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Perigos do CETA: Exemplo da contenda entre Portugal e mexicanos da Avanza sobre Metro

Críticos internacionais do CETA apontam litigância entre Portugal e Avanza na reversão da privatização do Metro de Lisboa como bom exemplo dos perigos do acordo. Governo anunciou que rejeita levar litígio para tribunal arbitral nos EUA.
Bloco tem vindo a alertar que para os mecanismos de resolução de conflitos que estão inscritos nos tratados mais recentes, nomeadamente no CETA, pois estes “retiram poder de decisão democrática dos Estados perante multinacionais que invistam no seu país”. Foto de Paulete Matos.

Um dos principais alertas dos sindicatos e dos críticos internacionais do acordo de comércio livre UE-Canadá (CETA) prende-se com a utilização do mecanismo de resolução de litígios entre investidor e Estado (ISDS, Investor to State Dispute Settlement) contra os governos que tentam reverter privatizações ruinosas.

A litigância entre o Estado português e o grupo Avanza, detido maioritariamente por sócios mexicanos, da empresa ADO, na reversão da privatização do Metropolitano de Lisboa tem vindo a ser apontada como um bom exemplo dos perigos do CETA.

Este caso levou os deputados Heitor de Sousa e Isabel Pires a questionar, em novembro deste ano, o Ministério do Planeamento e das Infraestruturas sobre qual o ponto de situação do pedido de indemnização da ADO ao Governo de Portugal e sobre que medidas pretende o executivo tomar, perante os processos antecedentes semelhantes, para evitar uma decisão de pagamento à empresa.

No documento, os bloquistas lembram que a subconcessão do Metro à Avanza ocorreu em junho de 2015, pelas mãos do anterior Governo PSD/CDS, “após anos de desinvestimento na qualidade dos serviços, deterioração das condições de trabalho e de corte de carreiras, horários e carruagens do metropolitano”.

“Em fevereiro de 2016, o atual Governo decidiu cancelar os acordos de subconcessão da gestão da rede do Metropolitano de Lisboa e da rede da CARRIS. Por um lado, a reversão de privatizações ou subconcessões encapotadas e a proibição de novas privatizações faziam parte do acordo efetuado entre o Bloco de Esquerda e o Partido Socialista. Por outro lado, o serviço público de transportes públicos de Lisboa estava gravemente posto em causa”, escrevem os deputados.

Lembrando que “a ameaça de pedido de indemnização resulta do enquadramento legal dos tratados de investimento, nomeadamente do seu mecanismo de resolução de litígios entre investidor e Estado (ISDS, Investor to State Dispute Settlement) que decorre à margem dos tribunais nacionais, através da criação extraordinária de um júri privado de três juristas, contratados pelas partes”, Heitor de Sousa e Isabel Pires referem que “o valor anunciado de pedido de indemnização é de 42 milhões de euros, o equivalente a 4,5% do Orçamento de Estado para 2016 para o setor dos transportes ou 28,3% do orçamento do Metropolitano de Lisboa para 2016”.

“De relembrar que, até à reversão da subconcessão, a ADO ainda não tinha feito qualquer investimento. Ora, o pedido de indemnização surge porque na linguagem do mecanismo internacional de proteção de investimento é considerado ‘investimento’ os lucros que a empresa esperava vir a obter no futuro. Portanto, o Estado português pode estar perante um processo e pedido de indemnização de 42 milhões de euros por lucros que a ADO não obteve, mas esperava obter”, destacam os bloquistas.

Lembrando que “estes conflitos entre empresas e Estados não são novos, mas têm vindo a acentuar-se nos últimos anos”, tal como é verificado inclusive pelas Nações Unidas, o Bloco de Esquerda assinala que “tem alertado para os perigos destes mecanismos”, que estão inscritos nos tratados mais recentes, nomeadamente no CETA, “com especial enfoque para os mecanismos de resolução de conflitos, pois retira poder de decisão democrática dos Estados perante multinacionais que invistam no seu país”.

“A reversão das subconcessões dos transportes públicos de Lisboa era essencial para o serviço público e para os cidadãos, além de ser uma decisão legítima tomada por um governo democraticamente eleito”, defendem Heitor de Sousa e Isabel Pires.

Governo rejeita levar litígio para um tribunal arbitral nos EUA

A intenção da Avanza de levar o litígio sobre a anulação dos concursos para um tribunal arbitral nos Estados Unidos foi, entretanto, formalmente rejeitada pelo Governo português.

Em declarações ao jornal Público, o ministro do Ambiente informou que a empresa “foi informada de que não há razão para que esse tribunal seja invocado” ao abrigo do acordo com o México.

“Nem quero colocar a questão de uma forma não jurídica e dizer que, na realidade, não está aqui em causa um investimento. Agora a empresa que concorreu é espanhola, é detida por uma outra empresa espanhola, que, por sua vez, tem um dono mexicano. Se se colocasse o tema entre Estados, então seria entre Portugal e Espanha”, destacou Matos Fernandes.

O executivo socialista remete a decisão para as instâncias nacionais: “Aliás, para ser completamente objectivo, a empresa que assina o contrato até é portuguesa, mas isso era uma imposição do próprio caderno de encargos”, lembrou o governante.

Conforme sublinha o jornal diário, foi, inclusive, através desta sociedade de direito nacional (a Corporação de Transportes Autocarros de Lisboa) que a Avanza interpôs um processo em junho, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, a solicitar que a decisão do Governo fosse considerada nula.

O ministro do Ambiente garantiu ainda que o executivo não irá pagar qualquer indemnização às empresas que concorreram às subconcessões: “Pagar uma indemnização está completamente fora de causa”, frisou, destacando que “o problema não está nas empresas que concorreram, mas sim num caderno de encargos que não defendia de forma alguma uma solução de mobilidade para as áreas metropolitanas de Lisboa e Porto”.

Em cima está, no entanto, a compensação das despesas que as empresas privadas tiveram com a preparação para os concursos: “A possibilidade de discutir os custos que ocorreram no contexto do contrato é uma questão que está a ser debatida e que se está a procurar resolver. Mas esses custos têm de ser comprovados. Nunca andarão para lá das centenas de milhares de euros”, afirmou Matos Fernandes.


 

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