, através de um comunicado conjunto dos presidentes do Conselho Europeu e da Comissão Europeia, também anunciou que irá impor sanções considerando a decisão ilegal e uma “violação flagrante do direito internacional”. Charles Michel e Ursula von der Leyen realçam que “condenam nos termos mais enérgicos” a decisão de Putin. A mesma ideia de violação clara do direito internacional veiculou oficialmente o governo do Reino Unido, expressando repúdio sobre ela.
Em comunicado, o secretário-geral da Nato, Jens Stoltenberg, também condena a decisão russa que diz provocar a “erosão nos esforços para uma resolução do conflito e viola os acordos de Minsk”.
Do lado ucraniano, pediu-se uma reunião imediata do Conselho de Segurança da ONU. Este decorreu na madrugada desta terça-feira, tendo durado hora e meia. Vasily Nebenzya, representante russo, assegurou abertura para “uma solução diplomática” e considerou importante “evitar a guerra e obrigar a Ucrânia a pôr fim às hostilidades e provocações contra Donetsk e Lugansk”. A China optou por apelar a “uma solução pacífica” e pedir contenção. Do resto dos representantes houve condenação. Linda Thomas-Greenfield, embaixadora dos EUA, diz que é “um disparate” considerar as forças russas como forças de manutenção de paz e diz que Putin quer “recuar a um tempo em que os impérios dominavam o mundo”.
Sobre as sanções, a resposta russa é de desvalorização. Lavrov diz que foi um anúncio “previsível” que seria aplicado “em qualquer caso, com ou sem razão”. “Já estamos habituados a isso” rematou.
“Absolutamente condenável”, diz Fazenda
O Bloco de Esquerda pronunciou-se esta terça-feira sobre os últimos desenvolvimentos neste conflito. Luís Fazenda, em declarações à TSF, defende a necessidade de dar “espaço para a via diplomática” de forma a “minimizar aquilo que possam ser escaladas de guerra”.
O dirigente bloquista condenou a "onda imperialista da Rússia", referindo que esta implica um "extremar de posições" que é “absolutamente condenável”. Para ele, “o processo de paz obrigaria a uma via diplomática, um diálogo político, real e concreto, e não propriamente extremar as posições”.
Para além disso, insta a Europa a “ganhar o seu espaço neste contexto” criticando como “não muito normal do ponto de vista da política internacional” que tenha sido Biden a anunciar que, em caso de invasão, o gasoduto russo Nord Stream 2 que vai abastecer a Alemanha seria destruído. “Aí há um défice da Europa e um défice da liderança do próprio Estado alemão e é preciso travar esta onda imperialista da Rússia", conclui.